No dia 8 de Novembro no debate sobre o OE2023 Ministro da Saúde defendeu a hipótese de Unidades de Saúde Familiar de Modelo C para minimizar o problema dos utentes sem médico e mostrou-se espantado com a agressividade do BE e disse: “Num período transitório, em que há falta de médicos de família para resolver o problema de algumas comunidades, claro que eu equaciono a possibilidade do modelo C”.

(Nota: USFs de Modelo C, previstas na lei de Correia de Campos de 2007, são unidades de Médicos de Família e Enfermeiros de Família, privados, com contrato/convenção social com o SNS. O que permitira recorrer a médicos de família aposentados, a MFs que estão fora do SNS e ainda àqueles que não querem continuar neste modelo de SNS e que se preparam para sair; e atualmente é a única forma de cumprir o dever constitucional de garantir a todos os portugueses o acesso à Saúde).

Contudo, no dia 15 de Novembro, o grupo Parlamentar do PS chumbou a hipótese de incluir no OE 2023 USFs de Modelo C, mesmo que em regime de experiência piloto como propuseram o PSD e a IL.

Por outro lado aprovou um orçamento para o SNS em que o previsto para o financiamento não chega sequer para cobrir os aumentos decorrentes da inflação conforme o salienta o comentário à proposta de OE2023 do Observatório da despesa em Saúde da Universidade Nova-SBE.

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Ou seja, por um lado, a bancada do PS, onde se senta a ex-ministra Marta Temido, desautorizou o ministro da Saúde e retirou-lhe o único instrumento de que dispunha para menorizar a falta de Médicos de Família; e por outro lado diminui-lhe do dinheiro para o funcionamento da Saúde.

Sem instrumentos e sem dinheiro o Ministro não pode fazer nada!  Não tem com rever as tabelas salariais dos médicos, não tem como lhes pagar a dedicação plena, não tem como pagar novos Modelos Bs (que estão excluídos do OE 2023)… Vai servir de alvo para o tiro ao boneco por cada má notícia que apareça sobre o SNS. Por isso eu digo que o Ministro, no orçamento de Estado para a Saúde 2023, foi duplamente assassinado pela bancada do PS.

Vai ser sempre a piorar. E não basta dizer como disse o Ministro, que são problemas crónicos. Porque a natureza das doenças crónicas é irem sempre piorando.

Eu sou do tempo em que os médicos acordaram com a ministra Leonor Beleza as 42 horas com exclusividade, que eram bem pagas e levaram os Médicos a fixarem-se no SNS. Isso acabou nos governos do PS restando para quem entrava as 35 horas simples, sem exclusividade e muito mal pagas. Em 2012, os sindicatos acordaram o aumento das 35 horas semanais para as 40 e o aumento de utentes por médico de família, mas sem o subsídio de exclusividade. Os médicos ficaram a perder. Esse acordo, que era uma medida pontual durante o período de crise, tem dez anos e até agora não foi revisto. Portanto, o Governo é o responsável pela atual crise do SNS, pois continua a manter os médicos mal pagos… Em Lisboa, um médico que entre como especialista recebe 1.600 euros líquidos. Vai quase tudo para pagar a casa. Isto leva a que haja falta de médicos.

Sou do tempo em que havia SAPs-Serviço de Atendimento Permanente, nos cuidados de saúde primários, abertos das 8h00 às 00h00 (ou 24 hs) onde os utentes que não precisavam de cuidados hospitalares sabiam se dirigir. Tudo isso acabou.

E por isto agora a falta de médicos, a saga das filas à porta dos centros de saúde para uma vaga no dia, e as urgências hospitalares entupidas… estamos claramente a piorar, não a melhorar

E o parlamento recusou ao Ministro qualquer instrumento para dar a volta à situação. E por isso eu digo que o Ministro já foi assassinado.

