Caríssimos leitores, já faz algum tempo desde o desaparecimento do ex-presidente da Comissão Europeia, o grande Jacques Delors. A vida universitária e do trabalho nem sempre é fácil, mas era um imperativo dedicar um tempinho para homenagear um senhor desta envergadura política e humana, como foi Jacques Delors.
A minha veia puramente democrática e a minha ausência de “palas” (que muito estão em voga neste mundo atual) permite-me valorizar e engrandecer o trabalho de todos aqueles que, em minha opinião, discordam ou não pensam exatamente igual a mim a nível ideológico, como é o caso deste senhor. Contudo, a nossa visão da arquitetura da União Europeia tem as suas semelhanças e o trabalho notável desta figura, tal como mencionei, deve ser valorizado e – também no que concerne à sua postura e forma de estar na política – no que toca à minha pessoa, trata-se de uma inspiração.
Dito por quem privou com ele, tratava-se de um exímio negociador e de uma pessoa que procurava, acima de tudo, construir pontes políticas e unir todos, sobretudo os moderados e ponderados, em prol das medidas que considerava de importância maior para o futuro dos cidadãos da UE e para o futuro da UE por assim dita ao nível político. Digamos que era o arquétipo daquilo que é a minha visão e forma de estar na vida política: ultrapassar sectarismos para resolver os problemas das pessoas. Isso sim, é o verdadeiro significado de se estar em pleno na vida pública. Mas claro, é apenas a minha opinião e só a mim se vincula. Por vezes podemos até não ter uma relação boa com certa pessoa ou não termos nenhuma afinidade ideológica, mas os problemas de solução pragmática são supremos a essas questões e, muitas vezes, quando é a democracia em jogo, essas diferenças são passíveis de serem colocadas de parte em prol do bem maior. Obviamente, sem nunca descorarmos os nossos princípios e idiossincrasias.
Jacques Delors, para além dos princípios ora mencionados pelos quais primava, ficará sempre conhecido como o grande líder do “Comité Delors”, liderado pelo próprio e constituído por todos os Governadores de bancos centrais dos Estados Membros. Este, visava propor fases concretas conducentes a uma união económica e monetária europeia. No fim do mandato, tudo isso culminou com a realização do “Relatório Delors” que preconizava três fases para a realização da União Económica e Monetária (UEM) e contribuiu para o desenvolvimento do processo de unificação monetária e económica.
Para além dos seus esforços gigantescos de aprofundamento da integração europeia (e que muito defendera Portugal, diga-se), a ele devemos também a promoção do Mercado Único, que tinha como finalidade eliminar as barreiras comerciais e promover a livre circulação de bens, serviços, pessoas e capitais entre os Estados membros da UE.
Para além de impulsionador dos fundos de coesão que muito ajudaram já Portugal, falo, por fim, do seu papel preponderante que conduziu à implementação do Tratado de Maastricht (fundador da UE como a conhecemos hoje). O mesmo, sem entrar em muitos pormenores, para além do que frisei sobre ser fundador da UE como a conhecemos, implementou os pilares da União (que incidiam sobre a cooperação política e económica; sobre a PESC; e a cooperação na justiça e assuntos internos, que eram lacunas graves na altura); criou a cidadania da união; fortaleceu – com a PESC – as respostas às questões prementes da segurança e defesa no seio da união e fez incluir a carta dos direitos fundamentais. A sua magistratura de influência e cordialidade enquanto Presidente da Comissão, foi imprescindível para os sucessos dos anos 80 e 90, sobretudo no que a Maastricht e à UEM diz respeito.
Em suma, é desta classe e postura política que necessitamos de resgatar para a nova geração política. Uma postura que não se deixa intimidar pelas conjunturas políticas adversas e procura consensos quando os mesmos são imperativos de serem encontrados para a manutenção do chão comum, que é a democracia e os valores europeus da paz e da prosperidade. A postura de Jacques Delors não pode ser confundida nem distorcida com uma forma quixostesca, ou seja, uma forma nobre e altruísta mas ingénua e sem eficácia. Não, nada disso. É o oposto, é uma forma altruísta sim, mas com resultados práticos e habilidade honesta.
Por tudo isto, Merci, Monsieur Delors!