O desígnio de Portugal não pode ser o de um paraíso fiscal de doce clima para os reformados do centro e Norte da Europa; não pode ser o de um eterno recebedor dos dinheiros dos fundos de coesão da União Europeia. Portugal é um país de quase nove séculos de história que deixou uma marca civilizacional pelas cinco partidas do Mundo, em particular nos trópicos, onde há 250 milhões de pessoas a falar a língua de Camões. Mesmo que não haja mais império, Portugal é, pela história, pela cultura e língua, muito mais do que dez milhões de pessoas num rectângulo de 90 mil quilómetros quadrados na periferia europeia. O desígnio de Portugal tem de ser consentâneo com o melhor da sua história, nomeadamente na sua vocação universalista de encontro e fertilização de povos e culturas.

O século XX português foi o século da escolarização nacional. Em 1900 cerca de 90% da população era analfabeta e chegámos ao século XXI com um sistema de ensino básico universal e uma rede de ensino superior notável. Universidades e politécnicos estão espalhados por todo o território e constituem factor crucial de coesão interna. Agora é a hora de contribuirmos massivamente para a educação dos povos de língua portuguesa. Cá a oferta educativa suplanta a procura e lá a procura é enorme para uma oferta mais do que escassa. A falta de escolas e professores nos PALOP é gritante. Como é gritante a falta de todo o outro tipo de quadros superiores, engenheiros, médicos, gestores, veterinários, agrónomos.

Portugal tem um problema grave, o envelhecimento rápido da população. Precisamos de sangue novo. Cerca de 10% dos concelhos portugueses (33) já não têm ensino secundário e a falta de alunos será progressiva e geral em todos os níveis de ensino. Que melhor maneira de rejuvenescer a população portuguesa do que receber jovens que pretendem estudar em Portugal? Dantes foram os Portugueses que partiram por esse mundo fora, agora é altura de receber os jovens dos povos que os Portugueses colonizaram e com quem se miscigenaram. Ainda que abertos a todo o mundo e aos seus refugiados, é preferível que os imigrantes em Portugal provenham de culturas afins e que, de alguma maneira, também são nossas. Será a melhor maneira de evitar os conflitos étnicos, religiosos e culturais que países do Centro e Norte da Europa têm com algumas das suas minorias.

Um simples decreto, o Estatuto do Estudante Internacional de Maio de 2014, veio alterar profundamente o panorama das Instituições de Ensino Superior em Portugal, em particular das situadas no interior de Portugal, com algumas delas chegando já a 20% de alunos estrangeiros. É o caminho certo que há que prosseguir e aprofundar. Os benefícios são mútuos e múltiplos para instituições e alunos. As primeiras viram vagas preenchidas em cursos de fraca procura, nomeadamente em engenharia civil, ciências agrárias e cursos de formação de professores. E os benefícios para os alunos em muito vão para além da formação estritamente académica, em particular o entrarem em contacto com uma nova realidade social, cultural e económica. O enriquecimento humano e intelectual dos alunos que provêm de países menos desenvolvidos e aqui deparam com uma cultura de maior responsabilização, de maior igualdade de género, de maior respeito pela diversidade, é um legado que lhes ficará para toda a vida e em muito os ajudará na realização pessoal e profissional pela vida fora.

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O ensino superior é uma importante actividade económica no mundo actual, destacando-se neste campo não só os Estados Unidos da América, o Reino Unido e a Austrália, mas também países como a Holanda e a Espanha. Portugal tem vantagens competitivas únicas; pela excelente relação qualidade-custo que oferece, por ser um dos países mais seguros do mundo, pela abertura e disponibilidade da população em acolher estrangeiros, mas sobretudo pela língua que partilha com mais de 200 milhões de brasileiros e perto de 60 milhões de africanos. Mas além da actividade económica que representa a formação superior, e que só agora começa a ser percebida pelos organismos governamentais ligados à exportação de bens e serviços, nomeadamente a AICEP, o mais importante é olhar para a educação e formação de quadros nos países da CPLP como a grande missão do Portugal do Século XXI. Não se trata de, como outrora, dilatar a fé e o império, mas sim de, num quadro contemporâneo de respeito pela autonomia dos povos, encetar uma cooperação aprofundada de investimento na educação e na ciência.

O Camões – Instituto de Cooperação e da Língua deveria ser fortemente reforçado, política, institucional e orçamentalmente. É certo que as largas dezenas de bolsas de estudo a alunos dos PALOP é uma excelente iniciativa, mas é claramente insuficiente. Muitos desses bolseiros não têm as bases escolares suficientes para com êxito prosseguirem os estudos nas IES portuguesas. Era importante que houvesse uma rede de escolas portuguesas nesses países, com professores devidamente qualificados, portugueses e nativos, e pagos pelo Governo português. Não basta haver uma escola portuguesa em Luanda ou no Maputo, é preciso replicar essas escolas pelas principais cidades dos países da CPLP, com currículos portugueses e cujos finalistas pudessem participar no Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior Português. A escolarização básica nos PALOP é uma tarefa ingente, atendendo à juventude das respectivas populações. Portugal pode e deve contribuir, até mais não poder, nesse esforço educativo e formativo.

Creio que melhor desígnio para Portugal não pode haver do que, na senda do seu passado, assumir como missão primordial do seu ser como nação uma melhor educação e formação cultural, científica e técnica num mundo que fala a sua língua e que de algum modo se sente português.