Esta entrevista começa com um pedido: que contrariemos a distância que se exige entre entrevistado e entrevistador e nos tratemos por tu. “Por favor, se não vou-me sentir awkward“, diz. “Trata-me por tu”, insiste. “Awkward” e “estranha”. Serão estes os adjetivos que Rita Gomes usará, mais tarde, para descrever a miúda de Águas Santas que apontava os resultados do Futebol Clube do Porto numa caderneta e adivinhava quantos golos entrariam na baliza em dia de jogo. Essa garota tímida com aversão a holofotes é hoje Wasted Rita, artista e ilustradora portuguesa em que Vhils (Alexandre Farto) apostou para uma mostra a solo na sua galeria em Lisboa, em 2015, no mesmo ano em que Banksy a convidou para integrar a sua exposição coletiva “Dismaland”, em Inglaterra.
Entre esse ano-consagração e 2022 muita coisa mudou na vida de Rita Gomes. As suas observações sobre a vida contemporânea, que sintetiza em slogans em inglês, cheios de trocadilhos e segundos sentidos, mostrou-as pelo mundo. Expôs em Miami e Los Angeles. Chamou a atenção de Madonna, que até colocou uma peça sua no videoclipe de “God Control” (2019). Lançou um livro. Expressou-se sobre os novos vistos do Governo para nómadas digitais, com o seu habitual sarcasmo, claro, e a publicação tornou-se viral no Instagram. Como lida com a viralidade alguém que não gosta de aparecer? O reconhecimento não a deixou menos anti-social, menos tímida, menos “awkward”.
É nos escritórios da galeria Underdogs, em Marvila, Lisboa, onde inaugura esta sexta feira, dia 31 de março, mais uma exposição individual, que recebe o Observador. Da última vez que por ali passou reclamou o pouco espaço dado às mulheres artistas nas galerias com um título provocador: “And now for something completely different: a show that features at least one female artist” (“E agora para algo completamente diferente: uma exposição que tem pelo menos uma artista mulher”, em português). Mas a sub-representação das mulheres na arte é apenas uma das questões que a ocupam. Rita pode ter “Wasted” (“gasta”) no nome artístico, mas não desperdiça tempo, palavras ou intenções. O seu discurso é como a sua obra: mordaz, frontal.
Aos 35 anos, Wasted Rita torna à galeria lisboeta, casa onde se estreou, para mostrar “The desperation of the desperate desperately despairing for this desperation to heal”, patente de 31 de março a 27 de maio (de terça a sábado, das 14h às 19h), que nasceu do confronto com a crise da habitação na capital portuguesa. Viu-se uma mulher à beira de um ataque de nervos quando, como tantos outros, foi despejada de sua casa, no final do último ano.
Desenhos, pinturas, instalações em LED, e até uma experiência imersiva de realidade virtual, algo inédito na obra da artista, ocupam os dois espaços da galeria e remetem-nos para uma realidade que Wasted Rita conhece bem: a dos reality shows. Há quem os abomine, quem os condene, quem os consuma sem admitir (como manda a vergonha de um guilty pleasure). Ela goza-os sem culpa, usando-os como refúgio, companhia e laboratório sobre a natureza humana. Não é a primeira vez que Rita Gomes mergulha na irresistível atratividade da vida mundana televisionada. Mas agora saltou da prancha — para chegar bem fundo.
Demora-se quanto tempo para fazer uma exposição como esta?
Esta exposição em específico foi a exposição onde estive mais tempo envolvida, tanto na parte conceptual como na parte de produzir peças. Comecei no início de dezembro e estou a acabar agora em meados de março. Ou seja, três meses e meio. Já tinha começado a pensar nela antes, mas no início de dezembro é que começou a tornar-se palpável.
Ser despejada de casa tornou-se o ponto de partida para esta exposição. Acaba por estar relacionado com um tema muito premente no debate público que é a questão da habitação.
Está e não está. Quando fui expulsa de casa em dezembro era quando estava a tentar fechar o conceito do que queria tratar nesta exposição. No entanto, não ia soar muito bem que eu, do meu privilégio branco, hetero, pessoa que ganha OK, fizesse uma exposição sobre a crise habitacional pela qual estamos a passar. Ainda por cima com o meu tom, de humor, acho que é um assunto demasiado sério para se estar a tratar com humor. Então tive de fugir disso. O que fiz foi explorar apenas a crise emocional que a crise habitacional me fez passar por estes três meses. Esta exposição é muito mais sobre as minhas emoções durante estes três meses do que sobre a crise habitacional diretamente. Se bem que tem alguns pontos que referem, por exemplo, o estado das casas que existem para arrendamento e para venda em Lisboa neste momento, mas é muito mais sobre esta rotina de emoções, confusas, de expectativa, de desilusão.
