Em política, a reverência que é dada (e devida) ao sistema democrático (um sistema onde prevalece a vontade da maioria) pode conduzir a grave equívoco: que a opinião popular, entendida como a opinião da maioria, equivale à verdade. Esta ideia integra a falácia ad populum, que assume, erradamente, que apenas pelo facto de a maioria acreditar que alguma coisa é verdadeira, então tem que ser, necessariamente, verdadeira. No entanto, dizia-o o Cardeal Ratzinger, e bem, “a verdade não pode ser criada pelo resultado de votações”, o que significa que uma decisão tomada por maioria de opinião, seja ela unânime ou generalizada, pode, ainda assim, ser errada ou precipitada.
De facto, a política é pródiga em muitos casos nos quais foram tomadas decisões que receberam um amplo apoio popular e que tinham muitas falhas e defeitos e, ainda assim, esta tendência aumenta, sufocando os tão necessários diálogos, debates e pensamento racional e crítico sobre o mundo. E tudo isto agrava considerando que, dado o atual clima político movido pelas redes sociais e pela rápida disseminação de informação, é possível convencer e manipular a opinião pública, criando um falso consenso e pressionando o poder político a agir segundo a desinformada vontade popular. Neste sentido, a rápida disseminação de tais informações leva a decisões políticas que são mais reativas que refletidas, dado que são guiadas pela necessidade patológica de agradar ao eleitorado em vez serem justificadas por um raciocínio sólido e ponderado. E esta dinâmica, uma vez mais, é uma manifestação moderna da falácia ad populum, na qual a popularidade de uma ideia é tomada como verdade.
O mais grave é que, muitas vezes, a unanimidade e o consenso políticos podem resultar num menor escrutínio, falhando no infalível teste do tempo, que sempre revela o que estava certo e o que estava errado. Enaltecemos assim a necessidade de um ambiente político que valorize mais o debate rigoroso e análise crítica e profunda dos temas em discussão ao invés da mera popularidade. Isto significa que o ambiente político deve efetivamente perseguir a verdade e não apenas agradar ao eleitorado, reconhecendo que o voto não valida necessariamente uma política ou uma crença.
Portanto, apesar de reconhecermos que os processos democráticos são essenciais e imprescindíveis para o governo das sociedades contemporâneas, temos que reconhecer igualmente que a democracia não é perfeita e que o número de votos não é um indicador de verdade. As decisões políticas devem, assim, estar baseadas numa reflexão profunda, numa análise rigorosa dos dados disponíveis, tentando afastar qualquer viés ideológico causado por uma qualquer cegueira partidária. A opinião da maioria, embora relevante, não pode ser determinante em matéria de políticas públicas, que devem orientar-se pela verdade fundada em evidências concretas, de forma que se possam tomar decisões que são justas e sensatas. Reconhecer tudo isto que enunciámos é evitar cometer a falácia ad populum e é um passo fundamental em direção à verdade que desejamos se queremos que a esperança que a democracia alimenta no espírito dos cidadãos seja verdadeira e não baseada em falsas ilusões.