Fiz, há poucos dias, 22 anos e, contra a minha vontade intrínseca, lá me partiram um bolinho e me cantaram os parabéns. Digo-o contra a minha vontade, porque sempre odiei fazer anos, e, por isso, existirão sempre duas coisas que nunca conseguirei perceber: como é que alguém votou no Sócrates para Primeiro-Ministro e pessoas excitadas quando fazem anos. As duas têm talvez a mesma razão de fundo: um desequilíbrio do foro psicológico. 

Nada em fazer anos me alicia (exceto os MB Way´s marotos): estar mais perto da morte, ter que fazer fretes e atender chamadas descabidas, responder a mensagens demasiado emocionais para o dia em questão, fingir que estou a adorar quando me cantam aquela música incrível quando no fundo só me apetecer apagar as velas na nuca de alguém.

No entanto, há que admitir que com a idade vem sabedoria e conhecimento. Daí que me apercebi que, à medida que os anos se vão acumulando, a palavra “parabéns” vem sendo cada vez menos utilizada. Na idade adulta só mesmo em quatro situações: dia de anos, quando se arranja emprego, quando se fica noivo e quando se anuncia que se vai ter um filho. Mais que isso é pedir demais.

Para além desta perceção o decurso do tempo teve também outro (e)feito. Quando éramos crianças o mínimo acontecimento, por mais pífio que fosse, era motivo de festa. Um simples “família nem imaginam, o Carlinhos já come sopa!!!” bastava para pôr as tias malucas e a comprar pratos e talheres de uma qualquer série da Disney (alguém que lhes explique que só um elefante é que não sabe comer gaspacho). Começar a gatinhar e, mais tarde, a andar, era logo pretexto para abraços, beijinhos e para a mãe começar a chorar. Passar o segundo ano por saber fazer contas de somar e dividir dava acesso garantido à Toys “R” us para escolher um presente. Hoje em dia passar de ano na faculdade dá direito a um “não fazes mais do que a tua obrigação” por parte dos familiares e amigos. Ainda mais insuportável são as mães e pais que, quando se lhes pergunta qual a idade do pequeno rebento respondem “faz hoje 13 meses e 14 dias! Vamos ter um jantar lá em casa”. Carla, diz só que tem um ano se faz favor. Em miúdo fui aliciado com mil e um aplausos por tudo e por nada, deixando-me a antever que, na vida, ao mais pequeno passo seria regado com tamanha alegria. Mas, a verdade é que, para nosso bem, as coisas não se passam assim. Acabar o curso é o mínimo, arranjar um emprego é do mais normal que há, comer sólidos não é um feito, mas uma necessidade fisiológica para evitar um desmaio que leve a minha boca ao passeio. 

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Portanto, aquilo que pretendo dizer é que há aqui um problema relativo à disparidade de comportamentos e às consequências que cada um deles traz. Para o resolver só vejo duas opções. Ou transportamos o excitamento de 5º grau para a vida adulta e, deste modo, quando um amigo meu for despedido junto-me com os restantes e fazemos uma welcoming party ao centro desemprego dizendo que está tudo bem e enunciando as inúmeras vantagens de se estar desempregado: férias infinitas, não ter que se levantar cedo, não ter qualquer tipo de responsabilidade, etc. Ou então, quando somos crianças, o entusiasmo excessivo dos nossos ascendentes começar a ser regrado, deixando de se acender uma vela por cada espirro que damos, e começando a ensinar-nos que nem tudo o que fazemos é bom, perfeito e ideal e que na vida os contratempos são, como diz a palavra, uma questão de tempo.

Não me entendam mal, não estou a defender uma falta de afetos obviamente. Estou sim a defender que nos ensinem que mais tarde ou mais cedo, as dificuldades vão aparecer. Que o emprego nem sempre pode correr de forma perfeita. Que com a família as coisas não vão ser constantemente cor-de-rosa. Que, se calhar, não vamos ser os melhores do mundo em tudo o que fazemos. Ensinem-nos a tentar ser sempre melhores, connosco e com os outros, e a levantar a cada queda, isso sim. A nossa capacidade para lhes fazer frente será tão maior quanto melhor a carapaça e resistência que fomos construindo, à nossa custa e à custa dos ensinamentos de tantos outros ao longo dos anos. 

Agora caberá a cada um de vocês fazer a vossa escolha: ou uma criança estruturada ou um adulto deslumbrado. Em qualquer uma delas a culpa será sempre dos aplausos. A diferença está em saber guardá-los.