António Costa, mais do que um político, é um tractor. Atropela tudo: as regras, os princípios, a língua, os acordos, a verdade. Mistura amigos com membros do governo, membros do governo com empresas públicas, põe amigos a gerir empresas publicas e membros do governo a trabalhar com amigos. Agora põe um “amigo” a coordenar a acção de membros do governo. Tanto dá uma palmadinha nas costas de um membro da sua equipa como, logo depois, o deixa a fritar em lume brando nas televisões. Com Costa ao leme, qualquer acordo é possível, com chineses ou com árabes, com franceses, com turcos ou com alemães; o que hoje é verdade, amanhã é mentira, o que diz hoje, amanhã está esquecido. Não há regras. Pelo caminho colabora activamente na dinamitação de todas as instituições: a PGR e a justiça, o BdP e todas as entidades fiscalizadoras, até mesmo o parlamento (que é coordenado por um compagnon de route pouco recomendável). Não tem qualquer plano ou projecto para o País, a governação é feita com o horizonte das 48 horas seguintes. Nivela tudo por baixo e arrasa tudo à volta para depois poder aparecer e parecer que é o único adulto da sala.
A política é isto? Sem dúvida.
E Marcelo Rebelo de Sousa, mais do que um político, é um actor político. Como está apenas focado em si próprio, na sua agenda, nos seus índices de popularidade, deixa andar, tudo permite e, obviamente, é completamente ultrapassado por António Costa.
Isto é política? Também é.
Mas politica não pode ser apenas isto.
No actual caldo que mistura uma sociedade amedrontada com uma economia em cacos, ambas moldadas por uma imprensa há muito falida e, portanto, dócil com o poder, a perspetiva de um longo reinado da actual liderança do País é real. E não é animadora. Passa-se a vista pelo Parlamento e logo ficamos desiludidos: os partidos grandes são pequenos e os pequenos são oportunistas ou grosseiros; apenas um parece ser estruturalmente sério e íntegro, mas é ainda embrionário. Entretanto, os biliões de euros que serão em breve despejados pela Europa num país que tradicionalmente gere danosamente os dinheiros públicos serão mais um presente envenenado para Portugal. Já se fala em regionalização. Em mais Estado. Há um enorme aeroporto para ser construído em cima das águas do Tejo. Já há consultores. Haverá muitos mais.
Independentemente de crises covid ou crises financeiras internacionais, Portugal está desde há cinco anos “entregue aos bichos” e no final (não sei qual nem quando) estará pior: muitíssimo mais pobre, com um Estado ainda mais gargantuesco, endividado, desorganizado, manietado pelos interesses e pela corrupção, com os necessários alicerces de uma democracia saudável – o Parlamento, as entidades fiscalizadoras independentes, a Justiça – totalmente dinamitados, descredibilizados ou mesmo destruídos.
Ou então, António Costa revela-se um estadista e não apenas um político hábil, se bem que grosseiro. E lutará pelo prestígio das instituições fundamentais a uma democracia que se deseja sólida: um parlamento limpo, uma justiça séria e veloz, entidades fiscalizadoras independentes e actuantes, uma imprensa livre e interventiva. E haverá transparência nas nomeações para cargos públicos. E na gestão das receitas fiscais.
Mas será que as pessoas mudam assim tanto consoante as circunstâncias? Não é impossível claro. Ou então poderão surgir novos actores que neste momento não são visíveis. Ou haverá surpresas. Há poucos anos houve algumas. Houve um político que subiu a primeiro ministro sem ter ganho as eleições. E partidos contrários à presença de Portugal na Europa votaram favoravelmente orçamentos feitos à medida dessa mesma Europa.
Não falando de um Presidente que, presumivelmente deliberando contra as suas próprias convicções sobre o que é melhor para o País, aprovou a aplicação do limite de 35 horas de trabalho semanais na função pública.
Podem surgir surpresas sem dúvida. Ou talvez não.