Sem direito a feriado, mas com sessão solene comemorativa no Parlamento, o 25 de novembro ganhou, finalmente, um lugar de cidadania, na ressaca das eleições europeias, depois de estar “riscado do mapa” pelas esquerdas radicais, com relevo para o PCP, durante quase meio século.

A proposta do CDS -PP, que seria aprovada, uniu a direita, enquanto à esquerda o PS de Pedro Nuno Santos não teve pudor em votar contra, juntando-se aos comunistas, e esquecendo o legado de Mário Soares, defendido, coerentemente, por Francisco Assis nas suas despedidas da bancada socialista de S. Bento.

Assis não hesitou mesmo em reconhecer que “os vencedores do 25 de novembro foram os verdadeiros democratas e estão espalhados por vários partidos e presentes nesta Assembleia da República”.

Nunca se percebeu por que Assis alinhou ao lado de Pedro Nuno, na corrida à liderança do partido, quando as suas ideias conhecidas convergiam muito mais com as de José Luís Carneiro, o opositor vencido nessa disputa interna.

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Talvez se encontre uma explicação na lista que o incluiu nas Europeias e lhe permitiu um regresso a Estrasburgo – que sempre desejou e que lhe foi negado por António Costa -, embora aceitando ficar subalternizado a Marta Temido, impreparada para a função, como se percebeu durante os debates em que interveio. Uma injustiça.

Como apontou Hugo Soares, líder da bancada do PSD, Assis deu “uma lição ao PS”, perante o “incómodo” visível do actual secretário geral socialista.

Na lição de Assis, este enfatizou, primeiro, que “o PS será sempre o partido do dr. Mário Soares”, para defender depois que “não há personalidade política e civil mais ligada ao 25 de novembro do que o dr. Mário Soares”, algo que “desafinou” com a votação do partido, sintonizada com a extrema esquerda, ou não fosse Pedro Nuno o “motor” da facção socialista mais radical.

Oxalá, em Estrasburgo, Assis consiga “moderar” Marta Temido, o   que poderá forçá-la a trautear mais vezes a Internacional Socialista, como confessou fazer sempre que se irrita…

Aprovada a comemoração anual do 25 de novembro — que restituiu aos portugueses, importa lembrar, as liberdades de Imprensa, económica e política –, convirá não  esquecer que a data esteve longamente proscrita, esbarrando todos os esforços de recuperá-la na oposição contumaz das esquerdas.

Nem mesmo quando António Barreto e o general Vasco Rocha Vieira integraram a comissão organizadora de um ciclo de conferências alusivas ao 25 de novembro, repartido pelo país, lograram vencer o muro de silêncio, com a cumplicidade da maioria dos media, em cujas redacções se senta muita gente obediente ao pior esquerdismo.

De um modo sistemático, as conferências foram, então, quase ignoradas, apesar de reunirem um apreciável e diversificado elenco de oradores, incluindo o jornalista e académico Mário Mesquita, um dos fundadores do PS, já falecido.

Realista e numa linguagem crua e frontal, Barreto diria em 2016, numa entrevista ao DN, a propósito da publicação das conferências sobre o 25 de novembro, reunidas em livro, que “o mais impressionante é como tanta gente se acovarda hoje”. Tinha razão.

A celebração anual da efeméride passou no Parlamento, mas que não haja ilusões. Tão cedo as esquerdas regressem ao poder e a data será novamente banida do calendário oficial.

A quem duvide, recomenda-se a leitura das intervenções descabeladas de António Filipe, de Joana Mortágua ou de Rui Tavares, para perceberem a sorte que está reservada ao 25 de novembro, se as esquerdas voltarem a ter representação parlamentar maioritária.

Comemoremos, pois, enquanto se pode, a data que salvou Portugal de um novo regime totalitário.

 

Quem tenha acompanhado pelas televisões a noite eleitoral das Europeias terá experimentado a estranha sensação de que os vencidos, afinal, estavam eufóricos, num registo que mais parecia de vitória.

É certo que há muito o PCP nos habituou a mascarar os seus desaires com leituras acrobáticas dos resultados, destinadas a relativizar as derrotas, mesmo quando são destronados em antigos bastiões, supostamente inexpugnáveis.

Mas, desta vez, os comunistas não estiveram sozinhos. Desde o BE à AD, sem excluir o PAN, o Chega e o Livre todos ficaram aquém do que desejavam, embora uns mais do que outros.

Sem querar dissecar o “estado de alma” pós resultados eleitorais, já suficientemente tratado, continua a ser irresistível o alvoroço da líder bloquista, Mariana Mortágua, ao saber que a ex-líder Catarina Martins conseguira os mínimos para procurar casa em Bruxelas. Sofreram e chegaram a ver “o caldo entornado”. O desfecho foi um alívio para ambas, apesar de o BE ter “encolhido” um mandato.

Irresistíveis, também, os malabarismos de João Oliveira, feliz por ter obtido, à tangente, o passaporte entre os eleitos. Ainda não foi desta que o PCP e o BE, ficaram fora da “alta roda“ de Estrasburgo, ao contrário do PAN, extinto do mapa europeu.

À direita, André Ventura foi tão ambicioso que acabou vítima de si próprio e de um enorme trambolhão, comparativamente com as Legislativas. Claro que não assumiu o revés, mas não passou despercebido o seu embaraço. Previa mais, teve menos.

Na noite eleitoral houve ainda a longa dissertação de Luís Montenegro, deixando na sombra o seu jovem “cabeça-de-lista”, para, de passagem, admitir ter falhado o objectivo principal, e, lesto, anunciar, em contramão, o apoio da AD e do governo à eventual candidatura de António Costa  para presidente do Conselho Europeu.