Não se traduz em obras literais, mas antes uma preocupação que te ocupou.
Sim. Não só preocupação como uma coisa pela qual estava a passar e com que sofri bastante durante estes dois meses. Porque apesar de ser privilegiada continuo a ter problemas em arranjar casa. Tive momentos em que achei que não ia conseguir arranjar uma casa e isso obviamente trouxe-me uma instabilidade emocional que me fez deambular entre desespero e alento e foi isso que fez com que essa exposição acontecesse.
No passado já te debruçaste sobre outras temáticas, como a desigualdade de género no meio artístico. Um artista deve preocupar-se com os problemas sociopolíticos do seu tempo?
Acho que sim. Para mim só faz sentido produzir, criar coisas novas, criar peças, se for para de alguma forma estimular o pensamento, criticar. Quer dizer, criticar não é bem o termo, porque não quero dar moralismo às pessoas. Quero pelo menos cutucar. Cutucar é uma palavra de português do Brasil, não é? Tenho visto muito BBB [Big Brother Brasil]…
Mas não reconheces o tom crítico na tua obra?
Reconheço o tom crítico, mas muitas vezes é para mim. São notas para mim própria. Sou eu a dar-me na cabeça. Não sempre, mas também. Sou um bocado hater. Venho de um background super punk, então sempre cresci com as letras assim mais pesadas do punk, mais políticas. Acho que isso se reflete muito no meu trabalho.
Na forma interventiva como te posicionas enquanto artista.
Sim.
A partilha que fizeste em outubro no Instagram sobre nómadas digitais teve impacto.
Teve imenso impacto.
Estás a dizer isso com um sorriso.
Porque odeio ter muitos likes ou ficar viral. Amo pessoas que ficam virais, odeio que isso me aconteça a mim. Não que tenha ficado viral. Vá, ficou um bocado viral. Odeio mediatismo, odeio fazer parte deste grupinho de pessoas que outros look forward to. Tenho e sigo tantas pessoas específicas que gosto de ver o que fazem que depois fico demasiado consciente comigo própria. Que pessoa estou a ser para os outros? Isso deixa-me bastante insegura.
Essa recusa em ser essa pessoa idolatrada por alguém vem de sofreres de síndrome de impostor, isto é, de achares que não mereces estar nesse lugar, ou de simplesmente não te quereres expor?
Não me quero expor. E também sofro de síndrome de impostor, não te preocupes. Há um pouco de tudo aqui! Mas é mais de não me querer expor. Sou uma pessoa que gosta muito de estar sozinha no meu canto e de não falar com ninguém durante uma ou duas semanas.
Mas reconheces que a tua obra tem um caráter de partilha e de viralidade fácil?
Sim. É precisamente por isso que já nem partilho tanto o que faço na internet. Mas sim, tem esse caráter. O que é que posso fazer? Nada, tenho de continuar a partilhar porque é o meu trabalho. Mas é por isso que cada vez mais tenho vontade de fazer coisas que são mais de nicho e ter referências que são muito específicas e que sei que nem toda a gente vai perceber.
Do género que não é partilhado pela Madonna [a cantora visitou a exposição “As Happy As Sad Can Be”, na galeria Underdogs, em Marvila, 2017, e partilhou no Instagram].
Sim!
Isso deixou-te como?
O quê?
A partilha da Madonna do teu trabalho. Foi uma alegria ou um holofote que não desejavas?
Tudo o que me dá mediatismo põe-me mal.
Incluindo dar entrevistas?
Sim. É sempre bom e mau. É ótimo saber que a Madonna gosta do trabalho e que está interessada em comprar. Mas o mediatismo, todo o circo que se faz à volta disso… “Ai, a Madonna foi ver a exposição da Wasted Rita”. Isso não adoro. Mas obviamente traz pessoas novas e isso também é bom e tenho de saber lidar com tudo isso.
A visibilidade também te permite chegar a pessoas com temas pertinentes que queres passar enquanto artista, suponho.
Sim, mas o meu trabalho já está muito na internet. Se meto uma coisa no Instagram já é partilhável e já chega a pessoas diferentes. Basta uma pessoa fazer share que chega a pessoas diferentes. Não acho que este mediatismo seja assim tão necessário. Vá, eu sei que é necessário, mas não gosto.
