Começar algo de novo é mais fácil do que ter de remendar um trabalho já executado e agravado, neste caso, pela escassez do material para realizar tal tarefa.
Por isso, aguardo com uma certa paciência e inquietude que o Sr. Vice-Almirante Gouveia e Melo, na sua torre de comando, dê o sinal de partida ao caótico submarino que lhe foi entregue à deriva. Urge que ligue rapidamente as máquinas e que se aperceba de quão revoltas as águas estão.
Não nos desiluda, Sr. Vice-Almirante, porque, ao saber da sua nomeação e ao ter conhecimento do seu curriculum, o sol brilhou e uma nova esperança nasceu. O Senhor foi nomeado para planear, comandar e fiscalizar a maior luta do século: a vacinação de um povo.
Esta sua missão leva-me ao Curso de Defesa Nacional de 1989 (organizado pelo IDN) onde, além do que aprendi, me apercebi da organização, da logística e do planeamento que estava por detrás da administração militar. Ali, tudo era planeado ao segundo: desde a semana ao dia, à sessão, aos palestrantes e suas biografias, aos temas e suas bibliografias, à documentação e informação que ao iniciarmos a semana encontrávamos nos cacifos que no início do curso nos foram atribuídos.
Ali ensinava-se, discutia-se e aprendia-se: desde temas atuais até aos verdadeiros conceitos de Soberania, de Defesa nacional, de Geopolítica e às autênticas Ameaças, que, então, eram outras e maioritariamente exteriores ao nosso país – ao revés dos tempos em que vivemos. Mas o que me espantou e muito aprendi foi a importância da programação feita ao minuto, a que só os militares foram ensinados e treinados a pôr em prática.
Não nos desiluda, porque quem planeava e organizava tais cursos eram homens da mesma Escola que o Senhor frequentou. Homens cuja formação cultural, logística e ética o Sr. Vice-Almirante classificaria de óptima.
Não nos desiluda quando a esperança começa a falhar. É premente que se lute. Embora com muitas rochas e rochedos e ondulação forte, acredito que irá conseguir reorganizar – ou melhor, organizar – e dirigir um serviço de vacinação que há muito já deveria estar a funcionar em pleno.
Não nos desiluda porque sabemos que é forte. Já o demonstrou quando esteve dias mergulhado em mares profundos. Agora, mais do que nunca, tem de o ser, pois enfrenta um mar revolto e um barco sem comandante. Neste pobre Portugal, há muitos a comandarem sem o saber fazer. Perdidos nos seus egos, confusos, inconscientes e inconstantes, tanto alertam o povo para “vagas enormes” como passados minutos anunciam um “mar calmo e sereno”.
Portugal é um navio à deriva. O seu povo, na maior parte são marinheiros que não aprenderam a arte de marear. Os seus comandantes, desde a Saúde, à Administração Interna, à Justiça e às Finanças pouco ou nada sabem – nem ler uma bússola. Navegam às cegas, procurando no mar encapelado sobreviver e evitar o (in)evitável naufrágio.
À frente da frota da Saúde temos alguém que não reconhece as suas limitações e, sem qualquer pudor, afirmou, a 15 de Fevereiro, que apenas 40 dos 495 centros de saúde existentes no país estavam já dotados de ferramentas informáticas que permitissem agendar vacinações e convocar utentes.
Falar do que se passa nos centros de saúde faz doer a alma. Do que me tem sido possível apurar, o critério de vacinação é, em alguns casos, extremamente aleatório. A título de exemplo, num local de que tenho conhecimento, existem no mesmo edifício dois centros de saúde distintos: um vacina quem se apresenta no espaço com mais de 80 anos (mesmo que não esteja na lista) e outro apenas vacina quem convoca, cumprindo com rigor a lei. Isto, Sr. Vice-Almirante, é Portugal no seu melhor.
Não sei se é do seu mar esta ameaça (desgoverno), mas ela é grave e perigosa. Pode levantar ondulação e arrastar o seu barco.
Não nos desiluda, Sr. Vice-Almirante. Ajude a salvar vidas. Em especial, dos mais velhos, inicialmente relegados para segundo plano no projeto de vacinação e só depois considerados.
Ajude este povo a reaprender o verdadeiro sentido das palavras: Dever, Verdade, Seriedade, Honra.