Quase volvido um mês desde o começo da Jornada Mundial da Juventude, torna-se cada vez mais necessário e, sobretudo, possível avaliar os efeitos do evento que contou com a presença do Santo Padre em Portugal.

Enquanto, nos meses que antecederam o evento, muitos previam um caos na capital, a imensurável capacidade de desenrasque (já característica portuguesa) sobrepôs-se à falta mensurável de organização e planeamento nos anos anteriores à Jornada, porque esta foi nula. De certo modo em divergência com esta lógica, em que a imensurabilidade supera a mensurabilidade, os resultados mensuráveis e os imensuráveis deste grande evento, para já, equivalem-se positivamente. Comecemos por abordar as consequências imensuráveis deste evento para Portugal, bem como para a Igreja Católica.

Segundo os Censos de 2021 em Portugal, na última década o número de católicos diminuiu de 88,3% para 80,2% da população. Esta informação é totalmente oposta àquele que tem sido o crescimento de fiéis observado nos últimos anos na Igreja Católica, que no final de 2020 contava com um aumento de 15,2 milhões de católicos, 734 mil dos quais na Europa. Além do mais, no último ano o país conheceu o relatório final sobre os abusos sexuais na Igreja portuguesa, o que decerto influencia a fé de muitos, apesar de ser necessário aguardar por confirmações. Assim sendo, a vinda do Papa a Portugal, que não só exige tolerância zero para a situação, como visita as vítimas destes abusos e pede perdão, terá certamente um grande significado para crentes e não crentes.

Todavia, esta não foi a única mensagem que Francisco procurou transmitir durante a sua visita a Portugal. Os discursos proferidos no Parque Eduardo VII e no Parque Tejo passam por mensagens de inclusão (“Todos, Todos, Todos”), ajuda ao próximo (“O único momento legítimo para olhar alguém de cima abaixo, é para ajudar a levantar-se”), coragem para os jovens (“Não tenhais medo”) e, ainda, proximidade com Deus (“Para Deus, nenhum de nós é um número, mas um rosto”). Ainda que a muitos estes discursos sugiram apenas frases clichés e embelezadas, as quais não terão grande efeito futuro, relembremo-nos do Parque Tejo, com uma maré humana de um milhão e meio de pessoas a aplaudir Francisco.

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Esta experiência, não só de contacto com a mais alta figura do Vaticano, mas também de contacto com jovens de outros continentes, dos quais advêm outras experiências de vida e outras culturas, torna-se rapidamente em evolução e em maturidade de todos estes jovens. Este património cultural é, portanto, imensurável não só pela sua natureza, como também pela sua grandeza. É um milhão e meio de jovens, provenientes dos quatro cantos do mundo, que regressam aos seus países com uma experiência vivida em Portugal que lhes abre portas para mudarem o seu metro quadrado. Valiosamente, contamos com pelo menos 43 mil jovens portugueses, dos quais esperamos que mudem o seu metro quadrado no nosso país. Sem dúvida que foi um bom presságio, contrariamente a muitas críticas, que tantos jovens se tenham comportado e participado intensamente nesta semana.

Como referi anteriormente, existem também efeitos mensuráveis desta JMJ, alguns dos quais procurou-se até prever. A PwC, juntamente com o ISEG, procurou apurar o impacto da Jornada na economia nacional. Os resultados deste estudo estimam um impacto global entre 411 e 564 milhões de euros, relativamente ao Valor Acrescentado Bruto, e, ainda, entre 811 e 1 100 milhões de euros, quanto a termos de Produção. Importa ainda referir que os impactos estimados são realizados com atribuição de valores no limite inferior ao expectável, relativamente ao número de participantes, despesa média diária por participante, prolongamento de estadia e investimento público associado à organização do evento. Apesar de ainda ser necessário aguardar para determinarmos a exatidão e precisão deste estudo, basta pensar que, durante esta semana, e a que lhe antecedeu nas dioceses, peregrinos, voluntários e outros participantes tiveram custos de alojamento, alimentação, comércio e transporte. Além do mais, para a construção do palco, e outras infraestruturas, tal como para a alimentação, foram criados vários postos de emprego e foi investido capital que de outro modo não seria investido, e não se multiplicaria deste modo.

Por falar no investimento nas infraestruturas, e no investimento público que o governo e as autarquias realizaram para o evento, estima-se que este valor, que não foi solicitado pela Igreja, mas oferecido pelo Estado português, ronde os 40 milhões de euros. Isto ignorando, por exemplo, que deste valor, 25 milhões de euros investidos na cidade de Lisboa ficam para o futuro. De qualquer modo, o maior financiador deste evento católico é a própria Igreja, com um investimento a rondar os 80 Milhões de euros. Tão bom que seria termos em Portugal mais eventos nos quais investimos 120 milhões de euros (sabendo que a maior fatia deste bolo não é sequer nossa) e recebemos, pelo menos, 411 milhões de euros.

Com efeito, este investimento realizado em certas infraestruturas, nomeadamente do Parque Tejo, é um investimento com grande retorno a curto, médio e longo prazo. Num primeiro momento, porque deixou de existir um aterro que a ninguém ali interessava. Simultaneamente, uma vez que todo aquele espaço pode agora ser aproveitado para futuros eventos (que também terão retorno), estando já um deles agendado para o final do mês de setembro (Semana Académica de Lisboa).

Contudo, todos estes dados que apresentei são, por enquanto, previsões. Ainda assim, tendo estado in loco, na qualidade de peregrino, afirmo convictamente que seria de estranhar que tão grande multidão fosse incapaz de amealhar capital suficiente para superar em larga escala aquele que foi investido.

Naturalmente que os dados já posteriores à Jornada apresentados pelo Banco de Portugal na última semana reanimaram algumas vozes mais críticas na sociedade. Apesar de necessitarmos de mais dados para uma análise final e completa, devemos estar lembrados que a economia portuguesa já desacelerava anteriormente a este evento, com menos consumo, investimento e exportações. Quer isto dizer que estes dados preliminares carecem de mais informações apesar de, com ou sem JMJ, esta tendência já ser expectável.

Em jeito de conclusão, esta JMJ realizada em Lisboa começou desde logo por ser uma prova de fogo à capacidade de organização dos portugueses, que responderam da melhor maneira. Como consequência desta resposta algo inesperada, para além dos efeitos económicos previamente estudados, conta-se com efeitos sociais e culturais que só o tempo revelará, mas que certamente levará a que muitos jovens se levantem e partam apressadamente, o que inúmeras vezes valerá mais que qualquer investimento monetário.