Há anos que o pobre Fukuyama não faz outra coisa senão levar pancada de todo o santo especialista em totobolas de segunda-feira. Mas a verdade é que a História não só não acabou, como, convenhamos, tem tido ultimamente alguns twists incríveis… Epidemias globais de vírus desconhecidos, reencarnações de Estaline que declaram guerra a antigos actores de comédia, máquinas pensantes que, em meia dúzia de meses, puseram as cabeças mais respeitadas da espécie humana a falar em risco de extinção. O que é que falta? Isto: uma invasão extraterrestre pode estar a caminho.

Certo. É provável que não tenha ouvido, entre as bombas da guerra na Ucrânia e os tiros no pé do governo português. Mas, nas últimas semanas, tem-se falado em OVNIs e ETs como não acontecia desde que Orson Welles foi para a rádio relatar a “Guerra dos Mundos”.

David Grusch, um oficial americano que passou os últimos 14 anos a trabalhar em agências de informação do Departamento da Defesa, veio a público dizer: “não estamos sozinhos”. Aliás, um pouco mais do que isso: segundo ele, não estamos a falar de uma possibilidade abstracta, nem de um vago contacto com um som ou uma forma luminosa; os Estados Unidos terão mesmo, em sua posse, em peças ou no conjunto integral, vários “veículos exóticos de origem não-humana” que aterraram ou se despenharam na Terra. Assim.

Grusch não é, exactamente, o estereotipo de maluquinho que possa estar a imaginar. É um militar experiente, que liderou até há pouco tempo o gabinete de análise a UAPs da NGA – Agência Nacional de Informação Geoespacial (UAP é a designação que substituiu o velho “O.V.N.I. – Objecto Voador Não Identificado”. Significa “Unidentified Anomalous Phenomena”, isto é, “Fenómeno Anómalo Não Identificado”, uma vez constatado que muitos avistamentos estranhos não correspondiam a objectos – mas a fenómenos atmosféricos, por exemplo – e que nem tudo o que é estranho voa – sim, ao que parece, volta e meia, também aparecem coisas esquisitas a entrar e a sair dos oceanos). E como o próprio acrescenta, também não é “um ex-trabalhador revoltado”. Demitiu-se ele mesmo no passado mês de Abril para, ao abrigo do estatuto de “whistleblower”, denunciar o que considera serem factos demasiado graves para continuarem a ser escondidos ao povo americano, que paga com os seus impostos estas agências, programas e investigações.

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Na sequência das duas entrevistas que concedeu este mês, outros militares vieram a público, uns para corroborar as afirmações de Grusch e outros a refrear a temperatura aos ânimos com algum cepticismo. Todavia, o Congresso já anunciou que vai mesmo abrir uma investigação ao caso e o próprio Mark Rubio, senador e antigo candidato à liderança do Partido Republicano, veio nos últimos dias reconhecer que outros oficiais de alta patente já partilharam relatos semelhantes ao de Grusch com a Comissão de Inteligência do Senado.

No mundo da pós-verdade, em que dois dos homens mais ricos e tidos por geniais do planeta se entretêm a prometer porrada um ao outro e a responder com emojis em forma de cocó, já não parece estranho que exista mais disponibilidade para ter esta conversa. Mas vale a pena lembrar que este não é um acontecimento isolado, saído da cabeça do Garganta Funda do trimestre; vem na sequência de uma série de notícias credíveis saídas nos últimos dois anos. Em 2021, imagens mais tarde reconhecidas como verdadeiras pelas autoridades mostravam um conjunto de encontros de aviadores militares americanos com objectos voadores de comportamento bastante inexplicável. Na sequência da divulgação, o Pentágono publicou um relatório onde reconhecia a ocorrência de mais de 140 encontros com UAPs para os quais continua a não ter explicação. Um novo gabinete foi, então, criado, o AARO, All-domain Anomaly Resolution Office (uma espécie de tudo-em-um dos acontecimentos estranhos), que reunisse os dados e investigações das diferentes agências. E é no contexto do trabalho desse gabinete que sai, agora, o relato de David Grusch.

Mas porque esconderiam os Estados Unidos a existência de vida extraterrestre quando passam, publicamente, a vida a procurá-la e a gastar nisso biliões de dólares, dirá o camarada leitor? E eu digo: tem o camarada toda a razão, mas há razões que a razão desconhece. Então na América.

A verdade é que, como nos lembrará, dentro de dias, o filme “Oppenheimer” e a própria corrida à Inteligência Artificial, de cada vez que se descobre uma nova tecnologia, seja ela de que planeta for, há uma corrida para a dominar antes da concorrência.

Michael Shellenberger, autor e activista ambiental distinguido pela Time, acrescenta pormenores: estaremos a falar de 12 a 15 veículos, metade em bom estado, metade em mau, de pelo menos quatro morfologias diferentes. Terão sido, diz Grusch, recolhidos pelo Pentágono ao longo de décadas, não necessariamente em solo americano, começando com um achado nos anos 40 em Itália, remetido para os EUA com ajuda de Mussolini e do Vaticano (como resistir a isto, caramba?). Desde então, são estudados em programas de “engenharia reversa”, que tenta compreender como foram feitos e que tecnologia utilizam, e pessoas já poderão ter sido mortas para manter estas informações em segredo. Assim. À filme.

Agora, o que virão cá os extraterrestres fazer, essa já é outra questão. Entre o perfil do invasor diabólico e o do gentil diplomata consagrados pelo cinema, há espaço para quase tudo – até para turistas espaciais em férias, em busca da nova Quarteira Sideral. Quem sabe, até não fazem visitas regulares para observar a questão do aquecimento global, como quem vê se a água do banho já está quentinha que chegue? Num tempo em que tudo o que está entre nós e o apocalipse nuclear pode ser um ex-vendedor de cachorros-quentes enraivecido, a história não deixa de trazer uma estranha dimensão de esperança. Mas uma coisa lhe garanto: agora é que o preço dos alojamentos em Alfama dispara para as estrelas.