Há uns anos que se vem dizendo que a China vai ultrapassar os Estados Unidos como a maior potência económica mundial. De facto, se olhássemos para o crescimento do PIB chinês e extrapolássemos para o futuro umas décadas, isso aconteceria.

Mas fazer previsões com décadas de antecedência na economia e na sociedade é naïve. O inesperado acontece com demasiada frequência, mudando radicalmente os pressupostos anteriores. O exemplo paradigmático disso é a queda do muro de Berlim; quem imaginava seis meses antes que aquilo poderia acontecer daquela maneira?

A mudança de contexto internacional foi de tal modo radical, que as previsões anteriores tornaram-se lixo instantaneamente.

No caso do crescimento chinês, no entanto, não parecia necessário uma catástrofe como as medidas do COVID para que a China travasse rapidamente. Isto porque havia e há uma série de problemas estruturais que, se são disfarçáveis a curto prazo, a médio e especialmente a longo prazo, se manifestam infalivelmente.

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O primeiro obstáculo de fundo é a natureza autoritária do regime chinês, ideologicamente comunista. Isso leva a um planeamento centralizado de tudo, feito por uns ideólogos nos seus gabinetes, desconectados da realidade do terreno.

E a uma rigidez incapaz de se adaptar às mudanças de circunstâncias (que muitas vezes é simplesmente constatar a realidade que não se quis ver antes). Como os ideólogos não podem falhar, não só reprimem qualquer crítica como estão dispostos a negar todos os factos que contrariam as suas assumpções.

O gabinete de estatística chinês é conhecido pela sua pouca fiabilidade.

O centralismo é o maior inibidor da iniciativa dos cidadãos. Os cidadãos são os que têm interesse em crescer economicamente e viver melhor. São o maior activo que um país ou instituição pode ter. Inibir os cidadãos é inibir os activos do país. E isso acaba por levar à estagnação.

Outro exemplo de política centralista desastrosa, foi a de natalidade, que impôs não mais de um filho por casal, recorrendo mesmo a abortos forçados e outras selvajarias para forçar a política. O resultado foi um défice de natalidade enorme e um desequilíbrio entre os sexos: os chineses preferem ter rapazes a raparigas, e como só podiam ter um, abortavam até aparecer um rapaz. Da última vez que vi os números, havia um déficit de 16 milhões de mulheres jovens, e um grande tráfico de mulheres a partir dos países vizinhos para colmatar a lacuna.

Este controlo de natalidade tem implicações económicas enormes. A população chinesa está a envelhecer a grande ritmo, porque a percentagem de jovens é baixa e vai continuar a diminuir porque a natalidade continua a descer. Isso resulta em baixa produtividade, falta de iniciativa (o governo não a quer, de qualquer modo), falta de inovação, falta de dinâmica.

Outro aspecto é a política externa agressiva.

O Ocidente percebeu que a China não é um parceiro fiável. Como tem tendências imperialistas não só relativamente a Taiwan mas também no mar do sul da China e nos Himalaias (e até reclama uma ilha conquistada pela URSS em 1920), como tem procurado aumentar muito as suas capacidades militares, a dedução lógica é que haverá um momento não muito distante em que a China vai lançar-se em aventuras do tipo da que a Rússia está metida na Ucrânia. Seguir-se-ão sanções, bloqueios económicos, etc. Por isso, as empresas ocidentais já estão a tentar desacoplar o mais possível da economia chinesa.

O ataque ideológico feito pelo Xi Jinping às empresas chinesas com maior sucesso e o controle que querem ter sobre as empresas estrangeiras que queiram abrir uma fábrica ou um negócio, inibe o investimento externo e acelera a fuga das empresas para locais mais seguros.

As exportações chinesas estão a cair há meses.

Enfim, podiam-se dar mais exemplos que explicam bem a forte travagem da economia que a China sente neste momento. Com a liderança que tem, não é provável que mude de rumo. E quando o mal estar interno já for demasiado grande (a taxa de desemprego jovem na China é muito elevada) o ditador procurará um inimigo externo para distrair a população, como é habitual os ditadores fazerem.