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As nomeações familiares no PS são um novelo que ainda não chegou ao fim. Depois de esta quinta-feira o secretário de Estado Carlos Martins se ter demitido na sequência da nomeação de um primo para o seu gabinete — e depois de o Observador ter detetado cinco novos casos num artigo publicado na semana passada — há agora mais cinco casos de nomeações feitas por governantes a familiares de antigos dirigentes e governantes do PS.
Companheiro de Idália Serrão na Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária
Rui Ribeiro, companheiro de Idália Serrão, que em janeiro deste ano renunciou ao lugar de deputada, foi nomeado a 14 de janeiro presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária por Artur Neves, o secretário de Estado da Proteção Civil. A nomeação é do Ministério da Administração Interna, liderado por Eduardo Cabrita, que, tal como a mulher e ministra Ana Paula Vitorino, foi camarada de Idália Serrão na bancada socialista. Chegaram a votar os três juntos na Assembleia, isolados da restante bancada socialista, sobre a criminalização do enriquecimento ilícito, proposta do PSD e do CDS.
Idália Serrão tem um relacionamento e vive com Rui Ribeiro. O novo presidente da ANSR é licenciado em engenharia Física Tecnológica pelo Instituto Superior Técnico e doutorado em Física da Radiação pela Universidade de Coimbra.
Antes de ser nomeado pelo ministério de Cabrita para a ANSR, Rui Ribeiro já tinha tido um cargo neste governo, nomeado pela mulher de Eduardo Cabrita, Ana Paula Vitorino. Até outubro de 2016, o engenheiro foi técnico especialista no gabinete da ministra do Mar. Segundo o despacho de nomeação, Rui Ribeiro desempenhou, no Ministério do Mar, “funções especializadas de assessoria na sua área de especialização”. Já a segunda nomeação, do Ministério da Administração Interna, é justificada pelo “currículo académico e profissional”, que “evidencia o perfil adequado e demonstrativo da aptidão e experiência profissional necessários ao exercício do referido cargo”. Ou seja: Rui Ribeiro foi nomeado pelos ministérios do casal Cabrita/Vitorino para funções distintas, mas a justificação foi a mesma: o currículo na área da engenharia mecânica e gestão industrial.
Sobrinha de autarca do PS sem experiência passou por três gabinetes
Jorge Vultos Sequeira é presidente da câmara municipal de S. João da Madeira, eleito pelas listas do PS, mas também grande amigo e sucessor de Pedro Nuno Santos na liderança da Federação do PS de Aveiro. Antes disso, Jorge Vultos Sequeira tinha sido chefe de gabinete de Fernando Rocha Andrade, então secretário de Estado da Administração Interna, entre 2005 e 2007. É aqui que começa a coincidência.
Já no atual Governo de António Costa, Fernando Rocha Andrade nomeou a sobrinha de Jorge Vultos Sequeira, Catarina Vultos Sequeira, como técnica especialista em dezembro de 2015. Dez anos depois de nomear o tio, nomeou a sobrinha. Rocha Andrade saiu do Governo na sequência do caso Galpgate e, nesse mesmo mês, Catarina Vultos Sequeira foi nomeada adjunta de um outro gabinete governamental — o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Tiago Antunes, nomeia a sobrinha do autarca.
Mas a experiência em gabinetes não se fica por aqui. Catarina Vultos Sequeira saiu em outubro para a secretaria de Estado da Internacionalização. Nomeada por Eurico Brilhante Dias, recuperou o cargo de técnica especialista, passando a receber 3.575,46 euros brutos, que correspondem a 2.170,70 euros líquidos por mês.
A experiência laboral de Catarina Vultos Sequeira era muito curta antes de chegar ao governo. A sobrinha do autarca do PS terminou a licenciatura em Direito em julho de 2014 e em setembro inscreveu-se num mestrado que ainda não estava concluído quando em outubro entrou para o gabinete de Brilhante Dias. Além do Governo, a única experiência profissional que a jurista tem são alguns meses, em 2005, no Departamento Fiscal da Rebelo de Sousa e Associados, o escritório de advogados de Pedro Rebelo de Sousa.
Uma filha na Segurança Social
Ana Margarida Vasques é licenciada em Economia e tem uma carreira dentro da Segurança Social, embora a última passagem tenha sido envolta em alguma polémica. Entre janeiro de 2008 e janeiro de 2013, Ana Vasques exerceu funções de Diretora do Departamento de Gestão da Dívida à Segurança Social. Chegou, na altura, a ser investigada pelo Ministério Público após uma queixa do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social por acesso não autorizado à base de dados de serviço do IGFSS. O processo, sabe o Observador, ainda está em investigação.
