Alemães, polacos, franceses, italianos e agora também belgas, gregos, romenos e espanhóis: estes são alguns dos agricultores europeus que se mantêm firmes e unidos em protestos massivos contra os cortes nos subsídios em apoios à agricultura e num movimento mais geral contra as políticas “verdes” da União Europeia.
Em França, os agricultores, que pretendiam colocar Paris “sob cerco” e bloquear o mercado internacional de Rungis (que alimenta toda a Ile-de-France), mantêm barreiras nos eixos estratégicos que conduzem à capital. Em Espanha, os agricultores anunciam uma mobilização nacional para as próximas semanas, em nome de uma “mudança nas políticas agrícolas europeias”. Na Alemanha, depois de quase um mês de protestos, que se transformaram em manifestações anti-governo, os agricultores mantêm bloqueados os principais eixos rodoviários, estradas de acesso a portos e a pontes. E em Portugal?
Sabe-se agora que os protestos também estão a aumentar aqui. Na verdade, ainda ontem centenas de agricultores portugueses bloquearam estradas e fecharam fronteiras. Os protestos, no entanto, não pararam por aí: espalham-se rapidamente pelo resto do país, de Bragança a Coimbra, de Santarém a Portalegre e Beja.
O “inimigo” comum entre os agricultores é certamente a Política Agrícola da União Europeia (PAC). Mas não só. O descontentamento generalizado e profundo prende-se, também, com as políticas absurdas da UE em nome do “Acordo Verde”.
Políticas, refira-se, que estigmatizam a demonização da agricultura intensiva, dado que difundem a ideia de que apenas a agricultura “natural” é a única verdadeiramente sustentável a nível ambiental. Políticas que visam “renaturalizar” vastos territórios onde a actividade agrícola ocorre há milhares de anos, sem que alguém se pergunte no que poderia resultar em termos de defesa contra inundações ou em termos de defesa da actividade agrícola contra espécies selvagens invasoras. Políticas que priorizam a entrada no mercado de produtos de melhoramento genético (OMG/NBT), cuja recusa preconcebida coloca os agricultores europeus em condições de inferioridade quantitativa-qualitativa em relação aos concorrentes de outras áreas agrícolas do mundo.
Em rigor, tanto a PAC como o Acordo Verde parecem orientados para um dirigismo rígido que se traduz numa espécie de “kolkhosização” sub-reptícia da agricultura europeia, através da qual uma “classe dominante” desligada da realidade, mas firmemente estabelecida em Bruxelas, gostaria de impor aos agricultores europeus um sistema de bem-estar social sufocante, feito de subsídios semelhantes a esmolas, face a regras operacionais impraticáveis e absurdas a serem aplicadas “no campo”.
Recorde-se que, para afeitos de apoio da UE, os agricultores estão sujeitos ao princípio da condicionalidade, o que significa que estão obrigados a cumprir um conjunto de normas benéficas (denominado Caec) para o ambiente e o clima. Este princípio da condicionalidade aplica-se a quase 90% da superfície agrícola utilizada na UE. Uma autêntica declaração de guerra à agricultura europeia, cujo objectivo principal é o de limitar a produção de alguns produtos. Em alguns casos, eliminá-la completamente, como demonstra o programa de retirada da produção de terras aráveis.
Ou seja, o que a UE tem vindo a dizer aos agricultores europeus é que o seu trabalho faz mal ao ambiente e ao clima. Uma deriva ideológica que parte da ideia neomalthusiana de que o homem é o inimigo do planeta.
E uma contradição: os produtos agrícolas terão de ser comprados em algum lugar, por isso não está claro a quem podem servir estas políticas ambientais, que põem em perigo a sobrevivência da agricultura. A isto devemos acrescentar que se se deixar de cultivar na UE, os produtos terão de ser importados sabe-se lá de onde e em que condições; portanto, a poluição que se espera reduzir de um lado, acaba por ser aumentada do outro.
Face ao exposto, é absolutamente surreal que, face às legítimas reivindicações dos agricultores, a UE, ao invés de optar pelo diálogo, tenha decidido erguer um “muro” de arame farpado, por medo da revolta dos próprios agricultores.