A má notícia de hoje é que há mais 150 000 utentes sem médico de família do que no mês passado. São agora 1.456.369 no País , dos quais 933.555 na ARSLVT. (Mais de 150.000 em Lisboa, 136.000 na Margem Sul, 121.000 em Sintra, 96.000 em Loures- Odivelas, 58.000 na Amadora, 38.000 em Cascais…)

E a pergunta que fica: a bancada do PS recusa o Modelo C por esquerdismo bacoco, cedendo ao bulling da Catarina Martins (BE), ou esconde-se na ideologia quando o problema real é não quererem gastar dinheiro? Austeridade, portanto. E escondida e sacrificando a saúde dos portugueses.

O mesmo que quando cedem ao esquerdismo do BE na cobrança de mais impostos. Cedência ideológica ou mais receita fiscal para alimentarem o Estado e a corrupção como se viu em Caminha?

Porque era muito fácil responder à Catarina Martins, pois em Inglaterra nunca houve qualquer privatização dos Cuidados de Saúde Primários, pela simples razão que eles sempre foram privados, embora pagos pelo Estado. As suas “Pratice” sempre foram Modelos C!

Fui pioneiro ao criar e coordenar a primeira USF em Lisboa no ano 2000, na altura em regime experimental. Da avaliação comparativa com o modelo tradicional claramente positiva (e das outras 18 USFS-Regime Remuneratório Experimental existentes no País) resultou a Reforma de Correia de Campos de 2007 e o Modelo B de que também fui pioneiro. Agora recém aposentado do SNS, estou a criar um centro de saúde privado no Lumiar. Como o ministro mostrou aquela abertura, e porque prefiro atuar num enquadramento social abrangente e o Modelo C é aquele que sempre defendi, na semana seguinte direcionei uma carta ao Ministério da Saúde a indicar que me disponibilizava para candidatar a minha Unidade a um Modelo C que cobriria dez mil utentes, sendo que no Lumiar há mais de 17.000 utentes sem médico de família. Não recebi qualquer resposta e na semana passada surgiu a notícia de que o Parlamento tinha chumbado o Modelo C

A Constituição obriga o Governo a dar médicos de família às pessoas. Quando o Estado não consegue cumprir esta necessidade tem que contratualizar com o setor privado. Está na Constituição, está na lei de bases da saúde, está no estatuto do SNS e nas competências do seu “CEO”. Portanto, é algo que está previsto na lei.

Mas em termos de “negócio” o sector privado só tem a agradecer a este governo socialista pelo fluxo de utentes “privados” que lhe está a gerar a falta de resposta do SNS

Em Portugal não há falta de Médicos de Família há sim falta de Médicos de Família no SNS. Contudo na Comissão Parlamentar da Saúde o Ministro, em resposta a Joana Mortágua (BE) que  insistia que “é melhor não o fazer”, o ministro avisou que “pior, pior é deixar as pessoas sem atendimento”. 

Mas porque não o disse à sua bancada parlamentar na discussão do OE? Como o pode fazer e pagar quando no OE 2023 foi chumbado? Com um milhão e quatrocentos e cinquenta e sete mil utentes sem médico de família, número que sabe que provavelmente irá aumentar até aos 2 milhões, o que falta até se decidir? Quantas manifestações e reportagens das TVs serão precisas?

Agora a única alternativa que dispõe para não deixar 2 milhões de utentes desprotegidos no acesso à saúde, se o Governo se importa realmente com a saúde dos que não têm médico de família, é a que eu referi aqui, permitir que a estes, sempre que recorram a um médico de Família privado, este lhes possa requisitar exames complementares de diagnóstico pelo SNS (como acontece com as receitas de medicamentos), referenciar para as consultas hospitalares no SNS e passar baixas por doença.

E igualmente àqueles que voluntariamente optem por ter um Médico de Família Privado (e muita gente o tem), deixando o lugar vago para quem precisa e não tem médico de família no SNS. Porque o problema não é a falta de médicos de família, é a sua falta no SNS. E enquanto muitos têm um MF em duplicado, um no SNS e outro no Privado, muitos outros nem num lado nem noutro. O Modelo C e o facilitar um opting outvoluntário sem perda dos outros direitos na Saúde e no SNS, é a única forma de diminuir o número de utentes sem médico nos próximos 5 anos.

O que vai fazer o senhor Ministro?