Nas últimas duas décadas temos vindo a assistir a um acentuado declínio dos padrões éticos no domínio da política local. Esse declínio tem vindo a coincidir com uma série de escândalos associados a comportamentos que não estão de acordo com os valores sobre os quais deve assentar o exercício do poder , conferido democraticamente através do acto eleitoral para as autarquias locais.
Os supra referidos comportamentos prejudicam não só a integridade reputacional dos envolvidos como também minam as instituições onde estes exercem as suas funções, acabando por prejudicar os territórios e a população que neles reside. A ignomínia que lhes está associada acaba por gerar um enfraquecimento da legitimidade democrática que lhes deveria ser inerente, quer para o exercício das funções para as quais foram mandatados, quer para outras funções que possam, eventualmente, almejar poder vir a ocupar no futuro. A indignidade com que, alegadamente, parecem estar impregnados gera uma crescente diminuição da confiança por parte dos cidadãos, tantas vezes difícil de reverter.
Mas afinal que comportamentos reprováveis são esses?
Os mais comuns talvez sejam os que se relacionam com corrupção, peculato e tráfico de influências. Ou seja, crimes que implicam o desvio ou uso abusivo de dinheiros públicos, a aceitação, recebimento ou promessa de vantagens, patrimoniais ou não patrimoniais, consideradas indevidas e levadas a efeito ao arrepio da Lei.
Estes comportamentos para além de se consubstanciarem como crimes são também uma desonra no que respeita ao contrato social estabelecido entre cidadãos e esses detentores de cargos políticos, contrato social esse formalizado pela delegação de poder que é levada a efeito através do voto.
Dirão muitos que a prática destes crimes, bem como a falta de ética, no exercício de funções políticas pode facilmente ser corrigida e sancionada, se não pela justiça, através de conveniente punição eleitoral.
No entanto, isso nem sempre se verifica.
Existem situações em que, apesar de existirem fortes evidências da prática reiterada de múltiplos crimes, falta de ética e outros grotescos comportamentos associados, tal não se consubstancia necessariamente numa punição em tempo útil para o suposto perpetrador, nem tão pouco no seu efectivo afastamento por via de sufrágio.
E porquê?
Porque a par de mecanismos judiciais lentos e complexos, que adiam indefinidamente a punição destes indivíduos, tende ainda a prevalecer na ideia, de uma parte significativa da população pouco informada e facilmente manipulável, de que “pode ser corrupto mas fez obra”. É como se reprováveis comportamentos de agentes políticos pudessem, de alguma forma, justificar-se pelo aparecimento de algo que surgiu para suposto beneficio do território ou das suas gentes, mas que, em larga medida, pode ter prejudicado, muito mais do que se pode pensar, esse mesmo território e essas mesmas gentes.
Mas é assim que nascem os chamados “lobos em pele de cordeiro”.
Políticos cuja astucidade reside unicamente na arte de enganar os munícipes através de uma aparente civilidade e honra, mas cuja decência e honestidade são praticamente inexistentes.
Políticos que são mestres no exercício constante de maleabilidade e de normalização de má conduta, com o propósito único de a todo o custo escamotear o lado negativo dos seus comportamentos moralmente questionáveis.
Políticos embrenhados em constante negação de responsabilidades e menorização dos efeitos reais dos seus actos.
Políticos que são hábeis em relativizar a ética.
Políticos de negócios, que veem o exercício de cargos públicos como uma oportunidade para servir clientelismos político partidários, que veem a política despida de ideologia e valores mas vestida de poder e facilitismo para realização de negócios em prol dos próprios e não do bem comum.
Políticos que se servem das instituições como instrumento para a prossecução dos seus próprios interesses, ao mesmo tempo que o ónus dos riscos e custos dessas decisões são transferidas para os contribuintes, muitas das vezes sem o conveniente conhecimento destes.
A ética política praticada em democracia depende em larga medida da relação existente entre os cidadãos e os seus representantes políticos. Urge que se implementem mais mecanismos de regulação da ética política por forma a impedir a proliferação de condutas impróprias de certa e determinada estirpe de políticos. Urge que os cidadãos se interessem mais pela actividade desenvolvida pelos executivos municipais, que se interessem mais acerca do rumo inerente às politicas de âmbito local pois são estas que determinam, em larga medida, o país que temos e a generalidade da qualidade de vida das pessoas. É imperioso que os munícipes saibam detectar “lobos em pele de cordeiro”, não se deixando enganar por engodos superficiais e falsas empatias , unicamente engendrados para acautelar votos e permanência em posições de poder para proveito próprio.