Voltando às obras sobre os nómadas digitais, muitas pessoas reconheceram-se naqueles pensamentos [“digital nomads saved my city” ou “digital nomading is my passion” eram algumas das tiradas]. Porque achas que as pessoas se identificam tanto com o que escreves?
Queria só esclarecer que não era sobre os nómadas, era sobre o visa para os nómadas digitais. Senti que não me foquei tanto nisso e depois houve interpretações demasiado fora que vão completamente tudo aquilo que acredito. Metes uma coisa na internet, ainda por cima o que faço não é um texto, são frases, no máximo um conjunto de frases, então a interpretação disso depende um bocado daquilo que tu acreditas e daquilo que tu és. É esta interpretação daquilo que ponho na net que às vezes me assusta um bocado também.
Preocupas-te com isso quando estás a criar?
Sim, bastante. Sei que sou um bocadinho provocadora. No sentido de provocar as pessoas do mal, não as pessoas do bem. E sim, eu sei quem são as pessoas do mal e quem são as pessoas do bem. Sou eu que dito isso!
“O meu trabalho é uma reação a coisas más”, disseste numa entrevista ao Diário de Notícias, em 2017. Ainda é assim?
Ah, que boa frase sobre o meu trabalho que eu soube dizer há uns anos atrás. Sim, é. É mesmo. Quando estou a passar por coisas más, ou quando estou a sentir coisas que não percebo muito bem, preciso de escrever e de pôr as coisas mais organizadas em palavras. Sou muito confusa a falar, verbalmente, oralmente. Na escrita sou bastante mais seletiva.
Muitas das obras são frases curtas. O teu pensamento também é assim tão sintético?
Não, não.
Mas estas composições são imediatas?
Depende. Às vezes sim, outras vezes são coisas muito pensadas. Aliás, nesta exposição há peças que foram feitas num minuto porque a coisa saiu e outras que foram feitas durante dias porque eu estava à volta de um assunto que queria perceber como é que podia falar disto de uma forma mais coerente com tudo o resto. Mas mesmo essas que saem espontaneamente surgem de um pensamento que tenho diariamente. Não é do nada, não é magia que acontece na minha cabeça. Diariamente penso sobre coisas e depois vou tendo ideias para coisas escritas.
Como é o processo de criar: é diário ou há muita observação e, mais tarde, um momento de criação?
Observo muito e vou tirando notas no telemóvel. Antes era uma coisa diária, quando era novinha, quando a cabeça estava fresca. Mas também nessa altura estava a começar a minha carreira, sentia muita pressão.
De produzir?
Sim. Agora como já não estou tanto em redes sociais também já não sinto tanto essa pressão, já me deixei estar um bocadinho mais desligada disso. Produzo quando tenho que o fazer ou quando me acontece alguma coisa que me faz ter uma ideia.
Estás mais desligada das redes sociais, mas esta exposição explora a cultura dos influenciadores digitais e dos reality shows, que hoje estão intimamente ligados às redes sociais também. Mergulhaste nesse universo com este propósito?
Quando digo que estou desligada das redes sociais é das minhas redes sociais! Uma coisa que fiz nesta exposição foi um bocadinho essas duas coisas que disseste. Como estava a sofrer de uma ansiedade que estava a controlar toda a minha vida, que era o não ter casa, o que fazia para estar menos ansiosa era ir para o TikTok ver outro tipo de coisas que me davam uma ansiedade menor e mais controlável, para me esquecer da ansiedade primária que estava a controlar a minha vida. Muitas dessas referências do TikTok, estas horas passadas lá, estão na exposição.
Que tipo de conteúdo vês? Pessoas a limpar frigoríficos, pessoas a maquilhar-se, qual é o conteúdo predileto?
Gosto muito de TikTokers de nicho. Não vou dizer os nomes delas, mas são pessoas com poucos seguidores com quem tenho muita empatia e simpatia.
Algum tema que as une?
São só elas a falar da vida. Não tenho tema. Além disso, vejo muitos TikToks sobre desequilíbrios hormonais, pessoas a mostrar os melhores cafés para brunches em Lisboa, mas esses passo sempre à frente. Vejo muita coisa.
Isso relaciona-se com os reality shows de que forma? Na mesma perspetiva voyeurista?
Muito, sim. Mas, na verdade, os reality shows também não são todos, são específicos.
O que vês? Big Brother Brasil?
