Um mês depois da guerra na Ucrânia ter começado, e não vendo o fim à vista, importa pensar como podemos fazer mais e melhor no processo de acolhimento de refugiados.

Foi comovente assistir à forma como a sociedade civil se mobilizou tão rapidamente e com tanta vontade para ajudar os refugiados ucranianos.

Já no sentido diametralmente oposto, foi deprimente o silêncio de um Governo que, mesmo sendo de gestão, tinha o dever e a obrigação de coordenar.  Não o fez e, como acontece sempre, o vácuo foi ocupado por organizações que, apesar de bem intencionadas, trabalharam de forma desgarrada e consequentemente desorganizada. O Governo deixou os refugiados que chegaram a Portugal à mercê da sua sorte e da boa vontade das pessoas com quem se cruzam.

Até ao momento, Portugal já recebeu mais de 20.000 pedidos de protecção temporária. O caos começa na fronteira da Ucrânia com o Espaço Schengen, porque não está implementado um sistema de registo de quem sai, e continua no acolhimento à chegada ao nosso país.

Em Portugal apesar do muito divulgado sistema “fast-track” na emissão do título de residência, NIF e NISS e de o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) ter em curso uma campanha de sensibilização contra o tráfico humano, o que aparece nas notícias não corresponde à realidade. Considerando que 80 % dos refugiados são mulheres e crianças, há que ter particular atenção às redes de prostituição, tráfico humano e pedofilia.

O SEF não está a recolher dados biométricos dos refugiados por alegada falta de capacidade e não consegue estimar o tempo de emissão do título de residência. Este problema acrescido à volatilidade do acolhimento temporário e à rapidez com que mudam de casa impede a segurança dos recém-chegados.

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Apesar de o fenómeno de refugiados ser avassalador há algumas medidas que podem ser tomadas.

O Governo português tem um papel fulcral na definição e execução das políticas de imigração e asilo e das políticas de integração. Não fazer nada como até agora é um caminho muito perigoso tanto para os refugiados como para algumas famílias de acolhimento.

É necessário dar cumprimento no terreno à execução destas polícias.

Por um lado, um trabalho em conjunto entre o Governo, as organizações não governamentais (Plataforma de apoio aos refugiados, Conselho Português para os Refugiados, União das Misericórdias, Cruz Vermelha, etc.) e a sociedade civil no mapeamento das disponibilidades de habitação, escolas, psicólogos, sensibilização e envolvimento da sociedade civil. E por outro, definir princípios a nível nacional para as entidades que vão buscar refugiados em carrinhas (muitas sem acreditação) bem como das famílias que se candidatam a acolher refugiados, no sentido de melhor avaliar as propostas por estas enviadas.

Ao contrário do que se passa, por exemplo, em Espanha e na Alemanha, em Portugal ninguém verifica o registo criminal ou o contexto financeiro de uma família de acolhimento. Resta-nos acreditar na boa vontade das famílias que recebem refugiados em casa.

Este mapeamento coordenado pelo Governo permite proporcionar um envolvimento do cidadão comum no processo de acolhimento e apoio à integração e apresentar um projecto sustentável para a vida do refugiado, que não passe por ficar num colchão insuflável na sala de estar dos portugueses.

O novo Governo tem pela frente um número crescente de imigrantes económicos e agora de refugiados que escolheram Portugal para viver e um SEF com uma reforma adiada. O inesquecível Ministro Cabrita já não está no caminho, cabe agora mostrar que reformas pretende o Governo implementar que permitam uma resposta eficaz respeitando a dignidade da pessoa humana.