“Quem corre por gosto não cansa”, todos sabemos. Vem isto a propósito de S. Francisco de Assis grande inspiração deste Papa, cuja Memória se celebrou há duas semanas. Naquele dia no Mercado, o filho do rico comerciante não correu sem norte atrás do mendigo, a quem deu tudo o que tinha. Identifico-me nesse gesto. E regozijo-me que haja um santo apressado, e mais, todos o são, a começar por Maria de Nazaré, que correu apressadamente a visitar a prima, mal soube pelo anjo que lhe apareceu que Isabel se encontrava já em fase adiantada de gestação. Afinal as minhas pressas são boas.

Importa por isso distinguir entre pressa e velocidade. E disto trato aqui hoje, não deixando de passar por um livro sobre a ciência, há pouco traduzido entre nós, que nos diz que  Deus existe – isto apesar de há 4 décadas atrás a ideia de que universo era eterno ainda era a moeda corrente.

O Big Bang aconteceu, e isso obriga a uma revolução no pensar, obriga a pensar que o universo foi criado, e que portanto é a própria razão a “exigir” a fé; ou dito de outra forma, “a fé é um acto da razão”, é a abertura a uma dimensão que a transcende.

Mas comecemos pela pressa de Francisco. Não correu atrás do pobre homem agitado por um qualquer ímpeto de valentia, mas correu por uma atração, idêntica à do íman que a si chama o metal.

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Especulação arredada do meu dia a dia, do nosso dia a dia, esta semana tão focada no Orçamento 2025, mais o pano de fundo das guerras que se arrastam há anos e fazem parte da moldurada do nosso quotidiano?  Não, de modo nenhum.  O Poverello é de uma clamorosa  atualidade. Basta ver como se comportam os media, nas pressas e velocidades de serem os primeiros a bombar…

Nos dias que correm não nos sobram acelerações, démarches em vão, faltas de foco – às vezes focos a mais – ausência de propósito, abdicação de  metas que o sejam de vida – numa rendição a metas outras.  Dizem-me que a vida não está para grandes voos ou utopias. Que especulações é coisa de ricos, de quem não tem que suar para comer chegando exausto ao fim do dia.

S. Francisco e os outros como ele são ao fim e ao cabo uns tipos “desequilibrados”. O que importa é ser terra a terra, muitas vezes num frenesim como o zumbido das moscas, uma agitação irracional, uma pressão que nos empurra para trás ou para a frente, a fazer, a ir, a acelerar. Andamos convencidos da mentira que o progresso avança, e que nós para ele temos que contribuir.

Corremos em ritmo acelerado, por puro instinto, ansiosos, sem nos darmos conta que vamos caindo num buraco escuro da angústia de quem não tem objetivo à nossa altura. Já não  queremos nada, apenas a velocidade, do avião ao telemóvel, da app que me traz o jantar em minutos, ou  da que me trás o livro sul-coreano para o pequeno almoço.

E a paz?  A tranquilidade na ordem, em todas as coisas, como a definia S. Agostinho? Qual quê! A paz é a minha zona de conforto. E se me falta temos os sedativos, cujo consumo aumenta a passos largos.

E há as técnicas das meditações, que muitos pensam que são orientais, e esquecem que elas são é humanas e que sempre existiram, e foram uma das mais valias da cultura europeia, hoje vendida ao dólar esquecida do Tesouro que só três magos, apressadamente vindos do Oriente, souberam adorar. Mas o marketing impera, e o digital, ainda mais veloz, dá-nos na hora, e de bandeja, o well being que desejarmos. Uma espécie de “morra agora e pague depois”.

Francisco não inventou uma ordem, ele simplesmente foi transformado por um Amor excepcional, que fundou e funda a Igreja. Seja no mercado de Assis ou aqui onde me encontro, algo se mostra em ação que não é o impulso centrífugo de fuga, mas o vigor centrípeto de uma Presença. Que me define e me permite mil recomeços dentro do cansaço que fragiliza o meu ritmo terreno.

Leonardo Coimbra definiu a visão franciscana da vida como uma visão ginástica, isto é, que vê as coisas “invertidas”, na sua dependência do Criador que tudo sustenta em cada instante – na continuação do acto inicial, criador, que tudo fez começar do nada.

Francisco tinha pressa porque queria dar a todos os homens um tesouro muito maior do que imaginavam nos seus melhores sonhos. E nesse movimento ensina-me o valor da minha razão, que não se contenta com metas efémeras mas tem um seta que a vira para o alvo dos alvos, a transcendência mais transcendente de todas as transcendências. Como disse Einstein, não é cientista quem não admite o mistério, isto é, algo que está sempre além do que se vai atingindo em cada etapa.  A razão à medida que avança embate numa barreira elástica…