Os seres humanos, incluindo os membros do governo, ao contrário de gatos1 e PANnes2, podem agir racionalmente3, ponderando as possíveis consequências das suas ações e superando os seus instintos4 primários. Deste poder5, ou capacidade, nasce aquilo a que se chama liberdade humana, uma condição muito diferente da liberdade de um animal no seu habitat natural.

Mas a racionalidade não dá origem apenas à liberdade, mas também à responsabilidade. A responsabilidade surge quando temos a capacidade de escolher fazer ou não fazer, fazer bem ou fazer mal. É a irmã gémea da liberdade. Nenhum gato é responsabilizado pela morte de um rato, porque é considerado que não consegue dominar o seu instinto matador. Já um homem arrisca-se ser julgado e condenado a pagar uma indemnização por matar o rato de estimação da vizinha.

Mas não deverá então um ministro6, ou coletivo de ministros, ser responsabilizado pelos ratos que mata, seja o equilíbrio orçamental, o sns, ou a escola pública, e pelos outros danos que causa à sociedade? Parece que só se dirá que não se for demonstrado que, quando uma pessoa é rebaixada à condição ministerial, perde a sua racionalidade e, portanto, a sua liberdade & responsabilidade.

Por exemplo: foi anunciada a abolição dos vistos gold devido aos seus supostos efeitos deletérios no mercado da habitação no Chiado. Terá sido esta abolição um ato reflexo7 & sem reflexão do nosso governo, como o de um gato a saltar sobre um rato? Se sim, ele não seria responsável por nenhuma das sequelas desta instintiva & não ponderada medida.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Se não, se o nosso querido governo tiver examinado, segundo os seus gostos & capacidades, ou mesmo se tiver conscientemente decidido ignorar todas a previsíveis consequências da referida abolição, as alegadamente positivas no mercado imobiliário à volta do S. Luís, e as comprovadamente negativas em muitos outros, e tiver concluído que os prós superam os contras, então a responsabilidade pelo impacto desta medida nos vários setores de atividade será dele. A dos impactos positivos, e a dos negativos.

Um destes últimos poderá ser a falência de um setor fundamental para a nossa economia. É conhecido o prestígio para o nosso país de ter cerca de três dezenas de restaurantes com estrela Michelin. E não só prestígio, mas também as outras vantagens associadas a este prestígio, como a atração de turismo de qualidade, criação de emprego bem remunerado, e externalidades positivas em várias indústrias adjacentes à da hospitalidade. Atendendo que uma proporção não despicienda das receitas destes restaurantes provem de clientes com visto gold, a eliminação destes vistos poderá levar esses comedouros à falência, com todo o impacto negativo que isso terá no ecossistema turístico.

É o que se chama um ato voluntário indireto. As ações humanas, além do efeito que de modo direto se procura com elas, têm outros efeitos, que não se pretendem, mas apenas se toleram ou voluntariamente se ignoram, por virem unidas àquele que é pretendido. Mas também por estes efeitos não pretendidos se é diretamente responsável.

Assim, a responsabilidade pela previsível falência dos nossos restaurantes Michelin será dos srs. ministros que tomaram a decisão de acabar com os vistos gold. A não ser que, para evitar essa catástrofe, o governo decida redobrar a frequência com que os membros dos órgãos de soberania petiscam nestes restaurantes. Mas uma consequência voluntária indireta desta medida, será um impacto negativo nas contas públicas. O que se pode remediar aumentando os impostos, com a consequência voluntaria (in)direta de fazer com que ainda mais portugueses não tenham com que comer… e assim por diante.

Embora sem pretender reduzir a responsabilidade dos srs. ministros pelas consequências das suas decisões, pode-se ainda notar que a responsabilidade por se ter este governo que abole vistos gold pertence aos srs. eleitores que nele votaram. Dito de outro modo, os srs. eleitores tiveram, supostamente, a liberdade de escolher este governo. Mas associada a essa liberdade está a responsabilidade seja pela falência dos restaurantes Michelin, seja pelo aumento da dívida pública, seja pelo aumento de impostos, seja pela fome que tantos portugueses passam. Será que isso não lhes pesa na consciência? Ou será que não votaram livremente?

Us avtores não segvem a graphya du nouo AcoRdo Ørtvgráphyco. Nein a do antygo. Segvem a do futuru, escreuendu coumu qverem & lhes apetece. #EncuantoNusDeixam

  1. Gato: autómato biológico, flexível & indestrutível, provido pela natureza como descompressor de tensões domésticas, seja através de carícias, ou de pauladas.
  2. PANnes (do fr. panne): pessoa avariada—em que a avaria se encontra, tipicamente, no mecanismo de direção central; militante de partido político que não consegue distinguir as características acidentais das essenciais nos membros do reino animal
  3. Racional: livre de ilusões e enganos, exceto das inerentes à observação e raciocínio.
  4. Instinto: racionalidade animal; impulso que liberta da responsabilidade.
  5. Poder: ter a opção, não a obrigação, de atuar de certo modo, como por exemplo a que os portugueses têm de votar ps de modo a garantir a glória de ser o povo mais miseravelmente pobre da EU; condição natural da autoridade pública que lhe possibilita a prossecução dos seus mesquinhos interesses particulares.
  6. Ministro:malfeitor; feitor de uma organização política numa quinta ou quintinha; peça instrumental no enriquecimento de familiares & amigos; feitor de uma autoridade superior com responsabilidade inferior e nomeado pelas suas qualificações, a principal das quais é um grau plausível de inveracidade; título honorífico atribuído a membro de quadrilha quando esta sucede no seu assalto ao estado; peça no tabuleiro político, correspondente ao cavalo no xadrez, que pode avançar, recuar ou mover-se lateralmente, mas sempre em movimentos não retilíneos.
  7. Ato reflexo: reação inata, imediata e involuntária que ocorre na presença de certos estímulos, como quando o sr. prof. Marcelo vê um microfone, ou um gato um rato; segundo o materialismo dialético todos os atos humanos são atos reflexos inatos aos membros de cada classe social, o que explica a escolha automática do privado pelos membros do nosso governo quando têm a possibilidade de usar o sns ou as escolas públicas; elemento constitutivo do livre arbítrio que sustenta as refletidas posições políticas da iliberal, principalmente quando se põe de cocaras na presença do ps/d.