No passado dia 22 de junho, o blog VozProf promoveu online um debate intitulado “A decência para a monodocência”.

Numa altura em que a falta de professores é sentida cada vez mais, nomeadamente pelo facto de começar a ser difícil encontrarmos alguém que não sofra com essa carência, seja direta ou indiretamente, muito nos espanta que este assunto não seja abordado corajosa e frontalmente pelo Ministério da Educação.

O primeiro-ministro em funções fez história política quando num debate na Assembleia da República evocou a discriminação laboral dos professores em monodocência como sendo uma enorme injustiça social. Estávamos em Junho de 2017. Depois da revogação do Decreto-Lei que previa um regime especial de aposentação, que conferia aos professores em monodocência (Educadores de Infância e Professores do 1.º ciclo) algum equilíbrio legislativo em relação aos seus colegas do 2º e 3º ciclos e secundário, estes ficaram numa situação de desvantagem.

Na época, quando questionado sobre as reformas antecipadas para este grupo específico de professores, António Costa respondeu que “…relativamente à idade de reforma, como sabe, aquilo que é entendimento pacífico é que não deve haver alterações nessa idade, deve haver sim, uma alteração e criar condições, para que possa haver um conteúdo funcional distinto, em particular, relativamente àquelas situações onde há efectivamente discriminação, que tem a ver com situações de monodocência que não beneficiam de redução de horário.”

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Repetiu a façanha em 2019, em plena campanha eleitoral, é certo. Nesse ano, António Costa voltou a falar do mesmo numa entrevista ao Expresso. Referiu que queria falar de “fatores fundamentais que são habitualmente pouco falados”, abordando a questão das “monodocências”: “Os educadores do primeiro ciclo não beneficiam das reduções de horários nem da carga de trabalho de que os outros professores beneficiam ao longo da vida”. Considerou que “seria altura para nos dedicarmos mais a temas que têm a ver com a vida dos professores, melhorando a qualidade do ensino…”

Teremos sido todos ingénuos?

Na realidade, a pessoa que proferiu estas frases foi também a que não considerou o tempo de serviço prestado, alegando que ou havia dinheiro para o IP3 ou para os professores.

Para perceber do que se está a falar quando identificamos uma discriminação laboral dos professores em monodocência, aconselho a visualizar o debate que foi muito esclarecedor. Adiante.

Perdidas as esperanças depositadas em António Costa e no seu governo, sustentadas nestas afirmações, houve uma necessidade de recorrer aos sindicatos. Foi isso que fizeram as autoras do Movimento de Professores em Monodocência (MPM), entraram em contacto com vários sindicatos para saber qual a sensibilidade de cada um deles para esta questão, assim como o modo como poderiam ajudar a resolvê-la.

É factual que os professores monodocentes trabalham semanalmente mais 6h 40m que os colegas do 2.º, 3.º e secundário, o que significa no final da carreira contributiva mais de 18 anos de serviço. E não está contabilizado o calendário escolar que, começa a ser norma, é mais alargado para estes dois níveis de ensino, pré-escola e primeiro ciclo.

Ainda assim, para espanto de todos nós, monodocentes, as respostas dos sindicatos foram de uma argumentação pejada de preconceitos e argumentos falaciosos. Só a título de exemplo, na síntese de uma reunião tida com o SPRC a 9 de Junho, pode-se ler na página do MPM o seguinte: “No seu entendimento, se é difícil a negociação para todos os docentes, mais difícil a mesma se tornará em relação a grupos específicos de docentes e portanto, não faz qualquer sentido que grupos de docentes apresentem exigências particulares”.

Ou seja, mesmo perante um facto reconhecido preferem alegar que cria divisões. Para a maioria dos sindicatos que responderam, fazer-se justiça é criar divisões!

Para não faltar à verdade, devo informar que o único sindicato que se sensibilizou com esta questão, e portanto se mostrou disponível para ajudar a resolvê-la, foi o sindicato S.TO.P., tendo inclusive participado no debate.

Tudo o que foi descrito é factual e finalmente começa a ser entendido como sendo uma realidade que terá de ser revista. Não bastam as boas intenções, há que agir em coerência entre aquilo que se diz e aquilo que se faz.

Usaremos todas as ferramentas legais à nossa disposição para tentar resolver este problema que afeta milhares de professores.

Querem mais professores? Tratem bem os que cá estão!