“Mistérios socialistas.” É assim que uma publicação no Facebook descreve uma série de supostas decisões do Governo sobre os vistos atribuíveis a estrangeiros, criticando o facto de o Executivo ter acabado com os “milionários vistos Gold” apenas para, a seguir, “inventar” outro tipo de visto, o D2, para “brasileiros morarem em Portugal sem investirem”.

Para analisar estas afirmações é preciso ir por partes. Primeiro, porque ainda não se sabe exatamente o que acontecerá aos vistos Gold, uma vez que o pacote da Habitação que o Governo lançou pode ser alvo de alterações do próprio PS e dos outros partidos, mudanças essas que os deputados ainda terão de votar no Parlamento.

António Costa anunciou, de facto, no dia 16 de fevereiro, entre as novas medidas que tinha a apresentar sobre Habitação, a intenção de acabar com os vistos Gold — nessa altura, até chegou a garantir que os novos pedidos não seriam aceites a partir dessa data, para evitar que estrangeiros corressem às autorizações de residência, investindo em imobiliário.

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Os vistos Gold, aprovados em 2012, durante o Governo de Pedro Passos Coelho, garantem uma “autorização de residência para investimento” (o nome formal deste mecanismo) a quem transferir capitais no valor de 1,5 milhões de euros, comprar casas por 500 mil euros ou fizer obras de reabilitação de pelo menos 350 mil euros. Uma possibilidade que levava a oposição, principalmente à esquerda, a acusar o Governo de promover a especulação imobiliária e de “vender cidadania” a estrangeiros, uma vez que quem o obtém ganha um visto de residência, além da possibilidade de circular no espaço Schengen.

Desta vez, o Executivo anunciou o fim do instrumento, mas as alterações que o PS propôs à nova lei vieram acrescentar dúvidas.

Excerto da proposta do PS

Na proposta dos socialistas, disponível no site do Parlamento, mantêm-se algumas exceções que continuam a permitir a aplicação dos vistos Gold, como a transferência de capitais num montante superior a 500 mil euros “destinados à aquisição de unidades de participação em fundos de investimento ou fundos de capitais de risco vocacionados para a capitalização de empresas” ou para “constituição de uma sociedade comercial com sede em território nacional, conjugada com a criação de cinco postos de trabalho permanentes, ou para reforço de capital social de uma sociedade comercial com sede em território nacional, já constituída, com a criação de pelo menos cinco postos de trabalho permanentes ou manutenção de pelo menos dez postos de trabalho, com um mínimo de cinco permanentes, e por um período mínimo de três anos”.

Estas são duas alíneas que já existiam atualmente na lei e que o PS, ao contrário dos casos que têm a ver com imobiliário, não quer revogar.

Em ambos os casos, o valor pode ser inferior em 20% se o investimento for feito em territórios de baixa densidade; e esses vistos serão avaliados a cada dois anos para aferir o seu impacto “na atividade científica, cultural e na promoção do investimento direto estrangeiro e criação de postos de trabalho”. Mantêm-se ainda válidos os pedidos de autorização que ainda estejam “pendentes” e a aguardar decisão “junto das entidades competentes” quando a lei entrar em vigor, frisa também a proposta do PS.

No Parlamento, o líder parlamentar do PS, Eurico Brilhante Dias, veio lembrar que este regime “funcionou sempre pendurado no imobiliário”, pelo que estas alterações vêm mudar esse paradigma, embora a esquerda considere que são insuficientes. “Na verdade, este regime não era capaz de criar postos de trabalho ou de diversificar os investimentos no imobiliário”, argumentou Brilhante Dias, lembrando também a regra da avaliação a cada dois anos. “Tal como fizemos com a revisão da lei para acolher imigrantes e com o regime para os nacionais da CPLP, parece-nos importante olhar para este investimento e perceber se esse regime pode viver sem o imobiliário”, cita o Público.

O fim dos vistos Gold não é, por isso, um dado adquirido — até porque ainda não foi votado, embora o PS consiga previsivelmente fazer valer a sua proposta, uma vez que tem a maioria dos deputados — e tem algumas nuances.

A outra parte da afirmação aqui analisada tem a ver com os chamados vistos D2. Trata-se, na verdade, do visto de residência para exercício de atividade profissional independente ou para imigrantes empreendedores, que a lei estabelece destinar-se a pessoas com “contrato ou proposta escrita de contrato de prestação de serviços no âmbito de profissões liberais” ou que se encontrem “habilitadas a exercer a atividade independente, sempre que aplicável”.

O visto é concedido a “imigrantes empreendedores que pretendam investir em Portugal” sempre que “tenham efetuado operações de investimento”; que comprovem ter “meios financeiros” em Portugal e uma intenção de investir em território português; ou que desenvolvam um “projeto empreendedor, incluindo a criação de empresa de base inovadora (…).

Ou seja, o visto — que já existe e, portanto, não foi criado como substituto dos vistos Gold — tem características diferentes, aplica-se a condições diferentes e não é destinado especificamente a brasileiros, mas a estrangeiros no geral que cumpram estes requisitos.

Conclusão

Não é verdade que o Governo tenha trocado os vistos Gold pelos D2. Por um lado, porque os primeiros acabam para cenários de investimento em imobiliário, mas mantêm-se noutros casos — isto, se a proposta do PS for aprovada no Parlamento; por outro, porque o segundo tipo de visto não foi inventado nessa sequência e não é destinado especificamente a brasileiros.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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