Portugal é um país de mar. Com uma costa de mais de 1.800 quilómetros, somos banhados por um oceano que oferece oportunidades quase infinitas. No entanto, enquanto o mundo anda obcecado com o “verde”, nós continuamos a olhar para o “azul”como se fosse só um horizonte bonito, ou, pior ainda, um depósito infinito de recursos. Falamos de sustentabilidade, de economia circular, de transição energética, mas raramente ouvimos o termo “Economia Azul” no discurso público. E isso é um erro crasso, pois continuamos a assobiar para o lado, enquanto desperdiçamos o que pode ser uma das nossas maiores vantagens competitivas.
Não se trata de nenhuma subcategoria da economia sustentável e muito menos de uma extensão da “economia verde”. É um conceito distinto, que defende o uso sustentável dos oceanos, mares e zonas costeiras para crescimento económico, melhores meios de subsistência e preservação ambiental. É um modelo de desenvolvimento que vê o mar como muito mais do que um local para apanhar sol, ou pescar sardinhas. Falamos de energia das ondas, eólica offshore, aquacultura sustentável, biotecnologia marinha, turismo costeiro inovador, conservação de ecossistemas marinhos e até de mineração do fundo do mar (que, aliás, precisa de ser feita com critérios rígidos de sustentabilidade). Um relatório da OECD estima que a Economia Azul global poderá valer entre 3 a 6 trilhões de euros por ano até 2030. E Portugal o que está a fazer para agarrar a sua fatia deste bolo?
Vamos pegar num exemplo simples: a energia das ondas. Portugal, com o seu Atlântico agitado, tem um potencial inexplorado enorme. Já temos algumas iniciativas, como a central de ondas da Aguçadoura, mas isso é uma gota no oceano do que realmente poderíamos fazer. A energia das ondas, se desenvolvida em escala, poderia ser uma resposta não só às nossas necessidades energéticas, mas também uma fonte de exportação de tecnologia. A Irlanda, com uma costa igualmente rica, está a fazer grandes avanços nesta área. Se eles o fazem, por que razão nós, com a terceira maior zona económica exclusiva da União Europeia e a 11.ª maior do mundo, não aproveitamos?
O turismo costeiro, outro exemplo claro, está dominado por um modelo antiquado de resorts e hotéis que não trazem inovação, nem pensam no futuro. O turismo regenerativo, que não só preserva, mas melhora os ecossistemas, poderia ser uma nova aposta. O que estamos a fazer para aproveitar isto? Temos iniciativas? Sim, mas são isoladas e pequenas, não representando uma estratégica aposta de primeira linha.
A biotecnologia marinha é outro setor que tem vindo a crescer a uma velocidade impressionante. Desde medicamentos a cosméticos, os oceanos oferecem uma imensa biodiversidade por explorar. Países como a Noruega e o Japão estão na linha da frente da investigação. E nós? Continuamos a olhar para a água a bater nas rochas.
Obviamente, apostar na Economia Azul não é só lançar umas boias ao mar e esperar que o dinheiro venha a flutuar. Há desafios, claro. Desde a regulamentação, passando pelo financiamento de novos projetos, até à resistência das indústrias mais tradicionais. Mas há também soluções. O investimento em investigação e desenvolvimento, poderá ser um dos caminhos. Portugal tem universidades de renome, investigadores brilhantes e um know-how técnico que, se bem orientado, poderá ser um motor de inovação no setor.
Outra solução está no incentivo à criação de clusters de Economia Azul — centros de inovação que reúnam start-ups, grandes empresas, universidades e governo, focados em explorar e desenvolver este potencial. Portugal pode e deve ser um laboratório de inovações marítimas, mas para isso é preciso arrojo, visão e ação concertadas.
Não podemos continuar a ignorar o nosso maior ativo natural. Enquanto outros países, com menos recursos costeiros e marítimos, apostam forte na Economia Azul, Portugal parece viver num completo estado de alheamento, como se tivesse um oásis à sua volta que não quer explorar. Sim, a moda do verde é importante, mas o azul é a cor que nos define.
Temos todas as condições para ser uma potência na Economia Azul. O que falta? Coragem. Vontade política. E, sobretudo, a visão de perceber que o futuro não está só no interior de uma mina de lítio ou num campo de painéis solares.
O mar já nos deu glória no passado. Está na hora de olharmos para ele, não com nostalgia, mas com ambição e visão de futuro.