O financiamento climático é um desafio, com problemas estruturais que se manifestam de forma diversa em diferentes contextos globais. Contudo, há uma necessidade urgente de soluções que abordem a raiz desses problemas, sabendo à partida que a diversidade de contextos ao redor do mundo, têm em características que lhes são comuns. Refiro-me à incapacidade de identificar e quantificar, com clareza e exatidão, quem polui e em que medida. Resolver este problema é essencial para avançar com uma agenda globalmente, capaz de responder com eficiência ao problema do financiamento climático.

Este problema, afeta não apenas os países e indústrias mais poluidoras, mas também todas as outras atividades económicas e sociedade como um todo. Os sistemas de contabilidade: medição, registo e verificação (MRV) são arcaicos e desatualizados, apesar da disponibilidade de tecnologias avançadas que poderiam revolucionar a “contabilidade e relatório climático”. A ineficiência desses sistemas resulta em relatórios inadequados e na incapacidade de muitas empresas e atores globais de suportar os custos elevados de consultorias especializadas. Por sua vez, assiste-se à incapacidade de termos relatos de contabilidade: medição, registo e verificação (MRV) acessíveis a todos e credíveis.

A complexidade e ineficiência dos modelos atuais de contabilidade climática levam a um cenário onde, paradoxalmente, a mesma estrutura que visa regular e monitorizar a poluição, acaba por prejudicar os próprios objetivos do financiamento climático. Este problema é evidente tanto entre países quanto dentro dos próprios países. Um exemplo claro é a Europa, onde as taxas de carbono cobradas sobre combustíveis e indústrias intensivas são redistribuídas para projetos de mitigação dos impactos climáticos. Contudo, a eficácia dessa redistribuição varia significativamente entre os países devido à capacidade de gestão que cada país apresenta, relativamente a esses fundos.

Em Portugal, observa-se uma ineficiência notória na gestão desses recursos, resultando em prejuízo para os objetivos que deveriam atingir. Programas como o Fundo Ambiental (FA), gerido pela APA, frequentemente enfrentam atrasos e falhas na implementação de projetos essenciais, como, por exemplo, o combate à pobreza energética. Este fundo, alimentado pelas taxas de carbono, deveria financiar melhorias na eficiência energética das habitações dos mais carenciados, segundo definição europeia do que é a Agenda de Combate à Pobreza Energética, mas as burocracias, pouca capacidade tecnológica e técnica, e até as mudanças políticas atrasam a sua execução. Este cenário cria uma desigualdade onde países com sistemas mais eficientes beneficiam melhor dos recursos disponíveis, enquanto outros, como Portugal, ficam para trás.

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Simplificar com tecnologia para democratizar o financiamento climático

A democratização do financiamento climático é essencial. Isso significa criar sistemas que identifiquem boas práticas de forma clara e transparente, permitindo uma alocação mais justa e eficiente dos recursos. A tecnologia pode ser uma mais-valia nesse processo, oferecendo soluções para contabilidade climática entre países e dentro dos diversos setores económicos. O PRR (Programa de Recuperação e Resiliência) embora tenha alguns setores temáticos dirigidos à Agenda Climática, não se observa que estas estejam a seguir um caminho que leve à sua aplicação prática, na resolução deste problema.

Ainda haveria tempo de direcionar fundos do PRR para programas e projetos piloto a serem desenvolvidos para adaptar essas tecnologias às realidades locais, criando um sistema de financiamento mais simplificado, transparente e eficaz. As tecnologias existentes, atualmente, permitem a implementação de soluções que podem entregar, de forma eficiente e no curto prazo, os recursos necessários aos projetos mais eficientes dentro das políticas de mitigação climática. No entanto, é necessário coragem e vontade política para adotar essas tecnologias e transformar o paradigma atual. Instituições nacionais e europeias precisam comprometer-se com essa mudança, facilitando o acesso direto a fundos climáticos para municípios, empresas, cidadãos e todos os que demonstrem essas boas práticas.

O financiamento climático precisa de uma reforma urgente que passe pela adoção de tecnologias modernas e pela criação de sistemas transparentes e eficientes de identificação das boas práticas e alocação dos recursos. Só assim será possível garantir que os fundos climáticos cheguem a quem realmente precisa e que projetos essenciais para a mitigação das mudanças climáticas sejam implementados sem os atrasos e ineficiências atuais. Esta transformação é fundamental e urgente para assegurar que as políticas climáticas sejam eficientes, onde todos, de forma justa e transparente, tenham acesso ao financiamento, e este, seja alinhado com o cumprimento de objetivos e metas climáticas.