Ana Vasques saiu então da Administração Pública. Esteve depois vários anos (entre 2015 e 2018) como presidente do Conselho de Administração de um “grupo internacional no setor da aviação comercial”, mas a 12 de junho de 2018 acabou por ser nomeada pela secretária de Estado da Segurança Social, Cláudia Joaquim, como técnica especialista. E o que tem isto haver com famílias? Ana Vasques é filha do antigo deputado do PS Tomás Vasques, que foi também vereador socialista na câmara de Lisboa e chefe de gabinete de João Soares no tempo em que este liderou a autarquia lisboeta.
Mas Ana Vasques não ficará no gabinete governamental muito tempo. O Observador apurou que irá em breve substituir Rui Mello como vogal do Conselho Diretivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.
Filho de presidente da distrital esteve no governo, mas caiu com caso Huawei
Nuno Almeida Barreto é filho do presidente da distrital de Braga do Partido Socialista e foi nomeado técnico especialista do gabinete do secretário de Estado das Comunidades, José Luís Carneiro, em dezembro de 2015. O filho de Joaquim Barreto foi exonerado do gabinete em agosto de 2017 na sequência de um artigo do Observador que deu conta de uma viagem à China paga pela Huawei.
O filho do presidente da distrital de Braga do PS, que é também presidente da Comissão Parlamentar de Agricultura na Assembleia da República, tinha sido já nomeado para a mesma função — a de técnico especialista –, no governo de José Sócrates, em novembro de 2009, onde integrou o gabinete do também secretário de Estado das Comunidades, António Silva Braga, ainda o pai não era deputado, mas já era presidente da distrital do partido e também presidente da Câmara de Cabeceiras de Basto. Nuno Almeida Barreto chegou até a receber um louvor “pelas elevadas qualidades pessoais e profissionais que demonstrou enquanto assessor” do gabinete, publicado em junho de 2011 em Diário da República.
‘Huaweigate’ faz primeira baixa no Governo. Adjunto do MNE exonerado
Litra, o genro que é diretor da Erasmus +
José Miguel Ferreira da Silva, mais conhecido como José Litra — é o nome que tem em todas as redes sociais e noticias–, foi membro do gabinete do ex-ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral e está agora na Agência Erasmus+ — nomeado pelo secretário de Estado da Juventude e do Desporto. É casado com Joana Maciel, filha da deputada socialista Palmira Maciel, que é vereadora sem pelouro da Câmara de Braga, tendo integrado o executivo de Mesquita Machado até 2013.
O agora membro da direção da Agência Erasmus+, que gere o programa Erasmus, foi presidente da distrital de Braga da Juventude Socialista, cargo que deixou em janeiro de 2018. José Silva “Litra” entrou no gabinete de Manuel Caldeira Cabral em secretário pessoal em dezembro de 2015 e em maio de 2016 subiu a técnico especialista, de onde saiu em outubro de 2017. Tal como Nuno Almeida Barreto, José Silva também recebeu um louvor pelas funções desempenhadas, que foi publicado em Diário da República.
Exonerado do gabinete de Caldeira Cabral a 16 de outubro de 2018, com a saída do ministro, José Silva foi nomeado, em comissão de serviço durante três anos, para a direção da Agência Nacional Erasmus + a 17 de outubro, num despacho assinado pelo Secretário de Estado, João Paulo Rebelo.
José Silva e Nuno Almeida Barreto partilham ainda outra história em comum. José Silva entrou na Fundação Bracara Augusta — criada para gerir a candidatura de Braga 2012 Capital Europeia da Juventude –, em junho de 2011. Nuno Almeida Barreto foi nomeado vogal do Conselho de Administração da Fundação Bracara Augusta, em julho de 2011. A nomeação de Almeida Barreto esteve a cargo de Hugo Pires, deputado do PS e Secretário da Organização do Partido Socialista e que era vereador da juventude na autarquia de Braga — em que partilhava executivo com Palmira Maciel –, no último mandato de Mesquita Machado.
Na versão inicial deste artigo eram referidos seis casos de nomeações governamentais de familiares de dirigentes do PS. Num desses casos, após alertados por um dos visados, verificámos que a ligação da mãe da nomeada ao PS começou apenas nas últimas autárquicas, já depois de a filha estar no Governo. O caso não se enquadra no ângulo da investigação e por isso pedimos desculpa aos leitores e aos visados