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O que foi anunciado? (E que palavras foram dadas)?

Diogo Lacerda Machado serviu de “porta voz meramente circunstancial” numa cerimónia em que sobraram os elogios e os agradecimentos mútuos mas faltaram as explicações concretas. Na segunda-feira, na apresentação da proposta “razoável, equilibrada e exequível” elaborada pelo grupo de trabalho liderado pelo melhor amigo de António Costa, lançou-se as bases para uma solução para este problema que se arrasta há anos. Mas até Marcelo Rebelo de Sousa recusou comentar porque ainda não tinha percebido “exatamente como” vai funcionar o esquema.

As duas principais informações/garantias concretas foram as seguintes. Em primeiro, Diogo Lacerda Machado informou que os lesados podem receber até um total de 286 milhões de euros, num cenário de aceitação plena da proposta, e que irão abdicar de receber o restante que, na sua opinião, lhes é devido (Lacerda Machado falou num total de 475 milhões que são reclamados). Mas podem vir a receber mais (ver pergunta mais adiante)

Além disso, ao mesmo tempo que usava metáforas como “quase endireitar a sombra da vara torta“, o primeiro-ministro António Costa limitou-se a dizer que tinha de se encontrar uma solução para defender “a credibilidade dos produtos financeiros” comercializados em Portugal e a “confiança” no sistema bancário. Por outro lado, deixou uma garantia: “os contribuintes não terão de assegurar, com o seu esforço financeiro, uma ultrapassagem” desta situação.

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Quais são as principais características do plano, então?

O Observador adiantou, na semana passada, em primeira mão, os detalhes do plano. Logo então, explicou-se que:

  • os investidores que tenham investido até 500.000 euros receberão 75% do capital investido, com um teto máximo de 250.000 euros por aplicação;
  • e os investidores que tenham aplicado valores superiores a 500.000 euros receberão 50% do capital investido, sem teto máximo.

Exemplo: Para uma aplicação de 400 mil euros serão pagos 250 mil euros, porque é o valor máximo possível para esse montante, ainda que seja abaixo dos 75%. Já para uma aplicação de 600 mil serão pagos 300 mil euros. Uma aplicação de dois milhões de euros recebe um milhão de euros.

Os valores serão pagos em três prestações, caso o plano seja aprovado por mais de metade dos 2.140 clientes e a solução avance. Prevê-se um prazo de adesão até 30 de abril de 2017 e, depois disso, nos 30 dias seguintes (até final de maio) já será “adiantada” uma primeira parcela.

Em 2018 haverá uma segunda parcela e em 2019 uma terceira, ficando concluídos os pagamentos aos lesados.

O valor será reembolsado por aplicação e não por cliente (ou seja, isto porque há aplicações que têm mais do que um titular).

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Mas como é que sabemos destes detalhes?

Estas informações foram, contudo, transmitidas por fontes próximas do processo, na altura em que o Observador deu a notícia original. Nos últimos dias, quem tem dado mais detalhes sobre o plano, publicamente, são os membros da Associação dos Indignados e Enganados do Papel Comercial (AIEPC), nomeadamente os advogados. E ainda esta terça-feira deverá ser colocado no site da associação todos os contornos da proposta.

Do governo, que segunda-feira convidou os jornalistas à Residência Oficial do Primeiro-ministro, ainda não se ouve uma palavra sobre como se prevê funcionar o plano.

A cerimónia de segunda-feira, que não deu aos jornalistas o direito de fazer perguntas, serviu a António Costa para rejeitar as críticas de quem, como o antigo primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, considera que as eventuais irregularidades na venda destes produtos são coutada dos reguladores e do poder judicial.

“Uma das funções do Estado é administrar a Justiça”, mas nem sempre isso diz apenas respeito ao sistema judicial: a política pode e deve desempenhar um papel — “a mediação, a conciliação, a arbitragem são outras formas de o fazer”. “O que estava aqui em causa não era só satisfazer necessidades urgentes de alguns dos lesados, era também a credibilidade dos nossos produtos financeiros e da confiança no funcionamento dos mercados financeiros”, afirmou o primeiro-ministro.

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De onde vem o dinheiro?

O governo falou em “adiantamentos” que, nos termos que têm sido noticiados, serão valores pagos por um veículo que ainda será criado – um fundo de indemnizações. Contudo, uma vez que este fundo nascerá sem dinheiro, a intenção é que seja conseguido o valor necessário através de um financiamento junto da banca, logo de imediato, com garantia do Estado e contragarantia do Fundo de Resolução bancário, ou seja, dos outros bancos do sistema.

O empréstimo que será pedido aos bancos depende da adesão dos clientes lesados a esta solução. Se forem todos, serão 286 milhões.

A ideia que sempre norteou este processo, explicou fonte próxima ao Observador, foi sempre a de evitar que a solução encontrada possa ter impacto no défice público.

É por isso que a forma como será prestada a garantia do Estado, se será direta ou indireta, só será decidida depois do primeiro trimestre, conforme o governo tenha margem de manobra nos cálculos do défice. Além disso, estando envolvido o Fundo de Resolução, é preciso saber que abertura terá o BCE para aceitar o envolvimento das instituições financeiras, que já se manifestaram contra esta solução “inaceitável” (palavra de Fernando Faria de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Bancos, ou APB).

