Um dos âmbitos onde a pseudocultura ‘woke’ mais ataca a Igreja católica é, precisamente, na sua História. Não é, decerto, muito original, pois todos os movimentos anticristãos do passado, desde o Iluminismo até ao nazismo e ao comunismo, também procuraram desacreditar a Igreja, falsificando a sua História.

Quem o diz não é nenhum historiador católico, mas um norte-americano, Rodney Stark, que, apesar da sua formação luterana, se considerava agnóstico, embora no final da sua vida se tenha assumido como ‘cristão independente’, mas não católico.

Nascido em 1934 nos Estados Unidos da América e aí falecido em 2022, Stark doutorou-se na prestigiada Universidade de Berkeley, na qual foi investigador do Survey Research Center e do Center for the Study of Law and Society. Foi professor de Sociologia e de Religião Comparada na Universidade de Washington, presidente da Society for the Scientific Study of Religion e da Association for the Sociology of Religion. Stark e autor de mais de quarenta obras, nomeadamente A Theory of Religion, de 1987; The Rise of Christianity, de 1996; e Victory of Reason, de 2005. O Triunfo do Ocidente está traduzido para português e editado pela Bertrand.

Bearing False Witness: Debunking Centuries of Anti-Catholic History (Templeton Press, 2016) é uma das suas últimas obras. Nesse seu trabalho, Rodney Stark desmascarou, não à luz da fé, que não professava, mas da ciência histórica, o enviesamento de certas abordagens pseudo-históricas.

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Carl E. Olson, editor da Catholic World Report, entrevistou Rodney Stark sobre algumas polémicas relativas à história da Igreja católica. Eis algumas das passagens mais marcantes dessa interessante conversa:

– Neste seu livro, refere-se às “eminências intolerantes”. Quem são?

– “Uso essa expressão para me referir aos estudiosos e intelectuais ilustres que são claramente inimigos da Igreja católica e que, sobre ela, difundem falsidades históricas.”

– Como identificou os dez mitos anticatólicos a que se refere?

“Encontrei a maior parte destes mitos anticatólicos quando investigava e escrevia sobre diferentes períodos e acontecimentos históricos. Descobri que muitos destes ‘factos’, muito conhecidos, eram falsos e senti-me obrigado a investigá-los. Procedem da cultura protestante, mas também católica, porque muitos católicos, também alguns muito conhecidos, os aceitam. Muito frequentemente e durante muito tempo, os historiadores em geral deram credibilidade a estes mitos. Sobretudo os ‘laicos’, e os ex-católicos, como Karen Armstrong, adoram estes mitos.”

– O primeiro capítulo desta sua obra trata dos “pecados do antissemitismo” e é talvez o tema mais fracturante e polémico do seu livro. Por que existe a generalizada crença de que a Igreja católica é intrinsecamente antissemita?!

“Quando comecei as minhas investigações, ‘todos’, também os católicos da primeira linha, criam que a Igreja era uma das principais fontes do antissemitismo. Mas, quando comecei a investigar as perseguições medievais aos judeus, descobri o papel eficaz da Igreja na oposição e supressão dessas perseguições aos judeus. É uma verdade relatada por judeus medievais e, portanto, é, sem nenhuma dúvida, verdadeira. Por que razão muitos ‘intelectuais’, muitos dos quais ex-católicos, continuam a aceitar a ideia de que Pio XII foi o ‘Papa de Hitler’, quando isso é, claramente, uma descarada mentira?! Só pode ser por ódio à Igreja! Lembre-se de que judeus famosos defenderam a Igreja!”

– Como surgiu o mito de que a Idade Média foi uma idade das trevas?

“Voltaire e os seus companheiros criaram a ficção da noite de mil anos, ou da Idade das Trevas, para reivindicarem para si mesmos as luzes, o Iluminismo. Mas, como sabe qualquer historiador competente, ou enciclopédia decente, não houve nenhuma Idade das Trevas: pelo contrário, foi precisamente durante esses séculos que a Europa deu o grande salto cultural e tecnológico, que a situou à frente do resto do mundo.”

– Mas, que relação existe entre o mito da Idade das Trevas, ou da longa noite de mil anos, e o Iluminismo, como movimento essencialmente racional e científico?

“Os ‘filósofos’ da denominada ‘Ilustração’ não tiveram nenhum papel no desenvolvimento da ciência, porque os grandes progressos científicos da época devem-se, maioritariamente, a homens religiosos, muitos deles pertencentes ao clero católico.”

– As Cruzadas e a Inquisição, a que se atribuem milhões de vítimas, são geralmente apresentadas como expoentes da barbárie cristã. Por que razão estes mitos estão tão generalizados e são tão populares, quando há já décadas que os estudiosos se dedicaram a corrigir e a esclarecer o que realmente aconteceu (ou não aconteceu)?

“Posso assegurar que a Cruzadas foram guerras em legítima defesa e que a Inquisição não foi sangrenta. Mas não posso explicar por que razão a quase totalidade das investigações, que fundamentam estas correcções, não tiveram impacto entre os ‘intelectualóides’.”

– Ao referir-se à “modernidade protestante”, declara rotundamente que a tese de Max Weber, segundo a qual foi o protestantismo que fez surgir o capitalismo e a modernidade, é “uma estupidez”…

“A questão é simples: o capitalismo nasceu e se desenvolveu, na Europa, muitos séculos antes da Reforma protestante!”

-Afirmou categoricamente que, como estudioso com um passado protestante e professor numa universidade baptista, não escreveu “em defesa da Igreja”, mas “em defesa da História”.

“É difícil que as ‘eminências intolerantes’ me acusem de fazer o jogo da Igreja católica, ou de ocultar os seus pecados. O único interesse pessoal que tenho é o de que a História seja elaborada com honestidade.”

De facto, o grande inimigo da religião católica não é a ciência, mas a ignorância. Não se vence o preconceito ideológico, nem a falsidade histórica, com anátemas, ou falsidades em sentido contrário. Neste sentido, não é aceitável afirmar que a Inquisição não foi sangrenta, quando é sabido que recorria à tortura, muito embora a justiça civil o fosse mais ainda. Se a História há-de ser a exposição científica da verdade, por maioria de razão a História da Igreja, porque Jesus Cristo identificou-se com a verdade (Jo 14, 6; 18, 37), e afirmou que o principal inimigo de Deus e do homem é aquele que é mentiroso e pai da mentira (Jo 8, 44).