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Na cidade Erftstadt, houve um deslizamento de terras que arrastou casas
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Na cidade Erftstadt, houve um deslizamento de terras que arrastou casas

BezirksregierungKöln/TWITTER

Na cidade Erftstadt, houve um deslizamento de terras que arrastou casas

BezirksregierungKöln/TWITTER

Uma cidade submersa, perto de 1300 desaparecidos e os alertas que não evitaram uma tragédia. As cheias mortais da Alemanha

Em dez minutos, a cidade de Erftstadt desapareceu e parte de um castelo histórico desmoronou. Cerca de 1.300 pessoas desapareceram todas no mesmo distrito. Caves das casas foram armadilhas mortais.

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A descarga de água veio durante a noite de quinta-feira. Àquela hora, a residência para pessoas com deficiências físicas graves de Sinzig, na Alemanha, começava a ser evacuada. “Mas, quando o funcionário responsável por tirar os utentes chegou, veio um maremoto com ele. Ele já não conseguia sair dali, já não podia ajudar“, conta o diretor da associação Lebenshilfe ao Bild. A água demorou apenas um minuto a atingir o teto do rés-do-chão.

O alerta dos bombeiros tinha chegado momentos antes: a água aproximava-se a grande velocidade e era preciso retirar as pessoas do edifício, localizado a cerca de 100 metros do rio Ahr. Mas foi tudo muito rápido. O segurança noturno — que estava inicialmente sozinho — apressou-se a levar alguns dos 34 utentes que ali se encontravam àquela hora para o primeiro andar. Ainda conseguiu pegar em algumas pessoas, mas não conseguiu levar todas a tempo de evitar uma tragédia. A massa de água invadiu o prédio tão rápido que, “quando voltou para vir buscar mais um utente, já era tarde demais“. Foram 12 as pessoas que morreram. “Isto é terrível. Os nossos funcionários estão traumatizados”, disse ainda.

Germany Continues Evacuation And Rescue From Floods As Death Toll Rises

Pelo menos 12 pessoas morreram na residência para pessoas com deficiências físicas graves em Sinzig

Getty Images

São as inundações mais devastadoras do século na Alemanha — piores do que as do leste do país em 2002, que também afetaram principalmente os estados federais da Renânia do Norte-Vestefália e a região vizinha da Renânia-Palatinado. Nos últimos dois dias, caíram 148 litros de chuva por metro quadrado. Normalmente, nesta época do ano, caem cerca de 80 litros de chuva por metro quadrado em todo o mês de julho, segundo o The Guardian.

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Alemanha. 103 mortos e cerca de 1.300 desaparecidos depois de colapso de casas provocado por grandes cheias

As 21 vítimas mortais das cheias de 2002 contrastam com o número muito superior de pessoas que morreram nos últimos dias. Já pelo menos 123 pessoas perderam a vida — 103 na Alemanha e 20 na Bélgica —, às quais se juntam mais de 1.300 mil desaparecidos. Tal como em 2002, os estados federais da Renânia do Norte-Vestefália e a região vizinha da Renânia-Palatinado são os mais afetados. Ali, a chuva contínua transformou rios e riachos em enxurradas violentas. Várias casas cederam à força das águas, vários edifícios desmoronaram-se e acabaram por submergir. O cenário é tão grave, que vários habitantes comparam já a devastação dos últimos dias com a que a Alemanha sofreu na Segunda Guerra Mundial.

Em dez minutos, a cidade de Erftstadt desapareceu e parte de um castelo histórico desmoronou

À violência, junta-se a rapidez. A massa de água surge muito rapidamente. Em dez minutos, por exemplo, a cidade de Erftstadt, no distrito de Rhein-Erft, ficou submersa. “Quase não houve tempo para alertar as pessoas”, disse Frank Rock, porta-voz do distrito de Rhein-Erft, ao canal alemão NTV. As pessoas ficaram presas nos seus carros, nas ruas inundadas ou foram arrastadas pela água. Um enorme deslizamento de terras fez colapsar alguns edifícios e crateras formaram-se no solo. Uma parte do castelo histórico de Erftstadt desmoronou, segundo o NTV. Mais: alguns troços de uma autoestrada perto de Erftstadt ficaram mesmo submersos.

Apesar da situação catastrófica, ainda não se sabe quantas pessoas morreram em Erftstadt. “Presumimos que haja várias mortes, mas não sabemos“, disse o ministro do Interior da Renânia do Norte-Vestefália, Herbert Reul, na manhã desta sexta-feira, citado pela NTV, acrescentando que a situação em Erftstadt é “particularmente crítica” e ainda muito confusa.

