Em Portugal quando abordamos temas como quotas, paridade salarial ou igualdade género – este último é o 5.º objetivo de desenvolvimento sustentável – parece que entramos numa cápsula do tempo e somos transportados para o século passado, tal é a resistência, desvalorização e vontade de agir em relação ao assunto. As mulheres estão em maior número na sociedade portuguesa, são detentoras dos mais avançados graus de formação (licenciaturas, mestrados e doutoramentos) e na investigação prevalecem na maioria dos domínios de Investigação e Desenvolvimento (I&D), mas igualmente em áreas tradicionalmente masculinizadas, como as ciências, as tecnologias e a matemática. Apesar de todos os graus académicos e competências que detêm, parece que nunca são suficientemente qualificadas para “chegar lá”. Lá aos lugares de topo e bem remunerados.

É tudo uma questão de acesso às oportunidades. É tudo uma questão de igualdade género.

Vejamos.

1.Acerca da Lei de quotas de género 
A Lei n.º 62/2017, de 1 de agosto, estabeleceu o Regime da representação equilibrada entre mulheres e homens nos órgãos de administração e de fiscalização das entidades do setor público empresarial e das empresas cotadas em bolsa. A ideia do legislador era conseguir estabelecer um equilíbrio entre o número de mulheres e o número de homens em razão das suas competências, aptidões, experiência e qualificações legalmente exigíveis para os órgãos das entidades do setor público empresarial e as empresas cotadas em bolsa. A mesma lei refere ainda, no n.º 1 do art.º 7º que as “entidades do setor público empresarial e as empresas cotadas em bolsa” devem zelar pela igualdade de tratamento e de oportunidades entre mulheres e homens, eliminação a discriminação em função do género.

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Se não fosse necessário a adoção de leis em Portugal que impusessem quotas de género, por que razão o legislador o teria determinado? É certo que muitos não veem com bons olhos esta imposição, mas se queremos ter mulheres em cargos de decisão, este é o mecanismo eficaz. Tenhamos França e Noruega como exemplo. Em ambos os países o número de mulheres representadas nos Conselhos de Administração aumentou consideravelmente com a Lei da Paridade (e respetivas sanções): na Noruega o número de mulheres nos Conselhos de Administração passou de 3% em 2003 para 42% em 2012; e em França passou de 22% em 2012 para 37,1% em 2016. Em Portugal o número de mulheres nos Conselhos de Administração das empresas aumentou de 4% em 2003 para 14,2% em 2016, valores significativamente inferiores à média da UE-28, que é de 23,3%. Os números portugueses envergonham-nos a todos e sobretudo evidenciam forte desequilíbrio na representação de género em lugares de decisão, sendo este um dos mais baixos da Europa.

E ainda se perguntam se vale a pena lutar? Todos somos convocados a lutar pelas nossas filhas, pelas nossas netas, pelas gerações vindouras.

2.Paridade: igualdade remuneratória entre mulheres e homens por trabalho igual
A Lei n.º 60/2018, de 21 de agosto, que vigora em Portugal desde fevereiro de 2019, aprovou medidas de promoção da igualdade remuneratória entre mulheres e homens por trabalho igual ou de igual valor, prevendo, entre outros aspetos, a exigência às empresas de uma política remuneratória transparente, através de mecanismos de avaliação das componentes das funções e com base em critérios objetivos.

Recentemente ficamos a saber, segundo os dados do Eurostat, que o fosso salarial entre homens e mulheres tem aumentado consecutivamente em Portugal desde 2019. E se em 2018 as mulheres recebiam menos 8,9% que os homens, pelo mesmo trabalho, em 2022 esse o fosso salarial era de 12,5%. Ou seja, Portugal foi o país da Zona Euro que viu aumentar o gender pay entre 2019 e 2022 mas foi também aquele onde se registou o maior fosso salarial entre homens e mulheres no mesmo período. A mesma fonte revela que Portugal ocupa a 9ª posição do ranking do fosso salaril entre homens e mulheres. A este ritmo, se nada for feito para reduzir o gender pay, e se se mantiver o ritmo médio de 0,25% registado nas estatísticas da União Europeia, Portugal atingirá a paridade salarial entre homens e mulhere em 2071 (ECO). Mas estas previsões do Eurostat podem ainda sofrer ajustes decorrentes da caracterização do tecido empresarial português (empresas com menos de 10 trabalhadores).

É isto que queremos para os nossos filhos? E para os nossos netos? Com tamanha desigualdade salarial como pedir aos jovens que fiquem em Portugal?

3.Igualdade de género (5º objetivo de desenvolvimento sustentável)
A Agenda 2030 – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) define como 5ª prioridade a “Igualdade de género”. Esta tem como objetivo “Alcançar a igualddae de géneroo e empordera todoas a mulheres e rapatrigas. Acabar com todas as formas de discriminação contra todas as mulheres e meninas em todos os lugares. Eliminar todas as formas de violência contra todas as mulheres e meninas nas esferas pública e privada, incluindo tráfico, exploração sexual e outros tipos. Garantir a participação plena e efetiva das mulheres e a igualdade de oportunidades de liderança”

Percebemos a gravidade deste propósito quando o vislumbramos para sociedades desenvolvidas, mas doentes. E Portugal, não pode alcançar o progresso e desenvolvimento económico continuando a deixar de fora uma parte significativa da sua população, por sinal a mais letrada. Corrigir a sub-representação das mulheres nos processos de tomada de decisão impõe-se hoje como um requisito essencial da democracia igualitária.

Aí Portugal, as novas gerações precisam acreditar que Portugal preza a igualdade de género. Mudemos o paradigma porque a igualdade de género não é mais uma questão social ou de direitos, ela é uma estratégia fundamental para o desenvolvimento económico do país.