Esta é a história de uma mãe alienada (nome fictício Anamar), que tem sido impedida com a filha, no período de Natal, há muitos anos. Pertence às histórias de famílias de pais e mães que, após o divórcio ou separação, não protegem os filhos dos conflitos conjugais e parentais e da desorganização familiar, esquecendo a necessidade de garantirem que os filhos tenham o afeto e a segurança de ambos os pais.
O divórcio conflituoso é destrutivo. O envolvimento dos filhos nos conflitos destrutivos entre o pai e a mãe (intraparental), as duas pessoas que eles mais amam no mundo, origina um enorme sofrimento e pode comprometer a sua saúde mental e o seu desenvolvimento a vários níveis.
Esta mãe partilha a dor da ausência forçada de uma filha alienada: “Natal é família, é encontro e reencontro. Entre tantos desafios da vida, este é um dos que mais toma espaço para a dor. Sendo que o Natal sem a minha filha é um Natal de todos os dias em dor. Em ferida. É um pinheiro – corpo – iluminado por luzes de sangue – feridas”.
Todos os filhos de pais divorciados ou separados deviam ter duas casas (que são espaços de afetos) e ter o Natal em casa da mãe e o Natal em casa do pai. Isso não significa que passem a ter duas famílias. A sua família é, e será sempre, apenas uma, na medida em que as relações familiares parentais ficarão sempre para além da separação ou divórcio e ultrapassam os limites físicos das casas. Como testemunhou a Anamare: “Este Natal é um de tantos outros. Onde não posso estar com a minha filha. Nos lugares de afetos, no espaço casa, lar. Em momentos de construção de Ser família”.
Nas famílias em que os pais estão separados ou divorciados, não é apenas a separação ou o divórcio que acarreta sofrimento na criança ou adolescente, mas também o conflito existente entre os pais.
A ausência dos filhos no período do Natal, vítimas de pais alienadores, é um dos maiores desafios que os pais alienados enfrentam nesta época festiva, em que tudo parece existir para lembrar a ausência dos filhos. Para estes pais, o Natal é, sem dúvida, um momento de tristeza, em que reunião de toda a família e amigos acentua o sofrimento da falta dos filhos ausentes. Restam apenas as memórias de Natais anteriores passados em família, como nos partilhou a Anamare: “Numa família onde sempre se fazia Natal – juntos, e subitamente, retirou-se essa vontade”.
Anamare descreveu-nos a vivência do sentimento de injustiça pela falsidade dos argumentos que provocam o afastamento da filha em relação à mãe alienada: “Acrescentou-se outra falsa verdade alienada, baseada numa injustiça direcionada para provocar um real afastamento de filha e mãe”.
No Natal, é importante encontrar a família. Mas o Natal de Anamare é de desencontros dos afetos, em espaços diferentes, a que se procura sobreviver, mas com dor, como contou a Anamare: “A minha filha continua, e a mãe continua, ambas continuam em espaços – outros – de Natal”.
Anamare sabe que existe um enorme desejo recíproco de reencontro de mãe e filha que não é satisfeito: “Mas o Natal que ambas queremos é o Natal em nossa Casa”. A mãe e a filha, imaginaram e planearam juntas um Natal em casa. Mas o sentimento de lealdade ao pai, por força da alienação da filha, impediu a sua realização e a filha não pôde estar com a mãe: “E ainda, terei que estar a fazer Natal sem que possa Ser o Natal em nossa Casa. Aliás foi aí que ficamos no primeiro momento que a minha filha pediu o Natal em nossa Casa. Prontas iniciámos esse Natal que ainda não aconteceu. Um Natal interrompido, intermitente (como as luzes da árvore)”.
No processo de alienação parental, frequentemente, as crianças e adolescentes experienciam conflitos de lealdade e crescem com culpa, sentindo que, ao desejar aproximar-se do pai/mãe alienado, estão a trair o alienador. Crescem, por isso, com muito medo de perder um dos pais. Anamare descreveu-nos este dilema: “A minha filha não vem a casa. A minha filha quer vir a casa. A minha filha não vem a casa. O comportamento da minha filha de lealdade ao seu pai, na complexidade de que pode não estar com a mãe e na casa da mãe, afastou e alargou o espaço do vazio”.
Anamare reportou a tristeza do vazio, o frio da ausência, num Natal sem filha e na impotência de não ter forma para a libertar das amarras do conflito de lealdade ao pai alienador: “Este espaço é uma paisagem de gelo que sinto no Natal interior. Triste. Seco. Molhado de lágrimas e angústia. Esta é a paisagem que sinto de não conseguir libertar a minha filha de um enredo que não é o seu”.
Finalizamos com a mensagem de esperança de Anamare, dirigindo-a a todos os pais, mães, filhas e filhos, vítimas de alienação, que este Natal não terão a felicidade de estar juntos. O desejo é de que encontrem alternativas para ultrapassar os seus conflitos, porque todas as crianças e adolescentes precisam e têm o direito de ter um pai e uma mãe presentes no seu dia a dia, e, por isso também no Natal: “E eu, mãe, vivo todos estes Natais na esperança que seja o último Natal sem a minha filha”.