A cidade de Erftstadt antes e depois das cheias

O cenário é idêntico em várias cidades. “É um cenário muito triste: ruas, pontes e alguns edifícios destruídos. Há lixo por todo o lado. Partes de prédios estão na estrada, há pessoas sentadas por aí a chorar”, disse Gregor Jericho, morador de Rheinbach, à BBC. Uma jovem, sua conhecida, foi atropelada por um carro enquanto fugia e acabou por se afogar. “O meu irmão tentou ajudá-la e chamou uma ambulância, mas ela já estava morta“, contou.

Na cidade vizinha de Heimerzheim, Uwe e Robert Gödecke ainda conseguiram fugir. Saltaram, com o seu cão nos braços, pela janela da cozinha após acordarem com o barulho da água a entrar em casa. “As coisas passavam por nós a flutuar: a mesa do jardim, as cadeiras de praia, o caixote do lixo”, disse Uwe à BBC. Antes de sair, apenas conseguiram pegar nas carteiras e em alguma comida para o cão. Foram resgatados por um barco a motor da Cruz Vermelha.

Foi também o que aconteceu a José Santos, um médico português a viver em Hattingen, perto de Dusseldorf. À TSF, contou que foi obrigado a sair do local onde vive com a ajuda de um barco, depois de o rio Ruhr ter inundado o prédio: percorreu “quase 600 ou 700 metros” até chegar a um local seguro. Quando foi acordado, durante a madrugada, pelos bombeiros, o prédio já estava totalmente inundado, mas conseguiu sair de casa, apesar de ter a “água até à cintura”. Além de barcos, também helicópteros têm sido usados para resgatar sobreviventes nos telhados.

epa09346717 A view of the damage at village of Schuld in the district of Ahrweiler after heavy flooding of the river Ahr, in Schuld, Germany, 15 July 2021. Large parts of Western Germany were hit by heavy, continuous rain in the night to 14 July, resulting in local flash floods that destroyed buildings and swept away cars.  EPA/SASCHA STEINBACH

A cidade de Schuld no distrito de Ahrweiler esta quinta-feira

SASCHA STEINBACH/EPA

Caves das casas foram armadilhas: vários corpos foram encontrados pelas autoridades

Duas pessoas sem vida foram encontradas numa cave inundada em Geilenkirchen. Em Kamen, um homem foi encontrado morto na cave submersa da sua casa. Em Solingen, um idoso de 82 anos morreu após cair na cave da sua casa. Para muitas pessoas, a cave de casa tornou-se uma armadilha mortal. “Quando as caves se esvaziam de água, deparamo-nos diversas vezes com pessoas que perderam a vida”, revelou o ministro do Interior da Renânia-Palatinado, Roger Lewentz, citado pela NTV.

Isto, porque, quando a água começa a entrar na casas, os seus habitantes têm a tendência de dirigir-se para as caves não só para desligar a eletricidade, mas também para tentar colocar objetos pessoais a salvo. No entanto, isto é exatamente contrário do que se deve fazer numa catástrofe deste género. É que, se a água entrar na cave rapidamente, pode não haver tempo para fugir. “No caso de entrada de água na casa, qualquer permanência na cave deve ser limitada ao mínimo”, aconselhou Christoph Schöneborn, porta-voz da Associação dos Bombeiros da Renânia do Norte-Vestfália.

Death toll from floods in Germany rises to 81

Há pelo menos 1.300 desaparecidos na sequência das cheias

Anadolu Agency via Getty Images

Além disso, objetos, como móveis, caixas ou ferramentas, também podem boiar na cave levando a que possam ocorrer lesões. “Portanto, é útil mover-se lentamente e com cuidado na cave — especialmente quando a água não é transparente”, explicou Schöneborn.

Cerca de 1.300 pessoas desaparecidas no mesmo distrito. Algumas podem estar apenas incontactáveis

A chanceler alemã acredita que só será possível ver “a extensão total do desastre nos próximos dias”. A julgar pelo número de pessoas desaparecidas, a catástrofe pode vir a ser muito maior no que toca a vítimas mortais. Segundo os últimos balanços, cerca de 1.300 pessoas estão desaparecidas — todas elas no distrito de Ahrweiler, que foi particularmente afetado pelas cheias.

