Portugal entrou na passada segunda-feira em estado de emergência e com esta determinação surgiram novas medidas para conter a propagação da Covid-19. Com especial impacto sobre a atividade de restauração e de comércio e, em particular, o comércio tradicional, foi decretada a proibição de circulação dos cidadãos na via pública aos fins de semana, a partir das 13 horas e até às 05 horas.

Não temos dúvidas que esta medida limitativa irá afetar negativamente o negócio de várias empresas, cuja situação financeira já estava especialmente débil na sequência do confinamento ocorrido durante o primeiro semestre, e que com muita dificuldade lutavam para sobreviver e manter a respetiva atividade.

Neste sentido, questionamos como é que se pretende que a atividade de restauração escape a severos prejuízos quando, à obrigação já vigente de encerramento até às 22:30 horas, ainda se juntou a evidente conclusão de que ao fim de semana não será possível servir almoços ou jantares nos respetivos estabelecimentos, salvo se em regime de take away. Será mesmo possível que os restaurantes resistam financeiramente a esta medida, apenas mediante a preparação e venda de refeições em regime de take away? É que o modelo de negócio de confeção, preparação e venda de refeições para take away implica um universo de custos bem inferior ao dos restaurantes, pois poderão operar em locais mais pequenos, com uma renda de arrendamento mais reduzida e não têm necessidade contratar tantos colaboradores para a manutenção da respetiva atividade.

Por outro lado, é inquestionável que a medida de limitação de circulação na via pública irá sufocar ainda mais os pequenos negócios de comércio que tinham a esperança de que o período de Natal viesse contribuir para uma ligeira retoma financeira da respetiva atividade.

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Neste contexto dramático, não antevemos com ânimo o futuro das empresas que se dedicam a estas áreas de negócio e, lamentavelmente, cremos que a generalidade destes negócios já tem um infeliz fim anunciado: irá morrer da cura…

E agora, Senhor Primeiro Ministro?

As proibições em vigor não se resumem apenas à limitação de circulação dos cidadãos na via pública, mas estendem-se bem para lá disso, o que coloca as empresas, que já vivem uma situação financeira complicadíssima, numa posição de catástrofe iminente.

Com efeito, o Decreto-Lei n.º 46-A/2020, de 30.07, que estabeleceu o apoio extraordinário à retoma progressiva de atividade em empresas em situação de crise empresarial, determina que durante o período de redução da atividade, bem como nos 60 dias seguintes, o empregador não pode iniciar os respetivos procedimentos nem fazer cessar contratos de trabalho ao abrigo das modalidades de despedimento coletivo, por extinção do posto de trabalho, ou por inadaptação. Adicionalmente, neste apoio, o recurso ao regime do layoff apenas poderá ocorrer quando a concessão dos apoios terminar. Paralelamente, o diploma que instituiu e o diploma que regulamenta o incentivo extraordinário à normalização da atividade empresarial, também estabeleceram limitações semelhantes à manutenção dos postos de trabalho, às quais ainda se acrescenta a obrigação de manutenção do nível de emprego.

Ou seja, o Governo implementou diversos apoios e incentivos à atividade empresarial (em conjunto, as “Medidas”), cujo objetivo principal era funcionarem como uma balsa de salvação até que a economia recuperasse e a confiança dos consumidores regressasse. Como contrapartida destas Medidas, e de modo a garantir que o investimento realizado não seria efetuado a fundo perdido, determinou-se – e bem – que, durante todo o período da respetiva concessão, as empresas estavam impossibilitadas de iniciar e fazer cessar os contratos de trabalho dos seus trabalhadores por recurso ao despedimento fundamentado em causas objetivas, ou ainda de recorrer ao regime de layoff.

Sucede, que não estava certamente na mente dos empresários, quando recorreram às Medidas, a hipótese de o Governo decretar a limitação de circulação dos cidadãos na via pública durante os próximos dois fins de semanas, ou, de resto, fixar o encerramento da generalidade dos estabelecimentos às 22 horas, com exceção da restauração que deverá encerrar até às 22:30 horas. Ou seja, o que justamente sucedeu, foi que as expectativas que foram criadas às empresas aquando da implementação das Medidas, e com base nas quais foram sendo tomadas as decisões das empresas de recorrer ou não a tais Medidas, foram agora totalmente frustradas, com a agravante de que as empresas não podem despedir os respetivos trabalhadores ou recorrer ao layoff.

E agora, Senhor Primeiro Ministro? Perante uma ausência de faturação durante os períodos de lockdown e da impossibilidade de conseguir manter a laboração e operação da empresa, o que é que os empresários que recorreram às Medidas poderão fazer em relação aos seus trabalhadores?

Infelizmente, ainda não existe um salvo-conduto que permita a estas empresas continuarem a beneficiar das Medidas e, em simultâneo, reduzir o respetivo quadro de pessoal ou recorrer ao layoff. Assim, para iniciar um procedimento desta natureza, as empresas terão que desistir das Medidas ou até incumprir com as disposições legais que implementam e regulamentam essas mesmas Medidas. Adicionalmente, à luz dos diplomas em vigor, a consequência direta da desistência ou do incumprimento das disposições relativas às Medidas é a devolução ou o pagamento de todos os apoios recebidos e eventuais processos de contraordenação. Tal significa que as empresas que já estão numa situação de crise empresarial, para procurar sobreviver, ver-se-ão a braços com o desafio hercúleo de encontrar meios financeiros para devolver ao Estado os apoios que já foram entregues aos trabalhadores (no caso das medidas de apoio à retoma progressiva) ou que, certamente, foram canalisados para suprir as dificuldades financeiras (no caso do incentivo extraordinário).

Por conseguinte e perante o cenário ora traçado, cumpre questionar novamente: e agora, Senhor Primeiro-Ministro? Quando é que chega o salvo-conduto?