O mês de Julho, cujo nome remete uma homenagem a Júlio César, ilustre cônsul e ditador romano, é, para nós portugueses, o mês dos banhos de sol, das férias antecipadas e das cerejas. Tradicionalmente quente (o mais quente do ano), por conta do nosso clima mediterrânico, com incursões da brisa atlântica, é o mês que a verão, mas também a Fado, mais sabe. Presumivelmente antípodas, porque o verão dá-nos alegrias, os beijos do mar e a vontade dos gelados e das bolas de Berlim, enquanto o Fado as mágoas de um passado, as Lágrimas de um Povo e as saudades, a realidade é que Julho é o mês do verão, mas também de Amália.

A nossa maior fadista, símbolo internacional do Fado (mas também do folclore, em suma da Canção Portuguesa), é filha do mês de Julho, ou, pelo menos, era o que dizia… Se no registo sê-lhe indicavam o dia 23 como a data oficial do seu nascimento, o certo é que foi da boca da avó que teve as primeiras noções do tempo: “nasceste no tempo das cerejas”, confessou-nos Amália em várias entrevistas, que era o que a sua avó dizia. Ainda que a altura das cerejas seja de Junho até aos finais de Julho, Amália decidiu “rebatizar” o seu nascimento para o dia 1 de Julho – tornando-a uma senhora de dois aniversários (1 e 23 de Julho). Se, para o senso comum, ter duas datas não tivesse cabimento algum, para Amália era o motivo de festa, de celebração da vida e da confirmação de que as pessoas gostavam dela. De facto, mais do que Ronaldo, Eusébio ou até D. Afonso Henriques, a nossa Amália Rodrigues tornou-se parte da alma e do âmago português.

A Amália que transformou o Fado numa arte que agrada à aristocracia e ao povo; que fez franceses, espanhóis e libaneses condecorá-la com a maior das suas ordens do mérito; que foi considerada como uma das maiores cantoras do séc. XX e de todos os tempos; e que fez o pequeno Portugal ser conhecido, na realidade, era a mesma Amália que gostava de cerejas, que comia sardinhas com broa de milho nos Santos Populares e que pintava flores na sua herdade no Brejão. Se, por um lado, Amália é a figura maior da Canção e da ilustre alma lusitana, por outro, era a mais portuguesa das portuguesas.

Neste ano, celebram-se os 104 anos do nascimento de Amália Rodrigues. Celebram-se, também, os 25 anos do seu desaparecimento, que nos tornou a todos órfãos. Não obstante, é a ausência mais presente na nossa vida e no nosso quotidiano. É a artista que deu sentido à palavra saudade e ternura à palavra solidão. Foi aquela que nos deu mundos quando mais nada havia por conquistar. Amália, o nome de povo, a voz dos poetas e, para sempre, a “menina” das cerejas.

Ainda que muitas vezes dizia que tinha medo que as pessoas a esquecessem e não gostassem dela, somos muitos, mais uma vez, a dizer: “Parabéns, Amália!”.

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