Tememos mais o desconhecido do que o conhecido – quando pensamos no desconhecido, ficamos ansiosos, imaginamos mil contextos desfavoráveis e não conseguimos desligar o botão da preocupação. E faz sentido que assim seja. É essa a natureza humana. O conhecido, mesmo que não seja o nosso suporte mais confortável, é sempre um suporte e nenhum de nós abdica dele, pois todos nós gostamos de estar apoiados em realidades que nos deem algum tipo de estabilidade (mesmo que essa exista apenas na nossa cabeça).
Temos mais «medo» do professor ‘malvado’ e ‘cruel’ que, pela primeira vez, nos vai dar aulas do que do professor que já nos deu aulas. Quem não tem medo agora, já teve, no passado. Dos professores ‘malvados’ e ‘cruéis’ nunca nos vamos esquecer, porque eles irão para sempre perseguir-nos, de livro na mão, pelos corredores da escola da nossa mente.
Quando nos deparamos com um novo contexto, revelamos um quadro de ansiedade face a esse estado de coisas e é aí que o medo surge – normalmente sem aviso. Todas as vezes em que mudamos ou de função, ou de trabalho, ou de casa, ou de cidade, ou de país – ou de professor… – sentimos uma sensação de desconforto na espinha porque, de repente, tudo mudou e deixámos de ter como nos apoiar em tudo aquilo que, anteriormente, dávamos como garantido.
A mudança é mais intensa, porém, quando é provocada por razões exteriores à nossa vontade. Normalmente, o mundo muda e a nossa posição não é considerada. O mundo mudou e nós não demos por isso – demos tarde, na verdade.
Desconfiámos, ao longe, de uma possível mudança, mas, como dificilmente a víamos, achámos sempre que ela não viria ao nosso encontro. (Realmente, ela estava muito lá ao longe.) Em dezembro, estava na China e, nos meses seguintes, foi-se aproximando. E a cada passo que ia dando, o mundo mudou um bocadinho. A mudança continua a dar os seus passos e o mundo continua a mudar. A mudança ainda não deu todos os passos que pode dar e já chegou a todos os pontos do mundo.
E, de repente, a China e a sua Grande Muralha estão ao nosso lado.
Hoje, temos mais medo do mundo do que tínhamos há um mês. Temos receio do mundo. Neste momento, os nossos pés não têm como conhecer o solo que pisam, nem os nossos olhos têm como compreender o que veem: as corridas aos supermercados por estes dias; os noticiários televisivos, os jornais de papel e as redes sociais; as decisões desesperadas dos governos dos países.
A mudança está a ser intensa e rápida e, entre pessoas que dizem ‘não há razões para alarmismos’ e pessoas que dizem ‘há razões para alarmismos’, contamos países suspensos, serviços cancelados, aviões em terra, barcos presos no mar, pessoas com medo de outras pessoas e pessoas com medo de si próprias (e que por isso receiam as outras pessoas).
E, ao fim do dia, continuamos a não perceber o porquê de tudo isto e nem por isso podemos levar aos mãos à cabeça.