Aparentemente, os portugueses estão a perder o sentido de humor. Pior, parece que estão mesmo a perder a graça. A famosa tirada do ministro das Finanças holandês e chefe do Euro grupo, Dijsselbloem, foi uma grande oportunidade para gozar com o pobre do holandês. Em vez disso, portámo-nos como se fossemos uns púdicos. Reagimos à holandesa. Com indignação. Amuámos. Que tristeza. Em primeiro lugar, é verdade que gostamos de copos e de mulheres. Aqui falo pelos homens. Espero que as mulheres também gostem de copos e de homens. E qual é o problema de gostar de mulheres e de copos? E é ou não é verdade que quem gosta, gasta dinheiro a beber copos e a sair com mulheres? Preferiam que um tipo do norte da Europa dissesse, “estive em Portugal e os portugueses são demasiado sérios, não se sabem divertir, nem sequer bebem uns copos; são uns chatos”?

Também ouvimos as reações indignadas dos militantes do politicamente correcto: “um horror misturar mulheres com copos.” Mais uma reação à holandesa. Parece que estamos armados em moralistas. Os portugueses tornaram-se demasiado dramáticos. Nestas coisas é que deveriamos ser mais ligeiros e descontraídos. Como disse uma amiga, já com uma certa idade, “ai que saudades dos tempos em que saía com rapazes que gostavam de copos e de mulheres.” Será que as pessoas com capacidade para não levar estas coisas muito a sério estão todas a ficar velhas?

Quase tão mau como a indignação geral, foi a resposta do governo. O nosso governo deveria ter dado uma de duas respostas. Poderia ter desvalorizado completamente a tirada do holandês. Neste caso, o PM teria dito simplesmente: “tenho muito trabalho para fazer, não perco tempo com disparates.” E não falava mais do assunto. Ou, então se queria levar a sério a tirada do holandês, pedia mesmo a demissão de Dijsselbloem do Euro grupo. Mandava o ministro das Finanças a Bruxelas à reunião dos ministros das Finanças para exigir a demissão do holandês. Nem que fosse o único a faze-lo, Centeno deveria ter ido a Bruxelas e dizer à frente de todos os ministros, “o senhor não tem condições para continuar neste cargo. Demita-se”. Poderia perder, mas se ficaram mesmo indignados, então é melhor perder sozinhos. É assim que se recupera a dignidade.

Mas o governo não fez nada disto. Enviou o secretário de Estado, Ricardo Mourinho Félix, fazer uma figura patética a Bruxelas. Meteu dó. Parecia a cena de um jovem estudante que se encheu de coragem para falar com o professor, decorou umas frases e vomitou-as com ar de doente. Coitadinho do Ricardo. Estava cheio de vontade que a cena chegasse ao fim. Com ar aprumado, a olhar para cima e abanar o braço num aperto de mão interminável. O pobre assustou-se com o seu momento de coragem. E o governo ainda passou pelo vexame de ouvir Dijssebloem “se estão ofendidos, deviam ter pedido a minha demissão.” Uma vergonha que mostra bem como este governo se comporta. Só interessa a comunicação e a encenação. A substância, os princípios e o carácter são irrelevantes.

Por fim, Dijssebloem portou-se como um coitado. Tinha acabado de ser esmagado nas eleições holandeses e anda claramente desnorteado. O desespero revela, muitas vezes, os piores instintos. Neste caso, o moralismo calvinista a dar lições de moral ao sul católico. Mas estes moralismos não são para levar a sério. Devemos antes reagir com graça. Gostaria de ter visto um ministro a convidar o Dijssebloem para vir a Portugal beber uns copos e esquecer o mau momento político. E quem sabe, ele poderia gostar. Os bares em Lisboa ou no Porto poderiam fazer uma noite “Dijssebloem”, “esta noite há bebidas de graça para todos os holandeses.” Uma boa oportunidade para promover a hospitalidade portuguesa na Holanda.

Eu lembrei-me da resposta do grande jogador de futebol irlandês, George Best, “gastei quase todo o meu dinheiro em mulheres e copos. O resto foi mal gasto”. Best era um católico que gostava de chocar os protestantes. E conseguia. Que o seu exemplo viva entre nós por muitos anos.

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