Quase dois dias depois, algumas zonas e edifícios ainda permanecem difíceis de alcançar. Em muitos casos, nem mesmo uma operação de resgate é possível. Portanto, ainda não se sabe se estas pessoas desaparecidas estão, por exemplo, soterradas ou se conseguiram fugir a tempo de se refugiar em locais seguros, ainda que sem acesso para já. Levará algum tempo até que haja alguma certeza sobre o número de mortos e de pessoas desaparecidas nos escombros.

Thunderstorms in North Rhine-Westphalia

Muitas pessoas tiveram de ser resgatadas de helicóptero

dpa/picture alliance via Getty I

É certo que este número pode traduzir-se em mais vítimas mortais, mas também pode ser um número muito superior ao de pessoas realmente desaparecidas. Isto, porque muitas delas foram dadas como desaparecidas várias vezes por “familiares preocupados”, segundo explicou à Der Spiegel o porta-voz da polícia de Koblenz, Ulrich Sopart.

Além da destruição, há ainda um problema acrescido: a rede móvel está parcialmente indisponível. Uma porta-voz do distrito de Ahrweiler lembrou muitas destas pessoas não conseguem contactar nem ser contactadas por amigos ou familiares. Isto significa que muitas delas podem estar bem, mas estão simplesmente incontactáveis. “Esperemos que isto seja esclarecido”, disse também à Der Spiegel. É o caso de uma família em Altenahr. Depois de ver uma publicação nas redes sociais da filha a dizer que estava “submersa” no seu apartamento, a mãe tentou contactá-la, mas sem sucesso. “Estava a tentar ligar para ela desde perto das 8h da noite passada [quinta-feira] e ainda não sabia até há 15 minutos como ela estava, como o meu neto estava”, disse à BBC.

Culpa é apontada às alterações climáticas. Foram enviados alertas no fim de semana

A preocupação, para já, é sobreviver à catástrofe e não pensar no que a motivou — mas as alterações climáticas têm surgido como a causa apontada. “Com as alterações climáticas, esperamos que todos os fenómenos hidrometeorológicos extremos se tornem mais extremos. O que vimos na Alemanha é amplamente consistente com essa tendência” defende Carlo Buontempo, diretor do Serviço Europeu de Mudanças Climáticas Copérnico, ao The Guardian.

After the storm in North Rhine-Westphalia

Entre os desaparecidos, há muitas pessoas que podem estar só incontactáveis, mas seguras

dpa/picture alliance via Getty I

No entanto, há quem aponte falhas às autoridades. A professora Hannah Cloke, responsável por um sistema da União Europeia que procura emitir alertas precoces sobre cheias perigosas, garantiu à BBC que os alertas foram enviados às autoridades na Europa no fim de semana. “Houve alertas a sair, a dizer que havia algumas chuvas muito fortes e cheias a chegar. Cabe às autoridades nacionais pegar nessa informação e usá-la”, disse. Cloke frisou no entanto que houve alguns lugares onde “esses advertências não chegaram às pessoas e elas não sabiam que isto iria acontecer”. Ainda assim, defende: “Não deveríamos ter este número de mortes por inundações em 2021. É simplesmente inaceitável”.

Também o porta-voz do serviço meteorológico alemão Deutscher Wetterdienst afirmou que emitiu uma série de alertas sobre chuvas intensas. E, à BBC, argumentou que cabia a outras autoridades determinar o risco de cheias e retirar as pessoas ou tomar mais medidas.

No entanto, o Ministério do Ambiente da Renânia-Palatinado considera que estas cheias não podiam ter sido evitadas. Isto, porque os alertas de cheias são feitos em relação aos rios principais, mas as informações para afluentes e rios menores não são tão detalhadas.

O que é que está a causar as cheias mortais no centro da Europa? Ministra alemã do ambiente culpa as alterações climáticas

Mas a Alemanha não é caso único. O mau tempo está a afetar também a Bélgica, onde já foram registadas pelo menos 20 mortes e um desaparecimento, o Luxemburgo e a Holanda — onde o nível da água do rio Meuse atingiu a altura máxima prevista em Maastricht na noite de quinta-feira. Na Suíça, as autoridades locais continuam em alerta máximo nas zonas que circundam os lagos de Biena, Thun e o lago Quatro Cantões, que transbordaram várias vezes nos últimos dias, receando novas inundações face às persistentes chuvas registadas no último mês e meio.

Em toda a parte da Europa central afetada, espera-se que continue a chover, com o nível do rio alemão Reno e de vários dos seus afluentes a subir perigosamente. De acordo com os serviços meteorológicos alemães, a chuva intensa e contínua deverá manter-se no sudoeste da Alemanha até à noite de sexta-feira.

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