Como já escrevi aqui há algum tempo, as taxas de juro poderão subir até 5% ou 5,5% sem tirar o sono a Mário Centeno. Caso a taxa de juro média da nova dívida emitida passe desse nível, a dívida pública entrará praticamente numa tendência insustentável – ou, pelo menos, começará a ser vista dessa forma pelo mercado.

Depois da subida das yields no mercado secundário ao longo dos últimos meses, e que implicou um aumento substancial dos juros já nas duas emissões feitas este ano, esta linha vermelha está cada vez mais próxima: a taxa de juro a 10 anos teima em não baixar dos 4%.

Claro que esta subida é fruto do ambiente externo e está a ser impulsionada pela alteração de expectativas quanto à política do Banco Central Europeu (BCE), mas não só. O elevado endividamento da economia portuguesa, as fracas perspetivas de crescimento e as opções do atual governo não têm ajudado. Não é coincidência que, apesar de tudo, as taxas de juro portuguesas tenham sido das que mais subiram desde o final de 2016. Ou seja, a mensagem do mercado é a de que Portugal (e outros países como Itália) não aproveitou o tempo dado pelo BCE.

É muito difícil fazer previsões, principalmente sobre o futuro. Mas, neste caso, não parece ser muito difícil antever que, caso as compras do BCE continuem a diminuir ao longo deste ano e de 2018, e sem se descobrir petróleo no Beato (ou algo equivalente que duplique o crescimento da economia portuguesa), as taxas de juro poderão chegar rapidamente à linha vermelha dos ou 5% ou 5,5% (não vamos ser picuinhas com as décimas). Mesmo que a geringonça mude de políticas (ou caia) e Portugal passe a ser o melhor aluno dos 19, dificilmente as taxas de juro deixarão de subir – o spread face às taxas alemãs até subiria menos, mas a taxa base continuará sempre a subir.

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Não será, então, melhor precaver e evitar mais um choque contra a parede?

O IGCP tem vindo a implementar a melhor estratégia possível:

  • Está a diversificar o financiamento, recorrendo cada vez mais aos produtos direcionados para o retalho;
  • Antecipa ao máximo os pagamentos de dívida mais cara (FMI);
  • E este ano tem vindo a antecipar ao máximo as emissões em mercado.

Com a emissão de janeiro e o leilão desta semana, Portugal emitiu já mais de 25% do objetivo para este ano e, segundo a presidente do IGCP, o objetivo passa por atingir 75% do financiamento já na primeira metade do ano, ganhando tempo para aproveitar as melhores condições de mercado que forem surgindo até ao final do ano.

E se, mesmo com esta boa gestão de dívida, o financiamento se tornar cada vez mais difícil? E se a volatilidade política europeia (e portuguesa) e os problemas da banca portuguesa (e europeia) levarem a uma subida ainda mais rápida das taxas? Não será melhor começar a pensar em alternativas?

Em 2010/2011, o governo de então usou um “plano B”, de Bancos. À medida que as taxas de juro iam subindo e o financiamento se ia tornando cada vez mais difícil, os bancos nacionais foram suportando o mercado de divida até ao limite. Tendo em conta a situação atual da banca e as maiores restrições por parte dos reguladores, este “plano B” seria agora bem menos eficaz do que foi há seis anos.

Para evitar um novo resgate e ancorar as taxas de juro em mercado, resta então um plano C: Pedir ao Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) um programa cautelar. E existem duas hipóteses, ambas válidas por um período máximo de um ano:

  • Um plano mais light – PCCL – aplicável a países com poucos ou nenhuns desequilíbrios económicos, e que não qualifica o país em causa para o programa OMT do BCE– a famosa bazooka anunciada por Draghi no Verão de 2012;
  • Um plano “reforçado” – ECCL – direcionado para países com acesso a mercado, mas ainda com desequilíbrios orçamentais, externos ou financeiros. Neste caso, o Estado membro qualifica-se para o programa OMT, mesmo que não chegue a acionar a linha cautelar.

Ainda que ambos os programas impliquem alguma condicionalidade (memorando de entendimento) e uma monitorização regular por parte da Comissão Europeia e BCE, o ECCL implicará sempre mais, mas mesmo assim, menos do que num resgate “normal”.

E qual seria a melhor escolha para Portugal?

Tendo em conta os desequilíbrios da economia portuguesa, com um elevado endividamento publico e privado e a situação do sector financeiro, o mais provável seria que a Comissão Europeia apenas qualificasse Portugal para um ECCL. O que até seria uma boa notícia já que, assim, o BCE poderia usar a bazooka e comprar divida pública portuguesa sem os limites do atual programa.

Mas claro que não há almoços grátis e, por mais light que sejam as condições, um programa implicará sempre um memorando, medidas orçamentais, e não só, e claro, alguma perda de “soberania”. Caso Portugal saia do Procedimento por Défice Excessivo e resolva os problemas na banca, as condições serão menores. Na prática, “bastará” cumprir as regras do pacto orçamental. No entanto, a monitorização será bem maior do que aquela que existe atualmente e mais difícil de gerir politicamente, principalmente pela atual maioria.

Os problemas políticos não seriam apenas internos. Com tantas eleições este ano, principalmente em países com a importância da Holanda, França e Alemanha, falar em mais programas é um assunto proibido – como se está a ver já no caso da Grécia. Por isso, ao contrário de 2011, um pedido português teria pouco apoio dos governos dos principais países. E, mesmo que tivesse, as condições nunca seriam light. Depois dos constantes choques e críticas entre o governo e as instituições internacionais, será difícil esperar muita compreensão em Bruxelas, Frankfurt e noutras capitais. Por isso, o melhor seria mesmo começar já a preparar o terreno.

Em resumo: Portugal terá cada vez mais dificuldade em financiar-se devido não só ao ambiente externo, mas também às fragilidades da economia portuguesa e às políticas do atual governo. Caso o financiamento em mercado falhe e não havendo “plano B”, o governo devia começar já a preparar o “plano C” e estudar um programa cautelar. Quanto mais tarde o fizer, piores serão as condições. Em 2011, Portugal esteve bem perto da bancarrota e foi obrigado a assinar o memorando sem qualquer margem negocial. Era bom que pelo menos essa lição tenha sido bem aprendida.