Nos últimos dez anos assistimos a um esforço de desalavancagem em Portugal, tanto no setor público como no privado, como resposta ao sobreendividamento da década anterior. Fruto do esforço das famílias e das empresas, a realidade que enfrentamos hoje é distinta e a principal prioridade do país é acelerar o seu potencial de competitividade e crescimento de forma duradoura.
Portugal necessita de capital, e para tal, deve ter a missão de atrair, desenvolver e reter empresas de maior dimensão, que possam impulsionar o nosso crescimento e permitir aumentos de produtividade e criação de valor para a economia.
Olhando para a próxima década, torna-se imperativo que Portugal ambicione ter mais empresas nacionais com escala global. Serão estas empresas que terão capacidade para investir a nível nacional e internacional, contribuindo para um aumento da produtividade, criando melhores condições para o talento e potenciando um ecossistema dinâmico à sua volta, promovendo clusters de pequenas e médias empresas. Ainda este ano assistimos a uma onda de Ofertas Públicas de Aquisição (OPA) em mercados externos como Finlândia, Espanha e Reino Unido, promovidas por grupos empresariais nacionais como a Sonae, o Grupo Mello ou a Navigator, evidenciando que, apesar de poucas, as grandes empresas portuguesas estão com ambição e focadas em investir no futuro. Temos de reforçar esta vontade e mostrar capacidade de executar mais movimentos como estes.
Além disso, são as empresas com escala que são muitas vezes catalisadoras e agentes de transformação, dínamos de lideranças responsáveis que estimulam a inovação e criam as condições para o talento se elevar. Esta é uma responsabilidade e um dever para tornar Portugal mais competitivo. Potenciar talento contribuindo para o seu desenvolvimento e, por arrasto, para o crescimento da economia do país.
Da mesma forma, as médias empresas com bases competitivas sólidas e uma forte componente exportadora têm de se afirmar no mercado global. Precisamos de mais exemplos como os que vemos em setores tão distintos como o da educação (escolas de gestão) ou o do cluster do ciclismo, setores que se abriram ao mundo e que, num espaço temporal relativamente curto, deram passos sólidos e tornaram-se referências nas suas áreas de atividade e um exemplo para repetir nos próximos dez anos.
Também nas startups temos vários movimentos de empresas que nascem com ambição global, suportadas por equipas com a capacidade de criar soluções disruptivas. Quando a ousadia se alia a essa capacidade criativa é possível, numa década, ter resultados extraordinários. Portugal é um exemplo disso, com um número elevado de startups bem conseguidas (“unicórnios”), quando comparado com países de maiores dimensões como França, Espanha e Itália — Portugal tem 0,59 unicórnios por milhão de pessoas, Espanha tem 0,25, França 0,4 e Itália 0,03.
Ao juntar ambição, investimento e talento os resultados tendem a aparecer. Porque não assumir o aumento da competitividade como desígnio principal para Portugal?
Para concretizar este propósito, é preciso que todos os intervenientes do país estejam alinhados com esta visão. Quando olhamos para os principais índices de competitividade publicados, a dimensão da burocracia penaliza recorrentemente a posição de Portugal nestes rankings.
Não vamos conseguir crescimento sem investimento e, muitas vezes, a vontade de investir esbarra na capacidade de decisão das entidades públicas, responsáveis pelas devidas autorizações e licenciamentos. Precisamos de capacidade de resposta em tempo útil e rápido, seja ela positiva ou negativa, porque a incerteza e os atrasos traduzem-se em custos acrescidos, inércia, aversão ao investimento e perda de competitividade.
A desburocratização, a regulamentação eficiente e prática e um sistema fiscal competitivo são cruciais para atrairmos capital. É fundamental combater esta situação e termos a ambição de, nos próximos anos, posicionarmos Portugal como um dos melhores países para investir e um centro de inovação para o mundo.
Estes desafios, infelizmente, ultrapassam fronteiras. Assim como Portugal, também a Europa enfrenta a necessidade urgente de reorientar o seu foco para a inovação e a criação de valor, em vez de priorizar a regulamentação excessiva. Prova disso é o recente relatório apresentado por Mário Draghi que evidencia o atraso da Europa, nomeadamente face aos EUA e a China, sugerindo um orçamento mais robusto para fomentar a inovação e reduzir a burocracia.
Estas reformas estruturais ao nível do Estado são necessárias para atrair capital e acelerar o crescimento no nosso país, mas também é urgente uma atitude diária positiva e pragmática de cada um de nós, tanto no setor público como no privado, para alcançarmos um objetivo partilhado de ter um país mais competitivo.
Vamos ser ambiciosos e criar as condições necessárias para que os portugueses e a nossa economia se afirmem e possam atingir todo o seu potencial. Este é o momento de olhar para o futuro com determinação e trabalhar para que Portugal seja o protagonista da competitividade e criação de riqueza na próxima década.
Ricardo Pires é licenciado em Administração e Gestão de Empresas e tem um MBA na mesma área. Com experiência em corporate finance, foi diretor de Planeamento Estratégico e Novos Negócios e chefe de gabinete do Presidente do Conselho de Administração da SEMAPA — empresa de que é atualmente o presidente da Comissão Executiva. É membro do Clube dos 52, uma iniciativa no âmbito do décimo aniversário do Observador, na qual desafiamos 52 personalidades da sociedade portuguesa a refletir sobre o futuro de Portugal e o país que podemos ambicionar na próxima década.