Segundo o primeiro estudo público pelo CMMID COVID-19 working , do Centre for Mathematical Modelling of Infectious Diseases da London School of Hygiene & Tropical Medicine, a nova estirpe do vírus é aproximadamente 60% mais infecciosa do que as anteriores. Isto é bastante preocupante, sobretudo para os países ocidentais, que tantas dificuldades têm tido a combater a Covid-19, como Portugal.

Agora, mais do que nunca, o controlo epidemiológico nas fronteiras torna-se crítico, aliás como já se pode ver pela reacção da maioria dos países da União Europeia. Se os países tiveram dificuldade em parar esta estirpe, antes mesmo de ela proliferar dentro do país, terão muito mais dificuldade em pará-la à posteriori.

Basta constatar o que aconteceu em Inglaterra estas últimas semanas, onde esta estirpe se tornou prevalente muito rapidamente. Em Londres, 60% dos contágios são já da nova estirpe, como se fosse uma nova doença que “pulveriza” a anterior, e em todos os países onde a variante foi detectada houve uma subida alarmante de casos.

Se for realmente 60% mais infecciosa, o Rt aumenta consideravelmente, o que para países que têm dificuldades em impor medidas simples e efectivas, como a utilização de máscaras, o distanciamento social e o teletrabalho a partir de casa, torna a situação muito mais complicada.

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E veremos como se comportará esta estirpe em ambiente escolar, que até agora tinha sido poupado a um número de casos muito elevado, mas que a elevada transmissibilidade da nova estirpe poderá levar ao aparecimento de surtos de dimensão considerável, levando ao encerramento de muitas escolas, senão mesmo de todas, como já estamos a assistir em alguns países.

Tal como referimos nos artigos publicados ainda em Março, era de esperar o surgimento de uma nova estirpe, num país onde houvesse alta incidência, como em Inglaterra, tal como aconteceu, aliás, em 1918. Então, a segunda vaga, foi muito mais mortal. As pessoas tinham sintomas muito piores e morriam mais rápidamente. Acredita-se que 5% dos pacientes morreram nessa altura. Provavelmente, devido a uma nova estirpe, que apareceu por mutação ou recombinação com outro vírus em 1918.

Isso também nos ensina, que não poucas vezes e ao contrário do que vamos ouvindo no vox populi, as mutações de vírus que prevalecem nem sempre são mais simpáticas para os humanos: elas podem ser não apenas mais infecciosas, mas também piores para a saúde.

Quando um vírus é melhor a penetrar nas células (como esta nova estirpe), isso significa que provavelmente infecta muito mais células, se reproduz mais rápidamente e se espalha pelo corpo mais depressa, o que significará que é mais difícil de parar e que mata mais. Isso era sabido desde há 100 anos, pelo menos.

Algumas das vacinas agora em desenvolvimento poderão tornar-se pouco eficazes, pois se uma vacina com 70% de eficácia poderia ter sido útil, uma vez que com apenas uma parte da população imunizada gerávamos imunidade de grupo, agora talvez precisemos de vacinar bastante mais pessoas para alcançar a mesma imunidade de grupo, tornando-se este objectivo muito mais difícil ou mesmo impossível.

As pessoas podem estar agora mais confiantes graças às vacinas, mas a situação epidemiológica pode piorar antes de melhorar, pois temos uma corrida entre as vacinas e a nova estirpe.

Obviamente, também significa que teremos um período ainda mais longo para a recuperação económica, uma recessão mais longa e possivelmente mais profunda. Mais pessoas a perder o emprego, mais empresas a fechar e maiores desigualdades. E o que podemos fazer para o evitar?

A verdade é que ainda vai levar algum tempo até que esta estirpe esteja espalhada por todos os lugares, mas se a DGS e o Governo mantiverem o nível de complacência e continuarem apenas a ser reactivos em vez de preventivos, lá para Janeiro, Fevereiro e Março, com as pessoas a voltarem ao trabalho e as crianças às escolas, após este descanso de Natal e de Ano Novo, e com as pessoas cada vez mais em ambientes fechados como escolas, escritórios e as próprias casas, devido ao frio, o pico de infecções poderá dar-se durante os próximos meses, até Março, e em contínuo até lá.

Há esperança que a DGS e o Governo sejam mais preventivos, embora esta seja ténue, dado o histórico de tomada de decisões durante a pandemia. Desde logo, vê-se isso pela estratégia para a vacinação. Ao ritmo previsto por Francisco Ramos (50 mil vacinas por dia), demorará cerca de 400 dias a inocular a população toda, por isso e assim, só lá para o final da Primavera de 2022 terminaria a vacinação em Portugal. Temos de exigir mais e melhor.

A ideia peregrina de não envolver as farmácias na vacinação, a ideia de não criar centros de vacinação em massa, tal como feito, aliás, na maioria dos países ocidentais, só se explica à luz de uma teimosia ideológica, que não quer envolver os privados no processo e quer envolver apenas o SNS, para depois dizer que foi graças ao SNS que se vacinaram os portugueses todos, mesmo que isso implique mais portugueses a morrer ou, pelo menos, a sofrer as consequências de um vírus como este.

Temos de estar mentalmente e operacionalmente preparados para um péssimo Janeiro a Março em termos de contágios, o que implica não diminuir o nível de cuidados que temos tido e, provavelmente, aumentá-los, preparando-nos para continuar a manter uma atitude de isolamento social e de cuidados acrescidos.

É de crer que só lá para Abril, com a chegada da Primavera e a subida das temperaturas, começaremos a ver as coisas a melhorar em termos epidemiológicos. Sempre que tivermos que nos encontrar com pessoas de fora da nossa bolha familiar ou de trabalho, que seja em locais ao ar livre ou devidamente arejados e ventilados. Usar melhores máscaras, manter a higiene e o distanciamento social é fundamental.

E, sobretudo, temos de exigir ao Governo, uma estratégia de testagem e rastreio muito mais abrangente. Agora que começam a existir cada vez mais soluções de testagem rápida e cada vez mais baratas, o Governo devia implementar uma estratégia de testagem nacional, que permita a qualquer cidadão que se queira dirigir a uma junta de freguesia ou a uma farmácia, poder ser testado imediatamente, a custos baixos (ou mesmo oferecido pelo Estado) e com resultados instantâneos.

Devíamos também apostar no controlo epidemiológico nas fronteiras, aliás, como já se faz na maioria dos países da União Europeia, com testagem rápida nos aeroportos e fronteiras terrestres.

Só sabendo onde anda o vírus, o podemos travar. Só sabendo quem o transporta, poderemos deixar de o ver transmitir-se. Está na hora de o Governo implementar, de uma vez por todas, a estratégia de rastreio que começámos a pedir em Março. Já passaram nove meses… o bebé pode nascer?

Que 2021 nos traga boas notícias e muita saúde para todos é o que mais podemos desejar, mas podíamos começar por pedir ao Governo e à DGS que ajudassem na guerra a este vírus. Adaptando o hino nacional a esta realidade: Aos testes… aos testes… pela saúde dos Portugueses lutar!