O chumbo do orçamento e a consequente dissolução da Assembleia da República, devem ser encarados não como um revés, mas como uma oportunidade. A oportunidade de inverter um ciclo governativo marcado pela estagnação social e económica, e de manifesta crispação política entre a esquerda radical e os restantes partidos representados no parlamento.
Convenhamos que a hipótese que nos foi colocada em cima da mesa consistia em fazer aprovar, à 25ª hora, um péssimo orçamento: um orçamento que persistiria na lógica de redistribuir aquilo que o país não produz e que perpetuaria a subjugação da classe média e das empresas a uma pesadíssima carga fiscal. Face a este quadro é, sem dúvida, preferível devolver a palavra aos portugueses, permitindo um reequilíbrio de forças no Parlamento que legitime a aprovação de um novo orçamento de Estado e que impulsione uma nova visão de organização da sociedade portuguesa.
O País precisa de estabilidade e de previsibilidade no que concerne à definição e aplicação das políticas públicas. Mas o país precisa, mais ainda, de virar a página e de se libertar da atual visão de sociedade projetada pela maioria de esquerda que vem suportando o Governo. Uma visão do mundo que assenta sobretudo na estatização da economia e da vida quotidiana. Uma construção de sociedade que não quer discutir o necessário aumento da produtividade, para que seja possivel pagar melhores salários. Uma visão que rejeita a geração de riqueza impulsionada pelo sector empresarial privado e/ou em regime de parceria com o sector público. Só com empresas mais competitivas e trabalhadores mais qualificados será possivel a Portugal competir no quadro internacional do crescimento económico, e progredir nos rankings internacionais que medem os niveis de qualidade de vida e bem-estar da população.
O PSD, o único partido capaz de gerar uma solução de governo alternativa, deve, assim, encarar as próximas eleições legislativas como a derradeira oportunidade para reafirmar junto dos eleitores de que é possivel construir um modelo de sociedade diferente, assente no mérito, na qualificação e capacitação profissionais e no progresso social e económico. Tem de ser também capaz de se diferenciar da solução que governou durante os últimos 6 anos, demonstrando que não estamos destinados a viver numa espécie de mediocridade aspiracional, onde o elevador social não funciona e a economia vive assente em baixos salários. E esta lógica disruptiva aplicar-se-á quer ao modelo económico, quer também ao domínio da saúde, da educação e do sistema de justiça.
Os portugueses precisam de sentir que há uma alternativa política ao modelo existente; que é possível introduzir uma visão que se preocupe com a captação de investimento estrangeiro, de empresas que tragam trabalho de alto valor acrescentado, que promova o incremento dos salários através do aumento da produtividade, da motivação e estimulo dos trabalhadores e que promova a inovação na gestão das empresas. Uma visão que renuncie a aumentar sucessivamente os salários por via administrativa, indexando esse incremento a factores como a avaliação de desempenho, o aumento da produtividade individual e colectiva e que promova o mérito nas organizações, sejam públicas ou privadas.
Neste exercício, o PSD não se pode deixar condicionar pela narrativa dos dois partidos minoritários que sustentaram politicamente a geringonça até ao chumbo do orçamento. Atente-se, a este propósito, nas sucessivas intervenções públicas de Catarina Martins e de Jerónimo de Sousa colocando em causa a legitimidade do Partido Socialista para almejar alcançar a maioria absoluta, ou do centro-direita reunir condições para formar governo. Para o BE e para o PCP a legitimidade democrática dos outros partidos está como que condicionada à sua pré aprovação, num raciocínio que esquece por completo a própria representatividade e a ínfima importância eleitoral que os portugueses lhes conferem.
O PSD deverá, pois, centrar-se em apresentar uma alternativa política de forma clara, tornando-a discernível e inteligível a todos, por contraponto com a atual visão empobrecida da sociedade e do mundo.
É preciso uma voz que alimente a esperança e que demonstre aos portugueses que fruto do seu trabalho e do seu esforço é possível singrar, crescer, evoluir pessoal e profissionalmente. Viver numa sociedade de serviços mínimos, capturada por pequenos interesses corporativos, não é uma inevitabilidade.