Nos últimos meses e anos abrimos as notícias em Portugal e verificamos que o mérito e o esforço dos portugueses não é devidamente recompensado, sendo substituído por outras dimensões menos dignas, que deixam jovens até aos 34 anos e outros da geração anterior desiludidos e sem hipóteses de progressão na carreira, após anos e anos de trabalho bem sucedido.
Os portugueses desiludem-se, quando se começa a verificar que, na instituição mais importante do país – Governo – temos secretários de Estado e ministros a demitirem-se, depois do jornalismo de investigação do Correio da Manhã, da CNN e outros agentes noticiosos colocarem à vista da população um rol de desiguladades e de acções menos dignas à vista. De tal maneira que o mérito não é premiado, que o governo PS já está a ter dificuldades hercúleas em recrutar um secretário de Estado da Agricultura, com currículo limpo e impoluto.
Vemos pessoas dignas, com currículo a querer afastar-se da missão nobre de representar o seu país, pois o mérito não é premiado e a associação a certos cargos faz com que, em vez de ser currículo, passe a ser um potencial “cadastro” na carreira.
Pior ainda, nos últimos anos, o PS e o seu Governo têm dado um excelente exemplo de como o cartão partidário e a ausência de mérito são premiados, face a jovens adultos e pessoas experientes com currículo e experiência profissional.Foi assim em 2016, com o Pedro Anastácio, de 22 anos, contratado na época por 3500€ brutos para ir para assessor do secretário de Estado da Presidência, ainda a acabar o Mestrado na Faculdade de Direito de Lisboa e quase sem experiência profissional. Mais recentemente, foi o caso gritante do assessor Tiago Cunha, de 21 anos, acabado de sair da Licenciatura Bolonha (3 anos), para ir ganhar quase 4000€ brutos mensais, respondendo à ministra Mariana Vieira da Silva. Se não fosse a TVI e a investigação da jornalista Sandra Felgueiras a denunciar este caso, passava pela frente dos portugueses, como se nada fosse…
Pergunto-me quantos jovens entre os 21 e os 35 euros ganham estes ordenados, em Portugal. Muito poucos (menos de 1%), pois segundo o Livro Branco, em 2019, o salário médio de um jovem mestre, com idades entre 25 e 34 anos, era de 1.617,16 euros, enquanto o de um licenciado se fixava 1.326,76 euros.
Depois, na cabeça de muitos jovens diplomados, vem a pergunta que faz o título: Onde anda o mérito em Portugal?! Ainda no outro dia, essa questão foi feita pela jornalista Diana Duarte à cronista Adriana Cardoso, no podcast “A Minha Geração”, com uma resposta paradigmática do estado do país e que aconselho a irem ouvir.
A resposta não é assim tão simples: vem em empresas cujo funcionamento permita progressão e incentivos, que permitam combater o esbulho fiscal que é perpretado pelos vários governos. E, aí, vem o exemplo de Miguel Sousa Tavares, do ordenado de 2700€ brutos… que, depois de impostos, representa 1707€ líquidos mensais. Quase 1000 euros perdidos em impostos, que depois não são recompensados na qualidade de transportes, saúde e outros serviços públicos.
Logo, qualquer empresa em Portugal não é incentivada, de forma natural, pelo Estado, a fazer progredir os seus trabalhadores pelo mérito, pois quando o faz em benefícios, é também perseguida pelo Ministério das Finanças, a nível fiscal.
Temos o exemplo da maior empresa do país – Estado, em que até os próprios metem quotas na progressão das carreiras e mudança de escalões salariais na Enfermagem, na Medicina e no Ensino. No caso dos professores, há quotas nas notas de avaliação. Se um professor é Muito Bom ou Excelente, arrisca-se a ter apenas Bom no final, porque há número limitado de notas a atribuir para uma escola. Se o Estado não cria justiça social nas carreiras, obrigando a longas greves, como a que vemos nos professores, como poderemos querer um país que premeie o esforço e o mérito?
Logo, Portugal tem um problema endémico: não consegue estruturar o país de modo a que a meritocracia seja premiada naturalmente, como se fazia no tempo dos nossos pais e avós.
Por exemplo, o meu avô, que veio da Beira Alta e que só tinha a 4ª classe, por força do trabalho e por mérito, chegou a Chefe de Tesouraria, alguns bons anos antes da reforma, de uma Companhia de Seguros de referência, em Portugal. A minha mãe tirou curso superior, foi progredindo, até que vieram os congelamentos de carreira… logo, foi a primeira geração que começou a sofrer da falta de reconhecimento do mérito do trabalho desenvolvido, por motivos económicos.
Agora, a minha geração e as seguintes vêm que Portugal não consegue reconhecer a riqueza das formações técnicas, académicas e profissionais, ficando desiludidos porque se ganha mal, mal se progride na carreira, o custo de vida é caro e depois trabalha-se muito para receber muito pouco.
Logo, os governos têm que dar o exemplo e incentivar a progressão na carreira dos seus funcionários, de forma decente, bem como criar alívios fiscais para empresas privadas que promovam a evolução por mérito e tempo de serviço para que seja um win-win: funcionários mais motivados, empresas mais produtivas e mais receitas no final do ano.
Se nada for feito, aumenta a desilusão dos jovens, que deixarão de acreditar na meritocracia e na importância do mérito no dia a dia, bem como a emigração qualificada irá aumentar, pois o salário emocional (salário monetário e condições de carreira) no estrangeiro é bem superior ao de ter um país com sol, boas praias e boa gastronomia.
Seja PS, PSD ou qualquer outra força política, promovam a contratação de gente especializada e capaz, sem ser por cartão partidário ou eventual pagamento de eventuais favores de campanhas. Só assim se melhora a transparência dos órgãos e se faz acreditar que o Estado pode ser uma instituição capaz de dar o exemplo.
Senão, arriscamos a que, num futuro próximo, apareçam visões que aproximem o funcionamento do Estado Português à Camorra, fazendo com que este país se torne apenas num entreposto de entrada na Europa para extracomunitários, bem como destino de férias para certos reformados europeus e não seja, também, ,para pessoas locais que trabalhem e busquem o mérito por via do esforço legítimo e honesto.
É caso para pensar: onde anda o mérito e a meritocracia, em Portugal?