O medicamento Suramina pode ser utilizado contra o alegado efeito “magnético” e o “veneno das vacinas contra a Covid-19”. É desta premissa que parte um artigo que está a ser partilhado nas redes sociais. Trata-se de um texto escrito pela Dra. Judy Mikovits, que é conhecida por espalhar desinformação. Aliás o jornal norte-americano The New York Times chega a tratá-la como “a nova estrela da desinformação sobre o novo coronavírus”.
Vacinas são “magnéticas” ou “venenosas”?
O artigo que está a ser partilhado no Facebook alega que a Suramina protege contra efeitos adversos da vacina contra a Covid-19. O texto lista “magnetismo” como efeito adverso e considera que quem toma a vacina contra a Covid-19 está a ser envenenado. A Direção-Geral da Saúde (DGS) lembra que, “à semelhança de qualquer medicamento, também as vacinas contra a Covid-19 poderão desencadear efeitos indesejáveis”. A autoridade de saúde portuguesa aponta que os efeitos mais comuns “são ligeiros e incluem: reação no local da injeção, dor de cabeça, dores musculares ou das articulações, febre, sensação de cansaço, enjoos e mal-estar geral”. No site da DGS pode ler-se também que, por norma, estes efeitos “resolvem-se espontaneamente no prazo de três dias”.
Ainda assim, a autoridade de saúde aponta também para “sintomas mais graves”, tais como “falta de ar, dor no tórax, inchaço nas pernas, dor abdominal persistente, dores de cabeça intensas e persistentes (mais de três dias), alterações da visão, pontos vermelhos ou manchas na pele em local distinto do local da injeção”.
Ao Observador, o Infarmed — Autoridade Nacional do Medicamento esclarece que as “vacinas contra a Covid-19 não contêm ingredientes que possam produzir um campo eletromagnético no local da injeção ou em qualquer outra parte do organismo” e que “todas as vacinas contra a Covid-19 são isentas de metais como ferro, níquel, cobalto, lítio ou ligas raras, bem como de quaisquer produtos de fabrico eletrónico, como aparelhos de microeletrónica, elétrodos, nanotubos de carbono ou nanofios semicondutores”.
A DGS não aponta magnetismo como efeito adverso das vacinas contra a Covid-19 que estão a ser utilizadas em Portugal — Pfizer/BioNTech, Moderna, Janssen, AstraZeneca. Também não está listado “envenenamento” na sequência da toma destes fármacos.
Para além da DGS, também a Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta como efeitos secundários mais comuns das vacinas contra a Covid-19 dor no local da injeção, febre, fadiga, dor de cabeça, dor muscular, calafrios e diarreia.
O alegado efeito “magnético” das vacinas contra a Covid-19 já foi desmentido noutro artigo de verificação de factos do Observador.
Fact Check. Teste do íman prova que vacinas contra a Covid-19 servem para implantar um microchip?
Suramina
O artigo em análise alega que o medicamento Suramina pode ser utilizado como antídoto para os efeitos adversos das vacinas contra a Covid-19. Trata-se de uma fármaco desenvolvido pela Bayer em 1904 a partir de uma tinta que é de utilização comum nos laboratórios.
Num artigo de verificação de factos, a publicação USA Today aponta que o fármaco tem sido utilizado para tratar a doença do sono africana — uma doença transmitida pela mosca tsé-tsé que é encontrada na África subsariana. Mas, em declarações àquela publicação, um especialista aponta que há efeitos secundários graves associados ao medicamento, tais como toxinas nos rins e fígado, reações oculares, insuficiência suprarrenal e reações alérgicas que podem levar a inflamações ou anemia.
A publicação norte-americana cita ainda estudos conduzidos em julho e outubro que apontam que o medicamento Suramina poderá prevenir o novo coronavírus de se replicar em culturas de células. No entanto, outro estudo publicado em maio contraria esta descoberta.
De acordo com a Sociedade Americana de Microbiologia, este fármaco tem várias utilizações possíveis. Além da doença do sono africana, o medicamento Suramina pode ser administrado para tratar cancro e autismo.
À Agência Lupa, a professora do Departamento de Farmacologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Ana Paula Herrmann, afirma que não existem dados científicos que apoiem a teoria de que a Suramina pode ser utilizada como “antídoto” dos efeitos adversos das vacinas contra a Covid-19. Aliás, a professora explica que “os efeitos mais comuns da aplicação das vacinas são relacionados com a resposta inflamatória, e poderiam ser minimizados com a utilização de um anti-inflamatório comum – como ibuprofeno, entre outros”.
Conclusão
Confrontado com as informações veiculadas na publicação analisada neste artigo, o Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento assegura que “estes relatos não têm qualquer fundamentação científica”. Quanto à premissa de que as vacinas têm um efeito “magnético” o Infarmed atesta contra e esclarece que as “vacinas contra a Covid-19 não contêm ingredientes que possam produzir um campo eletromagnético no local da injeção ou em qualquer outra parte do organismo”. Esta teoria também já foi desmentida noutro artigo de verificação de factos do Observador.
Sobre a Suramina poder ser utilizada como “antídoto” dos efeitos adversos dos fármacos contra a Covid-19, esse não é uma das propriedades conhecidas do medicamento. Apesar de a Suramina ter várias utilizações possíveis, a lista adiantada pela Sociedade Americana de Microbiologia remete para o tratamento da doença do sono africana, cancro e autismo.
Para além disto, à Agência Lupa, a investigadora Ana Paula Herrmann afirma que não há dados científicos que mostrem que a Suramina pode ser utilizada como “antídoto” dos efeitos adversos das vacinas contra a Covid-19, até porque as reações mais comuns estão relacionadas com a resposta inflamatória e podem ser tratadas com recurso a anti-inflamatórios.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.