Sim, neste momento não vejo mais nada a não ser Big Brother Brasil (BBB) e TikTok. Mas o BBB consumo mesmo de uma forma doentia. Não é doentia, vá. Bem, se calhar um bocadinho. Acompanho mesmo 24 horas. Agora já não fico a ver até às quatro da manhã porque também nesta fase de produção é impossível, mas antes ficava até às quatro da manhã a ver quem é que ia ser nomeado e quem é que ganhava a prova do líder. Acho que também tem um bocado a ver com o facto de estar num processo solitário que é criar uma exposição a solo. Sou só eu na minha cabeça a pensar sobre o que sinto e o que aquilo que me trouxe. Acho que tem a ver com querer ter outras pessoas a falar no background pelo menos, quando estou a pintar uma tela ou a fazer outra coisa qualquer. É mais companhia do que inspiração, se calhar.
É raro ouvir um artista falar do consumo de reality shows. Achas que há pudor em assumir que se é fã de um conteúdo dito mainstream?
Não sei.
Ver um reality show é um guilty pleasure?
Não é, de todo. Não há nada guilty associado a isto. Acho que deve haver poucos artistas que veem reality shows. Também percebo isso. I mean…
Consegues reconhecer porque é que te estimula ver um programa deste género?
O Big Brother Brasil em especifico estimula-me muito. O brasileiro, porque cá nem consigo ver sequer, aquilo é horrível, manipulado, um Big Show Sic brega-core. Mas o BBB é inevitavelmente um reflexo da sociedade. Por exemplo, esta edição está a ser muito sobre racismo estrutural que nem eles lá dentro percebem. Agora estão a começar a perceber. É a edição com mais pessoas negras e com mais pessoas negras a chegar à final, mas só agora é que eles estão a perceber a dualidade de tratamentos. Quando uma pessoa branca faz uma coisa dizem “ah, está a aprender, vamos tratar disto da melhor forma”. Quando é uma pessoa negra existe outro tipo de tratamento. É um bocado perverso dizer que está a ser interessante ver isso. Mas realmente está a ser.
Por falar em dualidade de tratamentos, intitulaste a tua última exposição aqui na galeria Underdogs, em 2019, de “E agora para algo completamente diferente: Uma exposição que inclui pelo menos uma artista mulher”. Depois disso, já passaram por aqui outras exposições individuais de mulheres: Tamara Alves, em março de 2020, Swoon, em agosto 2020, e Raquel Belli, em março deste ano. Achas que foi uma consequência das tuas palavras?
Acho que sim. Não quero estar a soar super convencida, mas acho que sim. Mas ainda bem. Escolhi esse título precisamente para isso, por isso se fez mossa ainda bem. Criou mudança.
No entanto, numa entrevista ao Público em 2015 dizias: “Não gosto muito de pensar nessa parte, no que é que o meu trabalho provoca”. Nem quando provoca uma coisa aparentemente boa?
Acho que quando disse isso era mais “não quero pensar no que é que o público…” [pausa] Mas o título realmente foi feito para provocar a galeria a trazer mais mulheres, por isso… Às vezes sim, outras vezes não. O ser humano é muito complexo e muito contraditório e estou cá para ser contraditória.
O que acontece é um reflexo do que está a acontecer no resto do país, ou ainda há muitas portas por abrir?
Acho que está a começar a ser falado e está a começar a haver muito mais essa consciência, não só nas artes visuais, mas também na música, como o caso do Paredes de Coura no ano passado de não ter mulheres no line-up, ou ter muito poucas. Só que a partir daqui depois surgem outras questões: pessoas negras, pessoas trans. Obviamente que é bom haver mulheres, mas não é só haver mulheres. Também há outras pessoas que têm de ser puxadas para galerias e para estes espaços, senão não vão ter a visibilidade que merecem. É um trabalho contínuo. Estou à espera de mais.
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Quando se pesquisa pelo teu nome há poucas entrevistas. Isso foi uma coisa premeditada?
Sim.
É essa busca pela sombra, por fugir da exposição.
Sim, tem a ver com isso, não me querer expor. Sou uma pessoa tímida, gosto de estar no meu canto. Tem a ver com o facto de ser uma pessoa estranha e ter de falar com um estranho e não saber se vai correr bem, se vai correr mal…
Porque é que te achas uma pessoa estranha?
Essa pergunta foi um bocado “o que é que dizem os teus olhos”.
Foi?
Se calhar não sou assim tão estranha. Sou awkward, só isso. Sou uma pessoa que consegue estar um mês sem falar com pessoas na boa, a viver a minha vida super tranquila.
O confinamento então foi um passeio no parque?
