Assinala-se a 21 de março o Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, instituído a 26 de outubro de 1966 pelas Nações Unidas que em Assembleia Geral lembrou o incidente de 21 de março de 1960 quando a polícia matou 69 pessoas numa pacífica manifestação contra o Apartheid, em Sharpeville, África do Sul.
Em Portugal é relativamente fácil encontrar textos ou artigos sobre a discriminação racial de uma forma geral; mas é difícil encontrar algo específico sobre esta mesma discriminação no mundo do trabalho, ao contrário do que sucede por exemplo no Brasil.
Esta ausência de pensamento poderia significar que, na prática, no nosso país, a discriminação no trabalho em função da raça ou etnia é praticamente inexistente. No entanto, o que infelizmente acontece, é que este tema não é tratado e as situações concretas de discriminação racial nas empresas são banalizadas, camufladas e inconsequentes.
Em dezembro de 2018, o Observatório das Migrações do Alto Comissariado para as Migrações (ACM) publicou um Estudo sobre Discriminação no recrutamento e no acesso ao mercado de trabalho de imigrantes e portugueses de origem estrangeira (coordenado por Pedro Góis, José Carlos Marques e Carla Valadas e com a colaboração de Ana Leite e Carlos Nolasco); e as conclusões desse Estudo são claras: permanecem diversos entraves no acesso ao mercado de trabalho e continuam a existir práticas por parte de alguns empregadores que se traduzem numa clara manifestação de discriminação no acesso ao mercado de trabalho. Urge, por isso, combater todas estas formas de discriminação no recrutamento e acesso ao mercado de trabalho.
A legislação portuguesa através do Código de Trabalho e da Constituição da República Portuguesa, impõe o princípio de para trabalho igual, salário igual, definindo como trabalho igual, aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são iguais ou objetivamente semelhantes em natureza, qualidade e quantidade.
Em concreto, no que respeita à discriminação racial e étnica, a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR) é o órgão competente para sancionar a prática de atos que resultem na recusa ou condicionamento do exercício de direitos económicos, sociais ou culturais, por quaisquer pessoas, em razão da pertença a determinada origem racial e étnica, cor, nacionalidade, ascendência ou território de origem. Todavia, em matéria de emprego ou de acesso ao emprego, a entidade competente para o tratamento de queixas relacionadas com a discriminação racial, a instauração e promoção do competente procedimento contraordenacional, bem como para proferir a decisão final é a Autoridade para as Condições do Trabalho – ACT.
Entre 2015 e 2017 as queixas de discriminação na área laboral foram cerca de duas dezenas, perdendo importância relativa face ao aumento do volume global de queixas reportadas à CICDR. Esta comissão acolhe queixas de discriminação de matéria laboral, mas cabe à ACT a proteção dos trabalhadores e assegurar a igualdade de tratamento no acesso ao emprego e nas condições de trabalho. Nos últimos anos observou-se uma diminuição das visitas da ação inspetiva no domínio da igualdade e não discriminação no trabalho e no emprego e, consequentemente, verificou-se uma redução das infrações autuadas no domínio da igualdade e não discriminação no trabalho e no emprego.
A recente iniciativa do Governo Portugal for Ukraine para apoiar os cidadãos da Ucrânia que pretendem, por razões de conflito armado e humanitárias, residir em Portugal, mobilizando – e bem -as empresas portuguesas para acolher e contratar estes cidadãos, é um exemplo que nos orgulha a todos enquanto cidadãos e portugueses; mas que nos leva a todos a pensar se não poderíamos ter ido também mais longe no acolhimento de outros cidadãos, nomeadamente não europeus, como os refugiados da Síria, do Afeganistão, do Iraque, para não falar dos refugiados da África Central e de todos os outros continentes…
Por outro lado, podemos questionar-nos se não podemos ir mais longe na identificação das situações de discriminação racial no emprego e na divulgação dos meios de combate ao flagelo. Escolher e contratar com base no sotaque não é discriminação? E atribuir trabalhos que não pretendemos nós próprios executar? E não atribuir as mesmas possibilidades de promoção por causa da cor? E será que estas situações são assim tão raras em Portugal?