O braço de ferro continua. Com a ameaça de greve e a requisição civil dos funcionários da TAP mas não só. Ontem, o Metro de Lisboa esteve fechado pela oitava vez este ano numa guerra de trincheiras contra as tentativas do governo para limitar as perdas da empresa estatal. Na CP, tive recentemente de viajar ao abrigo dos «serviços mínimos» enquanto os funcionários desta empresa altamente deficitária permitiam que as pessoas viajassem sem pagar. Continua também o braço de ferro que a direcção da RTP mantém há semanas com o governo e o chamado Conselho Geral Independente: está demitida ou não?
As provas deste braço de ferro partidário estão em todas as páginas dos jornais. Esta enésima greve da TAP – em plena quadra natalícia – é defendida por motivos puramente partidários, sem ter em conta a situação de ruptura financeira da companhia aérea nem tão pouco essa «espécie de condomínio entre o Estado e os sindicatos da empresa», como lhe chama o insuspeito Vital Moreira, para a sua virtual destruição. Não vale a pena falar desse grupo de personalidades liderada por Mário Soares que surgiu agora a assinar manifestos atrás de manifestos a fim de pedir a estatização universal da economia portuguesa.
Concentrar-me-ei nos pretensos argumentos usados por alguém que lamenta – cedo demais ou então muito habilmente, não se sabe bem – uma anunciada derrota dos sindicatos da TAP perante a «requisição civil» do governo, a saber, o jornalista Manuel Carvalho no Público do dia 21, segundo o qual «a TAP fazia chorar os emigrantes»… Mais sério é o argumento de que a empresa teria «resistido a todas as tentativas de venda», mas é falso. A TAP teria, isso sim, sido vendida pelo governo Guterres e o ministro João Cravinho, fazendo parte desse governo o actual líder do PS, António Costa, se a Swissair não tivesse falido antes, como a Alitalia esteve prestes a falir acabou por se abrir a capitais estrangeiros. Entretanto, foram privatizadas a Iberia, a Air France, a British Arways e outras chamadas «companhias de bandeira» surgidas na Europa, como a televisão pública aliás, para suprir a falta de investimento privado nestas novas áreas de actividade. Muito recentemente, a TAP esteve outra vez para ser vendida a um financeiro internacional se o actual governo não tivesse desconfiado da capacidade do comprador… A não ser que esta privatização abortada já fosse condicionada por trás da cortina por interesses desconhecidos!
O autor do artigo afirma a seguir que «os sindicatos têm motivos para protestar», mas não diz quais, a não ser que sejam aqueles que suspeitamos todos, isto é, a perda de regalias que mais nenhum assalariado possui em Portugal. Mais extraordinário é o duplo argumento seguinte: «Há a troika mas essa pressão externa podia ser facilmente superada, caso o governo o quisesse»! Ora, ainda hoje, toda a imprensa se faz eco das críticas da Comissão Europeia àquilo que falta cumprir do «memorando» assinado com a troika por Sócrates em 2011, no qual figurava preto no branco a privatização da TAP.
A privatização devia-se e continua a dever-se à necessidade de redução do défice público, acrescida pela proibição europeia do financiamento estatal a estas companhias em nome da concorrência, nomeadamente aquela que o mercado lhes faz através das lowcost, que são o equivalente aéreo dos canais privados da televisão que não param de ficar com os clientes das fossilizadas empresas públicas. Nada disto se alterou. Pelo contrário, agrava-se todos os dias, como demonstra o pedido de empréstimo de emergência anunciado pela TAP. Os sindicatos, nomeadamente os pilotos e o pessoal de voo, levarão a TAP à falência como Zeinal Bava e Granadeiro levaram a PT!
É portanto um mito que a TAP seja, como afirma o autor, «uma empresa bem gerida» e que seja «possível e desejável manter empresas assim na esfera do Estado». Trata-se de um voto pio que já não corresponde a nada, especialmente num país como o nosso, onde o governo Sócrates chegou a controlar directamente 53% do PIB, com os resultados que se viu quando rebentou a bancarrota! Aliás, os sindicatos fizeram ainda há pouco tempo outra greve ruidosa e ruinosa contra a «má gestão» da empresa, como se eles próprios fossem gestores e, de facto, parece que é isso que alguns pretendem ser…
Finalmente, quanto ao papão da «requisição civil», habitual em qualquer democracia, esta é a terceira vez desde o 25 de Abril que ela é empregue numa greve da TAP em perto de uma dezena de «requisições» das eternas empresas públicas de transportes. A primeira foi decretada em 1977 por – nada mais, nada menos – Mário Soares. António Costa, actualmente em denegação constante, subscreveu como governante várias «requisições», incluindo a da TAP em 1997, decidida por Guterres e que durou então um mês. Este braço de ferro e desafios como o dos pilotos da TAP só terminarão quando o líder do PS reconhecer que não possui qualquer alternativa às medidas que o actual governo tem de tomar de acordo com os nossos compromissos para permanecermos na União Europeia.