Estava feito o “número” da noite para compensar “amargos de boca”.  

Do lado dos vencedores, o único com razão para festejar  esse título, o liberal Cotrim de Figueiredo, seria bem mais comedido no discurso, contrastando com o entusiasmado Pedro Nuno Santos que, apesar de ter perdido um eurodeputado, cantou a vitória “por poucochinho”.

E teve artes de verdadeiro ilusionista ao proclamar que as esquerdas tinham sido maioritárias … excluído o Chega, à direita, claro. E ninguém o convence a ser sério nas contas? …

Dito isto, que lições extrair das Europeias “nacionalizadas”, que marginalizaram nos telejornais as regionais  da Madeira?

Desde logo, o apagamento de Francisco Assis na caravana do PS, quando era o único da lista com experiência somada de dois mandatos no Parlamento Europeu, conhecendo bem os “cantos à casa” e as “nuances” das várias famílias nela representadas.

Assis foi literalmente anulado por Marta Temido, tal como aconteceu também com Ana Catarina Mendes, varrida de qualquer protagonismo.

Marta queria o palco todo para si, e , embora fraca e impreparada nos debates, com muita irritação à “flor da pele” (que Bugalho soube explorar…), compensou com o à-vontade que revelou na rua, revelando um perfil desembaraçado que não se lhe conhecia.

Assis “vingou-se” nas despedidas do Parlamento, e antecipou que não tenciona abdicar de Estrasburgo para assumir a presidência “rotativa” da Assembleia da República, negociada com a AD.

Já Cotrim de Figueiredo, sem dúvida o vencedor da noite, foi igual a si próprio, seguro e metódico, e é expectável que dê nas vistas, em especial, se for eleito para a vice-presidência dos Liberais Europeus, hipótese para a qual já se mostrou “disponível”.

 

Se a configuração do Parlamento Europeu mudou com estas eleições, mercê do crescimento das direitas, por cá a paisagem mediática, também está num processo de mudança, com a entrada em cena de um novo canal noticioso de televisão, cujo modelo não difere muito de  outros já estabelecidos.

Depois da CNN, temos agora o novíssimo Now, em parceria com a Euronews, nas “grelhas“ dos operadores de cabo. É o reforço da internacionalização da oferta.

Segundo os seus responsáveis, o Now  “vem para acrescentar valor”. E como? Para já, acrescenta mais políticos contratados à fórmula seguida pela concorrência instalada.

Depois, para parecer inovador, acrescenta uma espécie de “conselho de sábios”, ao qual chama pomposamente “conselho de estado “, onde se sentam os “senadores” para definirem – pasme-se!… – “as decisões estratégicas do canal”. Nunca a promiscuidade politico-jornalística tinha descido a tal ponto.

E quem são os “senadores”? Pois lá estará  o “irritante optimista” António Costa, ex-primeiro ministro e putativo  candidato a presidente do Conselho Europeu, se os fados lhe  correrem bem; o ex-líder frustrado do PSD, Rui Rio, que, aparentemente, desistiu do  recolhimento no Porto  e quer  fazer pela vida; ou o “mago” das Finanças, Fernando Medina, que se rendeu  às “contas certas” e  que jura ter oferecido a Montenegro uma farta “almofada” de liquidez, de paradeiro incerto ; ou Pedro Santana Lopes, o autarca da Figueira da Foz, um veterano de “sete fôlegos” , que resiste mal fora das camaras de televisão; ou, ainda, a inesquecível Graça Freitas, “reformada” da pandemia,  mas sempre atenta  às oportunidades que lhe baterem à porta

Porém, o verdadeiro “golpe de asa” do Now foi a anunciada contratação do cardeal Américo de Aguiar, no papel de comentador, com os créditos de ex-dirigente da Rádio Renascença e de apoiante confesso de Pinto da Costa, além do lastro de ter intervindo na organização das Jornadas de Juventude, que trouxeram o Papa Francisco em romagem até Lisboa.

Com este   cartaz, o Now diz-se preparado para lançar “um olhar viral dos autores que vão comentar as áreas em que são especialistas”.

Descontada a propaganda, é difícil descortinar as “especialidades” de Costa, Medina ou Rio, enquanto políticos em pausa ou em trânsito para novo emprego.

Assim, o Now apresenta-se com credenciais muito idênticas àquelas que já iluminaram o firmamento da CNN e de outros parceiros temáticos do cabo.

A elevação de políticos a “estrelas” de televisão tornou-se um fenómeno e uma singularidade em Portugal, desde que Marcelo Rebelo de Sousa acumulou popularidade nessa função.

Apesar da sua reconhecida apetência para desenhar cenários, é improvável que Marcelo tenha previsto o aparecimento de tantos seguidores, à esquerda e à direita, desde deputados a autarcas, a ex-líderes partidários ou a ex-governantes, tão empenhados em pastorear o povo. Por este andar, é legítimo duvidar que “cheguem para as encomendas”…

A política passou a ser feita, em directo, a partir dos estúdios das televisões.

Claro que a expansão do “comentariado” residente abrangeu, também, jornalistas, que descobriram as virtudes das “portas giratórias “, bem oleadas, circulando com desembaraço entre as redacções e o terreno da política, como ficou demonstrado nas Europeias.

Vem a propósito, aliás, citar o jornalista Emídio Rangel, já desaparecido, que foi director da SIC e fundador da TSF, autor de uma frase que então “caiu no goto”. Dizia ele que “a televisão vende com igual eficácia um sabonete ou um Presidente da República”.

Não viveu o bastante para comprovar que além do Presidente da República, a televisão também pode “vender” um jovem “cabeça- de-lista” nas Europeias, ou um candidato a presidente do Conselho Europeu. Ou, ainda, quem sabe, um candidato a futuro Papa.