A proposta de introduzir listas transnacionais nas eleições para o Parlamento Europeu tem sido objecto de intenso debate. Embora o Parlamento Europeu tenha aprovado a iniciativa em Maio de 2022 (323 votos a favor e 262 contra), o Conselho Europeu manifestou resistência significativa, com cerca de 13 Estados-Membros a oporem-se à medida e 6 Estados-Membros a manifestarem reservas.

Esta oposição reflecte preocupações profundas sobre a representatividade e a soberania dos Estados-Membros, especialmente dos países de menor dimensão, como Portugal. E apesar desta resistência por parte dos Estados-Membros, algumas forças políticas no Parlamento Europeu estão tentadas a reabrir o debate sobre as listas transnacionais.

O que são, afinal, as listas transnacionais? As listas transnacionais são uma proposta para as eleições europeias em que os eleitores de todos os países da União Europeia votariam em candidatos de uma única lista comum a toda a Europa, em vez de listas nacionais.

Esta proposta parece querer transformar a União Europeia numa central de comandos distante, onde os cidadãos só assistem de longe.

Em primeiro lugar, as listas transnacionais violam o princípio da subsidiariedade previsto no artigo 5.º do Tratado da União Europeia. De forma centralizadora, afastam as decisões políticas dos cidadãos e promovem uma lógica de imposição de cima para baixo, enfraquecendo o equilíbrio entre os diferentes níveis de governação.

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Em segundo lugar, a introdução destas listas criaria uma dualidade inaceitável no Parlamento Europeu: eurodeputados de primeira classe, eleitos por listas transnacionais, e os restantes, representantes das listas nacionais. Este sistema não só prejudica os países de menor dimensão, como institucionaliza um desequilíbrio de poder. Como é possível que os grandes Estados-Membros rejeitem este modelo nos seus próprios sistemas internos, mas o imponham à União? A Alemanha, por exemplo, enquanto Estado federal, nunca aceitaria que um berlinense da CDU determinasse os candidatos bávaros da CSU. Então, porque é que o mesmo princípio não se aplica à UE?  Pode a União Europeia, que não é um Estado Federal, adoptar um modelo de representatividade que nem as federações aceitam?

Em terceiro lugar, as listas transnacionais têm um grande potencial para amplificar movimentos extremistas. Enquanto poucos portugueses conhecem o líder dos socialistas europeus, figuras como Marine Le Pen têm ampla notoriedade. Numa campanha europeia centrada em personalidades de listas transnacionais, os eleitores poderiam ser seduzidos por discursos populistas que pouco reflectem os valores democráticos que a União pretende promover. Um risco real para a estabilidade política da União Europeia.

Em quarto lugar, as listas transnacionais podem resultar na eleição de representantes que não têm ligação directa com os eleitores de um determinado país, comprometendo a capacidade dos cidadãos de eleger candidatos que compreendam e defendam os seus interesses específicos. Esta desconexão enfraquece a legitimidade democrática e aumenta o sentimento de alienação em relação às instituições europeias.

Em quinto lugar, a criação de listas transnacionais reforça o poder dos partidos políticos europeus, que passariam a ter maior controlo relativamente à selecção dos candidatos, em detrimento dos partidos nacionais. Esta centralização pode afastar ainda mais os cidadãos das decisões políticas, agravando o défice democrático na União Europeia.

Perguntas que merecem resposta: Como assegurar que os eurodeputados eleitos por listas transnacionais serão responsáveis perante os cidadãos que os elegem? Como seriam regulados os seus mandatos?

Para Portugal, a introdução de listas transnacionais é intolerável e prejudicial. A implementação das referidas listas tende a favorecer partidos e candidatos de Estados-Membros maiores, que dispõem de mais recursos e visibilidade. Isto pode levar a uma sub-representação dos países menores, como Portugal, no Parlamento Europeu, desequilibrando a balança de poder dentro da União Europeia. Implicaria que os lugares actualmente atribuídos a representantes eleitos directamente por círculos nacionais ou regionais sejam ocupados por candidatos de listas pan-europeias.

A introdução de listas transnacionais é uma construção artificial que não reflecte a realidade política e cultural da Europa. A União Europeia é composta por uma diversidade de Estados-Membros, cada um com a sua identidade, cultura e sistema político. Impor uma estrutura eleitoral que desconsidera estas diferenças, cria uma sensação de imposição externa e aumenta o cepticismo em relação ao projecto europeu.

O debate sobre a reforma eleitoral da UE, no qual se inclui a criação desta lista transnacional, terá início no Parlamento Europeu. Como relatora do PPE, o CDS não defenderá uma democracia de fachada, construída sobre artificialismos que comprometem a legitimidade política. As listas pan-europeias são uma solução artificial para problemas que não resolvem e, pior ainda, criam novos. Para países como Portugal, representam uma ameaça directa à soberania, à representatividade e ao equilíbrio democrático. A sua rejeição não é apenas lógica; é uma defesa fundamental dos valores europeus e nacionais.

Afinal, é curioso como, em nome da unidade europeia, se propõe uma ideia que uniformiza apenas a aparência, enquanto corrói a essência. Democracia à distância é uma ilusão política e uma contradição em termos que Portugal não pode aceitar.