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Como é que o Fundo de Indemnização vai recuperar o dinheiro?

Os clientes que aceitarem a solução cedem os direitos judiciais dos processos já colocados em tribunal contra entidades como o BES, o Novo Banco, o Banco de Portugal e a CMVM e, por outro lado, e administradores ligados ao Grupo Espírito Santo.

Como o Observador noticiou em junho, o Fundo de Indemnização ficará com todos esses direitos e tentará recuperar esses recursos através dos processos que forem ganhos em tribunal — nomeadamente envolvendo o arresto de bens do Grupo GES, incluindo Ricardo Salgado e outros administradores.

Diogo Lacerda Machado explicou que o objetivo do Fundo de Indemnização é “recuperar e cobrar todo o valor que seja devido, o mais que puder, por todos aqueles que porventura sejam responsabilizáveis pela insatisfação destes créditos“. O porta-voz do grupo de trabalho disse que o objetivo é recuperar, “a prazo, a totalidade do dinheiro que for adiantado e, se porventura, for possível, como em abstrato é possível, recuperar algo mais de quem porventura deva, esse excesso será repartido entre os lesados“.

Em conversa telefónica com o Observador, esta terça-feira, Ricardo Ângelo, presidente da associação dos lesados, mostrou-se muito confiante de que será possível recuperar para o Fundo de Indemnização, em tribunal, os recursos a partir dos arrestos de bens. “Não tenho dúvidas de que este será um processo ganhador“, explicou Ricardo Ângelo, notando, contudo, que muitos dos aforradores têm alguma idade ou estão saturados deste processo e não se importam de aceitar perder 25% (ou 50%, nos casos de investimento maior).

Para já, o valor que o plano prevê pagar aos lesados significa para os clientes uma perda total de 199 milhões de euros (face aos 485 milhões de créditos totais), mas significa também que recebem este dinheiro em pouco mais de dois anos (30% até junho de 2016 e o restante até aos primeiros meses de 2019) e que não têm de esperar por decisões de tribunais que podem demorar anos.

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Os lesados ficam satisfeitos com esta solução?

O presidente da associação dos lesados, a AIEPC, diz que vai expor a solução a cada um dos seus associados. “E cabe a cada um aceitá-la ou não“, afirmou Ricardo Ângelo. O responsável, dentista de profissão, manifestou-se, contudo, confiante de que será possível persuadir mais de metade das pessoas. “Penso que só dentro da associação, que já representa mais de metade do universo dos lesados, o vamos conseguir”, afirmou.

Para ficar claro: o plano só avança se mais de metade dos lesados aceitar (e a associação representa mais de 60% das pessoas), mas mesmo que isso aconteça, nada impede que alguém não aceite e continue em tribunal para tentar ser ressarcido.

Mesmo dentro da associação, há quem não tenha gostado da solução. O Jornal de Negócios falou com Mário Lopes, um membro da associação que representa um conjunto reduzido de lesados que recusa a distinção feita entre quem investiu mais e quem investiu menos. “Não vemos qualquer justificação para esta diferença de 25 pontos percentuais entre os lesados. Todos fomos enganados da mesma forma“, afirmou Mário Lopes, que ao Observador disse que estão a ser sensibilizadas entidades como a Presidência da República sobre esta questão.

Em conversa com o Observador, o investidor explicou que é injusto que o cálculo do reembolso seja feito por aplicação, porque no momento da subscrição dos produtos, o aforrador teve pouca influência na escolha das séries específicas em que se investia — foi o gestor de conta que, explicou Mário Lopes, escolheu se o dinheiro era aplicado numa série ou em várias.

Isso fará com que, por exemplo, segundo Mário Lopes, haja pessoas que tenham, por hipótese, quatro aplicações de 400 mil e, portanto, recebam 75% de cada uma delas (1,2 milhões). Em contraste, alguém que investiu menos dinheiro total (por hipótese, um milhão) e vai receber menos: 50% (500 mil).

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Se os lesados receberem, como podem aplicar o dinheiro?

O Montepio não perdeu tempo e apresentou-se, desde logo, como uma instituição que quer apresentar uma proposta comercial atrativa aos clientes que queiram investir o dinheiro que vierem a receber do mecanismo de compensação.

Foi o próprio presidente da Associação AIEPC, Ricardo Ângelo, que o adiantou. Um dos advogados da associação, Miguel Henrique, explicou numa sessão de esclarecimento após a sessão pública de apresentação oficial da solução, que foram contactados vários bancos, portugueses e estrangeiros, e a administração da Caixa Económica Montepio Geral mostrou-se interessada em apresentar uma proposta comercial atrativa aos clientes, caso o valor que estes investirem no banco seja considerável.

O advogado garantiu que cada cliente é “livre, completamente autónomo” de decidir se quer investir o dinheiro que poderá receber no Montepio, ou não, e que o objetivo é que a “estas pessoas consigam mais valor”. Contudo, sublinha-se que a proposta incidirá sobre os “os produtos mais conservadores que existem no mercado”.