A transferência de Macau para a tutela da China em 1999 gerou grandes expectativas entretanto frustradas. O slogan “Um País, Dois Sistemas” que foi “vendido’ às autoridades portuguesa como boa solução para resolver a questão de Macau revelou-se um equívoco. Não há nem houve um segundo sistema, apenas um: socialista na constituição, monolítico no poder político, capitalista de Estado em termos económicos. Ao invés do que se aventou os novos líderes de Macau não querem autonomia, querem integração e osmose com o regime do continente.
A comunidade portuguesa não chega em Macau, presentemente, a 3000 pessoas em 700 000, população aproximada da Região Administrativa. Portugal desliga-se do que ali se passa como sempre o fez. Antes de 1999 dizia-se que Macau estava muito longe. Apenas era relevante quando algum escândalo rebentava num jornal de Lisboa. Os jornalistas de Lisboa impacientavam-se e queriam saber pormenores. 1999 foi como que uma porta que se fechou, como se 442 anos de presença portuguesa não tivessem qualquer significado. A causa não é exclusiva do governo português mas respeita a questões sociológicas.
Os locais, os macaenses, são o fruto da miscigenação étnica que marca a história do Império português no Oriente e por razões de sobrevivência adaptaram-se. Primeiro quando Portugal governava em razão de falarem o cantonês mediavam entre Portugal e o poder chinês alavancando nisso a sua relevância política e social. Com a plena transferência de poderes para a China em 1999, adaptaram-se como minoria nacional entre as 56 que existem no país. Durante algum tempo a China permitiu que um deles fosse secretário do governo da Região Administrativa Especial mas isso já não acontece com o governo liderado por Sam Hou Fai, o jurista que foi presidente do Tribunal de Última Instância.
De certa forma todos estes desenvolvimento eram previsíveis Macau esteve e estará sempre ligado ao caminho que a China fizer e aos seus sucessos e sobressaltos. Não há facilidades num mundo global e conflituante com linhas de crispação a multiplicarem-se aqui e ali. Hoje fala-se em declínio do Ocidente mas a China depende, das suas ligações ao Ocidente – Estados Unidos e Europa – para que a sua economia continue a prosperar.
A mudança geracional é incontornável e com ela as referências prevalecentes desaparecem. Não faltará muito tempo que a memória do movimento de 4 de Junho de 1989 se esfume. As novas gerações olham para esses eventos com o mesmo sentido de passado que vêm na luta de “libertação nacional” ou na Grande Marcha em Frente.
A geração da “abertura ao exterior” envelheceu ou já desapareceu. O secretário-geral Xi Jinping tem hoje 71 anos, um ano menos que Putin e sete menos que Trump. As marcas da idade já se notam na prudência das palavras, no calculismo, no jogo dos equilíbrios da política externa chinesa. Mantém uma relação próxima com Putin mas sabe que não pode ser um seu aliado incondicional sob pena de isolar o seu país na comunidade internacional.
Os desafios do novo governo da Região Administrativa Especial que agora inicia funções são: manter a continuidade do alinhamento com Pequim, evitar a instabilidade social, assegurar o bem-estar colectivo da população que metade é mais jovem e a outra metade mais velha. A mediana andará pelos 38,4 anos.
Portugal tomou o projecto europeu como sua prioridade e as declarações de Rebelo de Sousa no 25.o aniversário da transferência de soberania do pequeno enclave foram de pura circunstância. Macau foi a última possessão do Império que assumiu um caminho próprio sem sobressaltos e de forma tranquila.
Quanto às relações externas entre Portugal e a República da China as estatísticas revelam uma regressão de importância em termos de comércio bilateral e do investimento. A China é 0 10.o parceiro comercial de Portugal com as trocas comerciais entre os dois países em 2023 totalizando cerca 7,92 mil milhões de euros, com Portugal a importar da China mercadorias no valor de 5,27 mil milhões de euros e a exportar 2,65 mil milhões de euros. Portugal não se encontra entre os 15 principais parceiros comerciais da China. Mesmo as visitas diplomáticas de parte a parte perderam significado. A ultima vez que Xi Jinping esteve em Portugal foi em 2018. Rebelo de Sousa esteve na China pela ultima vez em Dezembro de 2019.
Portugal e a China reconduzem-se aos respectivos espaços de integração regional.