Foi, mas vivo com dois amigos, por isso estive com pessoas na mesma. Mas não foi, a pandemia foi horrível. Na altura achava que estava tudo bem, que estava a conseguir aproveitar para estar em casa e até estava a lidar bem com aquilo, mas quando olho para trás estou super traumatizada com aquele tempo de quarentena e tudo o que fiz naquela altura. Estava muito mal e não percebia. É horrível pensar nisso.
Conseguias ser criativa?
Não me forcei a ser criativa nessa altura. Again, privilegiada. Fiz muitas coisas, mais para mim do que para comissões ou assim. Agora que penso até fiz algumas coisas, consegui. Mas não acordava com vontade de pegar num caderno e começar a escrever, não. Acordava com vontade de ir cozinhar com o meu colega de casa.
No Porto em 2016, com a exposição “The People, The Living Dying and All The Sarcasm Fun in Between”, incitavas o público a visitar a exposição com a possibilidade de, através de uma instalação, poder “dar tiros em Trump.” Em 2017, em Lisboa, em “As Happy As Sad Can Be”, a atração era “ser possível sacar o Harvey Weinstein de uma caixa de brinquedos.” E agora?
Venham experimentar realidade virtual e viajar para um mundo perfeito [risos].
O que é que vais fazer a seguir? Ouvi-te dizer que “o sonho de qualquer artista é ir para as Bahamas a seguir a uma exposição a solo” (Entrevista ao podcast “Até tenho amigos que são”, em 2018). Já tens viagem marcada?
Não tenho viagem marcada não. Infelizmente tive de mudar de casa e pagar uma renda e uma caução, e comprar mobília. Não tenho dinheiro para ir às Bahamas, mas vou descansar. Durante sete dias.
Sete dias?
Uma semana. Achas muito?
Diz-me tu.
Depois de dois meses sem fins de semana acho que é OK. Vou descansar de pensar em coisas novas. Entretanto, até dia 10 tenho de ter conceito para uma coisa que vou fazer em junho, uma nova exposição, não a solo. E tenho de fazer uma peça para uma exposição coletiva em Los Angeles. E tenho de lidar com outros projetos que ainda não posso revelar muito. Não estou entusiasmada com outros que tenho de fazer, mas tenho de pagar uma renda.
Enquanto artista, como é gerir o que se quer fazer e o que é para pagar as contas?
São muito poucas as coisas que faço só porque quero pagar a renda. Estou a falar como se vivesse no limiar de conseguir pagar a renda. Não, está tudo bem. É só uma expressão, mas não é fácil gerir isso, não. Neste momento já consigo dizer não a muitas coisas, mas às vezes tens de lidar com o facto de ir criar uma coisa para o mundo que não queres muito, mas precisaste de e tens de ceder ao capitalismo.
Há uma diferença no entusiasmo se é uma coisa que criaste espontaneamente ou se é comissionada?
Não, eu nunca tenho entusiasmo…
Wasted Rita, a artista não entusiasmada?
Pretty much. Estou a brincar. É muita a diferença. Mas também podes pegar nessa falta de entusiasmo e fazer com que isso seja o conceito.
O motor, como aqui o desespero de ser despejada.
Sim. Sou muito boa a pegar em sentimentos maus e conseguir picar-me a mim própria até conseguir algum entusiasmo com aquilo que estou a sentir.
Ainda apontas resultados do FCP em cadernos?
[risos] Leste isso numa entrevista. Não, já não vejo futebol há muitos anos. Desde que mudei para Lisboa.
Desapegaste-te da bola?
Super. Comecei a ter uma vida. Isso era quando estava em Águas Santas, em casa dos meus pais. Em Águas Santas não há muita coisa para fazer. Era viciada em futebol e especificamente no Futebol Clube do Porto. Tinha uma caderneta onde apontava os resultados e quando ia ao estádio também era sensitiva o suficiente para saber em que baliza é que ia marcar golo.
És supersticiosa?
Não, mas uma vez consegui mesmo adivinhar que aquela baliza ia ter dois golos. A partir daí senti que tinha poderes de bruxinha.
Sobre a mais recente polémica com Pinto da Costa e Sérgio Conceição, alguma superstição sobre o que vai acontecer?
O que é que se passa com eles os dois? Não tenho qualquer contacto com o futebol hoje em dia. É como se fosse uma vida passada.
Alguma vez te imaginarias a entrar num reality show? Ou seria impensável?
Impensável. Se imagino como seria? Sim.
Que tipo de concorrente serias?
Seria logo expulsa. Ficava toda a gente: “Que estranha esta gaja, vamos tirá-la”.