Um dos grandes problemas que as famílias portuguesas enfrentam atualmente é o acesso à habitação. Mas qual será a melhor opção: comprar ou arrendar?

Num mundo de mercados perfeitos, as duas opções deveriam ser equivalentes, mas por diversas razões acabam por não o ser. Passo a explicar.

Comprar casa requer um investimento financeiro avultado, que quase sempre é feito com recurso ao crédito. Para grande parte das famílias que tem casa própria, a compra da casa é mesmo o maior investimento que fazem durante a sua vida. Mas o recurso ao crédito significa que, embora este seja um ativo aparentemente sem risco, como o financiamento é tipicamente feito com taxas variáveis, pode haver grandes flutuações no valor das prestações a pagar.

A alternativa é arrendar a casa onde se mora. Esta tende a ser a opção escolhida por quem planeia ficar pouco tempo no mesmo sítio ou por quem simplesmente não tem acesso ao mercado imobiliário devido a restrições financeiras.

No entanto, o que observamos atualmente em Portugal, e em especial nas grandes cidades, é que as casas disponíveis para arrendar são poucas e caras. Como é que chegámos até aqui, e como podemos chegar a uma solução para este problema?

Há duas questões distintas. A primeira está relacionada com o número total de casas disponíveis. A segunda está relacionada com quantas destas casas estão disponíveis para o mercado de arrendamento. Em ambos os casos, há que ter atenção porque políticas aparentemente bem-intencionadas acabam por ter efeitos desastrosos.

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Comecemos pela primeira questão: o número de casas disponíveis para habitação. Portugal está na moda, e, além de ser um destino turístico popular, também tem uma proposta de valor apelativa para os novos nómadas digitais, que podem trabalhar remotamente a partir de qualquer sítio. Mas para quem precisa de comprar ou alugar casa, este aumento da procura significa que vai ter de pagar mais, ou deslocar-se para a periferia, a menos que haja um aumento do parque habitacional. Neste capítulo, devemos repensar se queremos realmente ter políticas que incentivam o aumento da procura (através de diferentes incentivos fiscais a que os locais não têm acesso) e qual a melhor forma de permitir uma expansão da oferta (através do licenciamento de novos projetos imobiliários, e provisão de infraestruturas que permitam deslocações mais eficientes dentro da área metropolitana das grandes cidades).

Passamos agora à segunda questão: quantas das casas existentes estão disponíveis para arrendamento. Embora se fale muito de arrendamento coercivo para colocar mais casas no mercado, a principal razão pela qual temos um mercado de arrendamento diminuto são justamente as políticas públicas que têm sido adotadas.

Em primeiro lugar a fiscalidade em Portugal penaliza fortemente o mercado de arrendamento. Uma casa adquirida para habitação própria é taxada aquando da sua aquisição e anualmente através do IMI. No entanto, no caso de uma casa destinada ao mercado de arrendamento, a estes impostos soma-se o imposto sobre o rendimento do imóvel (que são as rendas pagas pelo inquilino ao proprietário). Ou seja, se comprar casa para habitação própria posso morar lá sem qualquer custo adicional, mas se a alugar pago imposto sobre o que receber. Assim, só vou querer investir para alugar se o que receber for suficiente para compensar o imposto que vou ter de pagar. Isto explica em larga medida porque é que a aquisição de casa própria é geralmente a opção preferida, pois a casa arrendada acaba por ficar mais cara.

Em segundo lugar, a forte incerteza acerca do enquadramento futuro do mercado de arrendamento vem dissuadir ainda mais os eventuais proprietários de fazerem novos investimentos. Se ainda subsistiam algumas dúvidas, a proposta de arrendamento à revelia da vontade do proprietário veio colocar novas casas no mercado, mas que deixaram de estar disponíveis para arrendar. Este tipo de propostas acaba por incentivar cada vez mais a aquisição de habitação própria.

O colapso do mercado de arrendamento é preocupante a vários níveis. Primeiro, a camada da população mais afetada é justamente a camada da população mais vulnerável, que não consegue adquirir casa própria. O impacto também é desproporcional nos jovens, que estão em início de carreira e ainda não têm casa, criando um incentivo adicional à emigração. Sem casa e com salários baixos, os jovens que ficam adiam a constituição de família, o que significa que têm cada vez menos filhos.

Assim, a solução do problema habitacional passa por permitir um aumento das casas disponíveis, de forma a parar a escalada de preços, mas também pelo melhor funcionamento do mercado de arrendamento, que permita que quem não pode (ou não quer) comprar casa possa alugar uma casa para morar.