Um site português com conteúdos políticos jocosos e críticos disseminou recentemente no Facebook uma imagem (ou meme) que alega ter havido três bancarrotas em Portugal, durante os Governos de Mário Soares, António Guterres e José Sócrates. A referida imagem começou a ser partilhada em outubro último e mostra o atual primeiro-ministro, António Costa, com um balão de pensamento (ao estilo da banda desenhada) e as seguintes frases: “O Mário levou o país à bancarrota, o Guterres levou o país à bancarrota, o Sócras levou o país à bancarrota. E eu não posso deixar ficar mal as tradições desta seita marota.”

O site em causa chama-se Não Queremos um Governo de Esquerda em Portugal. É anónimo e gere uma página com o mesmo título no Facebook, aparentemente com cerca de 17 mil seguidores. Ao que se lê, o site terá nascido na sequência das eleições legislativas de outubro de 2015, quando um entendimento entre o Partido Socialista e a esquerda parlamentar permitiu a solução de Governo que ficaria conhecida como “geringonça”, o que o autor, ou autores, do site consideram um “enorme retrocesso democrático passível de colocar em sério risco as liberdades, garantias e valores da República Portuguesa”. A respetiva página de Facebook tem 5 de outubro de 2015 como data de criação, um dia depois das eleições.

O post da página “Não Queremos um Governo de Esquerda em Portugal”

Mesmo considerando o tom jocoso do meme (patente na alcunha “Sócras”, em vez de Sócrates, ou na ironia de “seita marota”, em óbvia referência ao Partido Socialista), o autor difunde a informação de que terá havido uma bancarrota em Portugal durante a governação de Guterres, entre 1995 e 2002. No entanto, isso não corresponde à verdade.

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Se entendermos bancarrota como a suspensão do pagamento dos juros da dívida pública e de outros encargos do Estado, e a necessidade de recorrer a ajuda externa do Fundo Monetário Internacional (FMI) ou do Banco Central Europeu (BCE), a conclusão é a de que o país enfrentou (ou pelo menos esteve perto de enfrentar) essa situação quando chefiavam o Governo Mário Soares, em 1978 e em 1983 (aqui em coligação com o PSD de Mota Pinto), e José Sócrates, em 2011. A prova disso é que estes três governos tiveram de pedir ajuda externa.

Seria mais correto dizer que Portugal esteve à beira da bancarrota como aconteceu mais recentemente em 2011, quando o Governo pediu emprestados 78 mil milhões ao FMI e ao BCE. O próprio ministro das Finanças que acabou por aplicar o programa de ajustamento Vítor Gaspar (do Governo liderado por Pedro Passos Coelho, que se seguiu ao de José Sócrates — o executivo que pediu a ajuda), assumiu que o país esteve à beira de entrar em bancarrota. Ainda assim, Portugal não entrou, do ponto de vista técnico, em bancarrota. E o mesmo se aplica a 1978 e a 1983, apesar de os contextos terem sido diferentes.

Ainda assim, na linguagem comum aceita-se que o recurso a ajuda externa configure uma situação de falência, e por norma a responsabilidade é apontada a quem chefia o poder executivo, mas mesmo assim — se a expressão é aceitável no caso de Mário Soares e José Sócrates — é errado aplicar essa descrição ao período 1995-2002, em que não se verificou um tal pedido de ajuda externa.

Conclusão

A alegação, ainda que em tom jocoso, feita através de uma imagem que circula no Facebook, de que o primeiro-ministro António Guterres levou Portugal à bancarrota é factualmente errada. Outras alegações contidas na mesma imagem, sobre as presumíveis bancarrotas (na aceção popular do termo) no período em que Soares e Sócrates lideraram governos, têm base factual, uma vez que durante esses períodos de governação o país teve de pedir ajuda externa para cumprir os compromissos como Estado.

Assim, segundo o sistema de classificação do Observador este conteúdo é:

Errado

De acordo com o sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook.

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