O blogue comregras.com partilhou a informação num título a 7 de março e a publicação teve cerca de 140 mil partilhas em dois dias. “Coronavírus permanece ativo até 9 dias em superfícies (ratos, teclados, puxadores de portas, etc.)”. A intenção é alertar para a necessidade de manter desinfectadas as superfícies e as mãos que as contactam, o que as autoridades de saúde pública já recomendam, embora não seja possível afirmar, neste momento, quanto tempo o vírus em causa, o SARS-CoV-2 (infeção que provoca o Covid-19), resiste em superfícies. A informação divulgada não está provada cientificamente.
A publicação refere “o coronavírus”, levando o leitor a acreditar que a informação que divulga se refere ao novo coronavírus, que dá origem ao Covid-19. E este ponto faz toda a diferença, tendo em conta que ainda há muitas dúvidas sobre este novo vírus, incluindo em matéria de sobrevivência do mesmo quando em contacto com as chamadas “superfícies inanimadas”. Nesta matéria concreta a que se refere, o que existe é um trabalho sobre os coronavírus em geral.
No artigo difundido pelo blogue é dito que “um estudo realizado este mês revela que o coronavírus pode ficar ativo até 9 dias em inúmeras superfícies”. Refere-se ao estudo publicado online no início de fevereiro pelo “Journal of Hospital Infection” (que disponibiliza, na íntegra, no final do texto) sobre “A persistência dos coronavírus em superfícies inanimadas e sua desativação com agentes biocídas”. A conclusão desse estudo é a seguinte: “Os coronavírus humanos podem permanecer infeciosos quando em superfícies inanimadas até 9 dias. A desinfeção de superfícies com [produtos com] 0,1% de hipoclorito de sódio ou 62 e 71% de etanol reduz significativamente a infeciosidade por coronavírus no espaço de um minuto. Contamos com um efeito semelhante contra o SARS-CoV-2” — o nome do novo coronavírus que foi detetado na China no final de 2019 (“Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavírus 2”) cuja infeção provoca a doença Covid-19 (Coronavirus disease 19).
O estudo tira esta conclusão a partir do comportamento de outros coronavírus, e não de “o coronavírus”, como referido pelo site que divulga este texto. As autoridades de saúde no mundo têm explicado que o facto de o SARS-CoV-2 ser um vírus novo não permite ainda esclarecer todas as dúvidas que sobre ele são suscitadas. Pelo que os quatro especialistas envolvidos neste trabalho reviram a informação que já existe sobre a sobrevivência dos coronavírus humanos e veterinários quando presentes em superfícies inanimadas, bem como as estratégias para lhes pôr fim quando isso acontece.
Para isso, analisaram 22 estudos que “revelam que os coronavírus como o SARS (Síndrome respiratória aguda grave), o MERS (Síndrome respiratória do Oriente Médio) ou o coronavírus humano endémico (HCoV) podem perdurar em superfícies inanimadas como o metal, vidro ou plástico até 9 dias”. Estes vírus resistem por este período à temperatura ambiente, sendo que “a uma temperatura de 30ºC ou mais, a duração da persistência é mais curta”, referem.
Os especialistas avisam que a “contaminação de superfícies frequentemente tocadas em serviços de saúde são, portanto, uma fonte potencial de transmissão” destes vírus. Dizem também que não existem “dados sobre a transmissibilidade de coronavírus de superfícies contaminadas nas mãos”, embora refiram que “no vírus influenza A um contato de 5 segundos pode transferir 31,6% da carga viral para as mãos”, por exemplo.
Não se referem em concreto — por falta de informação — ao vírus que está a concentrar, neste momento, medidas de prevenção e contenção por todo o mundo, mas ao que se verifica noutros vírus da mesma família. Ainda assim previnem que “durante uma situação de surto parece plausível reduzir a carga viral nas superfícies, por desinfecção, especialmente nas superfícies frequentemente tocadas ou à volta do paciente, que é onde deve estar a maior carga viral”. Também relembram a recomendação da Organização Mundial de Saúde no sentido de “garantir que os procedimentos de limpeza e desinfecção ambiental sejam seguidos de forma consistente e correta. Limpar completamente o ambiente e superfícies com água e detergente e aplicando normalmente desinfetantes usados ao nível hospitalar”.
