O discurso da revolta dos professores é feito aos gritos, veemente, contundente, um grito de socorro, um clamor lancinante de pessoas humanas exaustas, à beira do abismo. A classe docente caminha para duas décadas de sofrimento. Um descontentamento que é suplício em forma de protesto e reclamação. O clamor digno do mal-estar docente por justiça e Respeito!

Quem fecha os ouvidos ao clamor (…) também clamará e não terá resposta.” (Bíblia Sagrada, Livro de Provérbios, capítulo 21, versículo 13).

A razão do clamor e dor dos professores tem razões que só o professorado respira e sofre. Tem as cicatrizes e feridas do tempo, da traição, da mentira, da injustiça, ilegalidade, humilhação, empobrecimento, roubo, do abandono do Ministério da Educação (ME), do autismo autoritário, do esmagamento burocrático, do medo do futuro sem futuro, sem horizontes para além do trabalho ao fim de semana, em vidas sem horizontes. Desvalorização, desmotivação, burnout. Assim não é viver, de todo.

A Educação em Portugal está sem Governo. É uma desorganização organizada. O professorado é maltratado, ostracizado, provocado e insultado pelo poder político. A docência vive num carrossel laboratorial permanente de modas e luminárias “maianas”. Não há visão política educativa de futuro, consistente, em permanência; não há pacto visionário. Apenas e só navegação à vista. “Vitória suja/ME” é mal sem honra, é derrota. É nada. É!

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É necessário que a escola volte para os professores e educadores. É simples, é o poder político investir os docentes da autoridade perdida e devolver a organização Escola aos seus profissionais, dar valor, condições de trabalho, estabilidade e mimo aos trabalhadores da Educação.

Os professores são os construtores da formação axiológica, ensino e educação dos seus alunos, em parceria com pais, encarregados de educação e famílias. A comunidade educativa. Não há futuro sem os professores. Só um poder político vesgo, cego ou alienado não entende nem percebe o pedido desesperado de trabalhadores que tutela, agindo fora da lei. Está em causa a Escola pública de massas, inclusiva, humanista e de qualidade.

Dias 1 e 2 de fevereiro de 2023 são marcantes para o professorado português na conjuntura de luta em curso. Dia 1, o ministro das Finanças, Fernando Medina, disse na CNN Portugal: “Portugal não tem só professores. É preciso cuidar do futuro”.

Como? Como disse, Sr. ministro? Fique sabendo que a conversa da falta de dinheiro é velha, está estafada e já não colhe. Para a banca/bancos há milhões a jorrar, há dinheiro. Para a TAP (problema resolvido com a privatização, pelo Governo de Pedro Passos Coelho, durante a troika, na sequência de mais uma bancarrota socialista, com José Sócrates, António Costa e Teixeira dos Santos, e que o seu partido, PS, depois de ter perdido nas urnas para o PSD, reverteu, na coligação geringonça, e que está custando caro ao país), há dinheiro. Sendo que a culpa política de tamanha incompetência/preconceito ideológico e monumental erro crasso não é assumida e morre solteira. Para ordenados milionários de alguns cargos públicos e “rapazolas” do partido, em início de funções ganhando mais que um professor em final de carreira, há dinheiro. Para despedimentos e indemnizações milionárias pagas do erário público, há dinheiro. Para empresas públicas cronicamente deficitárias e a dar milhões de prejuízo ano após ano, são injectados muitos milhões e há dinheiro. Para as PPP – Parcerias Público Privadas, há dinheiro. Para a construção de altares megalómanos gastando dezenas de milhões num fim de semana para receber o Papa e as JMJ – Jornadas Mundiais da Juventude, há dinheiro. Acha assim tanto, honrar os compromissos do Estado com pouco mais de 300 milhões. É o Estado a falhar. Quer que continue? Seria fastidioso.

Joaquim Miranda Sarmento, no fórum TSF, lembra que, nos últimos 27 anos, o PS (Partido Socialista) governou 20 anos. António Costa, chefe do(s) governos pós troika, afirmou categórica e inequivocamente que a austeridade acabou!

Afinal, mentiu! A página não virou.

O raio do problema das contas públicas certinhas e direitinhas só existe para os educadores e professores de Portugal Continental. No fim das contas, só estamos a exigir o que é nosso e aquilo a que temos pleno direito; trabalhamos e descontamos. Ponto final.

