O racismo continua a ser tema de discussão na sociedade portuguesa, suscitando as mais diversas opiniões nas redes sociais. No passado dia 12 de fevereiro surgiu uma publicação num grupo de Facebook com mais de 3o mil membros onde se dizia o seguinte: “15 mil milhões de euros para combater o racismo! Nem uma única demonstração de veneração e respeito a Marcelino da Mata.” Esta acusação está ligada à morte do tal tenente-coronel da força de Comandos do Exército, que combateu por Portugal na Guerra Colonial e cujo funeral tem gerado trocas de acusações entre líderes partidários e ativistas anti-racismo. Atingiu as 167 partilhas. A publicação contém, no entanto, dados errados.
A publicação não contextualiza o valor apresentado para “combater o racismo” em Portugal — os tais 15 mil milhões de euros. Mas na realidade política mais recente é possível encontrar uma proposta focada, precisamente, no reforço do combate contra este tipo de estigmatização. Foi em maio do ano passado, quando a deputada não inscrita, Joacine Katar Moreira apresentou uma recomendação ao Governo para que promovesse “uma campanha nacional antiracista”. Outros partidos, como foi o caso do PS, apresentaram também propostas nesse sentido em 2020. A recomendação de Katar Moreira foi publicada em Diário da República a 1 de fevereiro deste ano, depois de ser aprovada a 25 de setembro de 2020 na Assembleia da República.
Ora, no ponto 3) da proposta da deputada não inscrita encontramos a referência à quantia exigida pela deputada. No documento, lê-se a recomendação para que o Governo “proceda à aquisição de espaço e tempo de antena no âmbito da compra antecipada do pacote de publicidade institucional em órgãos da comunicação social, no valor de 15 milhões de euros, pela secretaria-geral da Presidência do Conselho de Ministros, sem prejuízo de outros procedimentos”. Ou seja, não são 15 mil milhões de euros, como refere a publicação, mas sim 15 milhões de euros. Um valor muito inferior ao sugerido, mas em linha com o que foi destinado, para um efeito parecido, aos órgãos de comunicação social para fazer face às perdas registadas por causa da pandemia da Covid-19.
Quanto à ausência de uma “demonstração de veneração e respeito” por Marcelino da Mata, é importante esclarecer que, por um lado, o CDS apresentou um voto de pesar em memória do tenente-coronel africano e, por outro, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, bem como os Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas e o Chefe do Estado-Maior do Exército estiveram presentes no seu funeral, que decorreu no cemitério de Queluz. Portanto, ainda que este seja um tema polémico, gerador de debates intensos na sociedade, algumas figuras políticas fizeram questão de demonstrar o seu respeito por esta figura.
O Observador contactou também o Ministério da Presidência para perceber se a recomendação da deputada única não inscrita tinha sido seguida. De facto, segundo “os objetivos da resolução da AR nº15/2021, o Governo está a desenvolver uma campanha de prevenção e combate ao racismo e discriminação, também enquadrada no âmbito dos trabalhos em curso de elaboração de um plano nacional de combate ao racismo e à discriminação”. Os conteúdos estão a ser definidos, em colaboração com “associações antiracistas e representantes das comunidades racializadas”, explicou o ministério de Mariana Vieira da Silva.
No que diz respeito aos 15 milhões de euros propostos por Katar Moreira para esse programa — um valor igual ao que foi pago pelo governo pela publicidade institucional —, o ministério não detalha ao certo se essa quantia será aplicada na sua totalidade. Em resposta ao Observador, o ministério esclarece que “estão ainda a ser definidos os conteúdos e formato da campanha de prevenção e combate ao racismo e à discriminação, pelo que não é possível adiantar um valor” definitivo para essa ação.
Refere, porém, que os 15 milhões de euros representam o “encargo total da aquisição de espaço/tempo de difusão de ações de publicidade institucional” — trata-se, portanto, do teto custo máximo que a campanha poderá atingir, nas suas várias vertentes. E que esse valor será “alocado a campanhas de publicidade institucional, não só para as medidas diretas de prevenção da pandemia mas também para a retoma da atividade económica e cultural, bem como para endereçar problemas sociais que poderão agudizar-se face à crise económica e sanitária causada pela pandemia da doença COVID-19”.
O Ministério da Presidência sublinha, ainda, que a medida “excecional e temporária de aquisição de espaço de difusão de ações de publicidade institucional, que tem sido usada por múltiplas áreas governativas, não se confunde com a campanha de prevenção e combate ao racismo e discriminação”.
Conclusão
Não é verdade que tenham sido gastos 15 mil milhões de euros para combater o racismo em Portugal. Foi proposto um valor bastante inferior, de 15 milhões de euros, pela deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, através de uma recomendação ao governo para que fosse pago esse valor por um pacote de publicidade institucional em órgãos de comunicação social, com foco nas questões do racismo e da discriminação.
O Ministério da Presidência esclareceu ao Observador que já estão em marcha campanhas com este objetivo, mas que ainda estão a ser definidos que conteúdos e formatos é que serão aplicados. Quanto aos 15 milhões de euros, o ministério afirma que esse valor, pago de forma excecional e temporária no ano passado aos órgãos de comunicação social, não deve ser confundido com a campanha contra o racismo.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota 1: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.
[Artigo atualizado com informações do Ministério da Presidência do Conselho de Ministros relativamente ao custo das ações de combate contra a discriminação e de resposta aos problemas económicos e sociais resultantes da pandemia]