No site do SNS24 refere-se que, “apesar de se tratar de um novo vírus e ainda não existir um total conhecimento sobre este, sabe-se que é diferente dos outros, apesar de ter alguma semelhança (geneticamente) ao SARS. É necessário mais tempo de investigação para se conseguir apurar todas as suas características e qual o tratamento mais adequado”.
Apesar das semelhanças com vírus do género já estudados, não se sabe tudo sobre o vírus que provoca o Covid-19, e não existem provas sobre o tempo que permanece ativo quando em contacto com “ratos, teclados ou puxadores de portas”, como refere o título do texto do comregras.com. Não se sabe se dura mais de 9 dias nessas condições ou menos. Nem que temperatura suporta, nem qual a sua resistência quando exposto a um tipo específico de material inanimado.
O diretor do Centro de Prevenção e Controlo de Doenças dos EUA, Robert Redfield, disse à Reuters que, quando em contacto com cobre e aço, por exemplo, estes vírus costumam resistir “cerca de duas horas”. “Mas noutras superfícies — papelão ou plástico — é mais longo, e isso está a ser analisado”.
Segundo o SNS 24, sabe-se que o novo vírus pode ser transmitido através de “gotículas respiratórias, contacto direto com secreções infetadas, aerossóis em alguns procedimentos terapêuticos que os produzem (por exemplo as nebulizações)”. Que pode transmitir-se de pessoa para pessoa, através das “gotículas respiratórias – espalham-se quando a pessoa infetada tosse, espirra ou fala, podendo serem inaladas ou pousarem na boca, nariz ou olhos das pessoas que estão próximas, contacto das mãos com uma superfície ou objeto infetado com o SARS-CoV-2 e se em seguida existir contacto com a boca, nariz ou olhos pode provocar infeção”.
Perante tantas incertezas sobre o novo vírus, as autoridades de saúde por todo o mundo recomendam que as pessoas se previnam “lavando as mãos com sabão por, pelo menos, 20 segundos, ou limpá-las com soluções feitas à base de álcool, gel ou lenços”, como consta no site do Centro Europeu para Prevenção e Controlo de Doenças. E isto porque o novo vírus entra no corpo humano através do “olhos, nariz e/ou a boca. “É importante evitar tocar na cara com as mãos sujas”, refere a mesma autoridade, independentemente daquilo com que se contactou.
Conclusão
É enganador afirmar de forma perentória que o SARS-CoV-2, que provoca o Covid-19, sobrevive até 9 dias em superfícies como puxadores, teclados ou outros objetos uma vez que ainda não existem dados que o permitam concluir. O estudo realizado por quatro especialistas, que é citado no texto, refere esta conclusão mas em relação à análise de outros coronavírus sobre os quais já existem mais dados, como o SARS ou o MERS. O artigo aqui analisado induz o leitor em erro ao referir que esta conclusão se retira de “o coronavírus”, sendo o mais referido nesta altura um específico e que desencadeia o Covid-19. O desconhecimento de todas as características do novo vírus não permite dizer com segurança se 9 dias é um período suficiente ou insuficiente de tempo que o vírus se mantenha ativo quando em contacto com superfícies inanimadas. Ainda assim, as recomendações das autoridades de saúde vão no mesmo sentido: reduzir as portas de entrada no organismo, através da desinfeção cuidadosa das mãos e a restrição de contactos até com o próprio rosto.
De acordo com a classificação do Observador, este conteúdo é:
Enganador
De acordo com a classificação do Facebook este conteúdo é:
PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de factchecking com o Facebook e com base na proliferação de partilhas — associadas a reportes de abusos de vários utilizadores — nos últimos dias.