Em comparação, por analogia, apenas aquilo a que temos direito é não ter direito(s). Levamos com uma escola pública em colapso, com falta crónica de professores por causa de duas décadas de políticas educativas ausentes, de não existência, nem assertividade, nem reformas; contratação não profissionalizada de desenrasque “à Zé lusitano” (com o devido respeito a todos os colegas, que não têm culpa de nada); milhares de alunos sem professores e sem aulas; e lembrando, para não esquecer, que levamos com lixo burocrático aos montes, com fartura. Tempo para preparar e dar aulas é secundário. Vamos ao acessório e deixemos o essencial.

A ajudar à festa, o Sr. Presidente da República esquece que é o PR de todos os portugueses. Quebrou a neutralidade e no dia 1 de fevereiro de 2023, uma quarta-feira, afirmou que: “(…) há um momento em que a simpatia que, de facto, há na opinião pública em relação à causa dos professores pode virar-se contra eles”. Como é que é o aviso? Abreviando o sumo da coisa: “A simpatia da opinião pública pode virar-se contra os professores”. Então, e o Estado de Direito Democrático, sendo o professorado vítima de longa data de um Estado fora da lei, que não cumpre com as suas obrigações e, mais grave ainda, discrimina em relação aos Açores e à Madeira. Em que é que ficamos? Para as mesmíssimas funções, critérios diferentes. Sr. Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, votei em si, mas desilude o professorado. Como diz o sábio povo: “Quem não se sente não é filho de boa gente”. Os docentes são esmagadoramente gente boa, castigada pela tutela e fartamente humilhada pelo Ministério da Educação. Os educadores e professores portugueses estão à beira do colapso. Deixem-nos trabalhar em paz. Deixem-nos ter dignidade. Deixem o Ensino/Educação triunfar.

Dia 2 de fevereiro de 2023, uma quinta-feira, reunião do ME com todas as organizações sindicais (associações, sindicatos e federações), em mesa negocial única. A agenda negocial é que não lembra ao diabo. Não descurando as matérias agendadas, nada disso, falou-se (ME entregou documentação) sobre a formação contínua de professores e regime de concursos, confirmando a intencionalidade de passar a haver instabilidade para os docentes de carreira já em lugar de quadro, que, encontrando-se em situação de DACL, passam a “viajar” dentro dos limites geográficos dos novos QZP: “No sentido de mitigar o problema da falta de professores” (ME sic). A gestão dos recursos humanos docentes passa a ser uma gestão local, efectuada por um Conselho composto pelos Directores dos respectivos AE/ENA. Nada de nada sobre as linhas vermelhas. Zero. Os representantes destes trabalhadores/funcionários públicos da Educação nem sequer tiveram a honra da presença do Sr. Ministro da Educação, João Costa, há 7 anos no ministério, e que conhece sobejamente os reais problemas da classe docente, que urge resolver sem delongas e demora. Fez-se representar pelo secretário de Estado da Educação, António Leite, que presidiu, alegando o ME a ausência do Sr. Ministro com a presença numa reunião no Conselho de Ministros. Donde, o Sr. Ministro da Educação mostrou a mais total e absoluta indisponibilidade para falar olhos nos olhos, cara a cara, com os professores. Mais culpados são Medina e Costa. Não há vontade política negocial. Ponto.

A estratégia do Governo/ME é vencer sujo os professores e educadores, por cansaço, desistência, conformismo, desincentivando em forma de litigância, e sobretudo por ser insuportável monetariamente manter a luta e as greves, cujo dinheiro sai do bolso dos professores, para quem ganha o que os professores ganham e com toda a perda de poder de compra. É pena, é lamentável. É frustrante. Mas desta vez vai ser diferente porque o professorado está mais unido que nunca, determinados estamos a vencer esta justa, justíssima causa que abraçamos. Não vergamos, nem partimos. Estamos de pé e em verticalidade.

Um esclarecimento. Há uma grande confusão na informação e conversas, nas notícias e comunicação social, jornalistas, comentadores e opinião pública, ao misturar escola, alunos, professores em greve, põe e tira apoio(s). O problema do professorado é laboral. Donde, os educadores e professores portugueses têm direito a defender os seus direitos e legítimos interesses, por todos os meios legais, incluso o direito inalienável à greve. Donde, as tentativas de limitar tal direito e qualquer manigância/artimanha são feias, golpes baixos, atentatórios do bom carácter. Haja bom senso e impere a vontade em resolver. Falemos franco, francamente e frontalmente, com verdade e coragem política.

Obrigado.

Fizeram chegar a Ele o grito (…) e Ele ouviu o clamor do necessitado” (Bíblia Sagrada, Livro de Jó, capítulo 34, verso 28).