O governo americano aproxima-se perigosamente de passar o seu “teto de dívida” para este ano. Devido a haver mais despesas do que receita, o governo precisa da autorização do Congresso para pedir dinheiro emprestado (resultante de aplicações financeiras internas ou nos mercados internacionais) e assim conseguir pagar os compromissos financeiros e manter o seu índice económico como uma mais-valia. A Casa dos Representantes, agora sob controlo do Partido Republicano e do novo Speaker, Kevin McCarthy, já disseram que não passarão um novo teto. No entanto, fizeram o contrário, sem qualquer problema, três vezes durante a Administração Trump. Porém, quando um Democrata está na Casa Branca, “contenção orçamental” passa a ser a prioridade das prioridades para os conservadores. Negligenciável para a fação MAGA na câmara baixa é o facto de que tal decisão irá colapsar a economia mundial, lançar os mercados internacionais para perdas vertiginosas devido à ideia de que os Estados Unidos da América não pagaram as suas dívidas. Repita-se, as dívidas que também os Republicanos criaram durante o tempo em que Trump foi presidente. Usar o teto como um “refém” a ser negociado para “equilibrar o orçamento” é pura demagogia para enganar os eleitores.

No caso de não ser autorizado o aumento do teto da dívida, ou de não haver um decreto presidencial com uma decisão unilateral por parte do Presidente Biden que tal é não constitucional (devido à 14ª Emenda da Constituição), os Estados Unidos entram em recessão, com uma queda do PIB que pode chegar aos 4%. Seis milhões de americanos perderiam o emprego, catapultando a taxa de desemprego de mínimos históricos para um valor próximo dos 9%. Instabilidade nos mercados poderá resultar na perda de 15 biliões de dólares de riqueza. A curto prazo, as taxas de juros irão subir reduzindo o valor do dólar em relação a outras moedas mundiais e revertendo a descida que se tem observado na inflação resultante da pandemia.  A desvalorização do dólar faz com que seja mais caro para as empresas americanas negociar com empresas estrangeiras, resultando na queda das trocas comerciais. Investidores que apostam em títulos do tesouro americanos e em juros da dívida não irão adquirir tais ativos ou emprestar dinheiro ao governo dos Estados Unidos.

Este cenário de crise financeira global, a acontecer, fará com que a crise de 2007/08 pareça uma “brincadeira de crianças”. Inclusive, pode haver a necessidade de trocas de divisas como moeda de referência, o que causaria flutuações imprevisíveis nas taxas de câmbio e tornaria o comércio global caótico. O preço do petróleo e de outros bens terão flutuações dramáticas. Os países procurarão reduzir a sua dependência dos EUA, com a criação de novos blocos comerciais que se tornariam mais isolados uns dos outros à medida que a economia global fica mais fragmentada.

Nada disto parece incomodar, ou preocupar a fação MAGA da Casa dos Representantes do Congresso dos Estados Unidos, suportados por aquele que parece ser o de facto líder do partido, Trump. Pelo contrário observa-se uma forma de fazer política niilista e aceleracionista, onde Congressistas Republicanos parecem confortáveis com a ideia de destruir sistemas de governação liberais, em prol de uma mudança radical de gestão da sociedade americana: isolacionista e fundamentalista. Como referido acima, o Presidente Biden tem soluções para evitar que a maioria na câmara baixa lance a América do Norte para o abismo. Para já, e esperamos que assim continue, a Administração Biden diz que não irá negociar com extremistas. E há a possibilidade do decreto presidencial relativo à obrigação que os Estados Unidos têm de pagar as despesas já ocorridas, mas que, inevitavelmente, passará por um crivo judicial que irá ao até ao Supremo Tribunal.

Perante tal cenário de colapso económico e financeiro global, onde se encontra a Comissão Europeia? O Conselho Europeu? O Banco Central Europeu? Onde estão os avisos aos líderes Republicanos de que é a economia mundial que está em jogo com a cegueira e fanatismo dos Representantes? Onde estão os avisos de que as parceiras políticas e económicas serão reavaliadas se tal irresponsabilidade for levada até ao fim? Onde estão as forças transatlânticas a entrar em ação, que não as conversas de bastidores ou telefonemas não formais? Onde está uma “posição de força” pela União Europeia a avisar que tal irresponsabilidade terá repercussões a curto e a longo prazo? Neste momento, quando caminhamos para um precipício, todas as forças em sentido contrário são necessárias.

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