No recente artigo “o mistério dos jornais que não existem”, Francisco Louçã, um dos muitos políticos que, pagos para isso, opina há décadas em jornais e canais de TV apoiados pelo estado ou pela publicidade significativa de interesses ligados ao estado, atacou quer os grandes jornais que rejeitam apoios do estado opacos, quer os jornais com pequena tiragem, com pouca publicidade e não controlados pelo estado. Em ambos esses tipos de jornais há vozes da sociedade civil a lá opinarem voluntariamente, logo sem motivos financeiros e apenas por intervenção cívica patriótica, ao contrário dele.

Louçã segundo a revista Sábado e o jornal Sol, só pelos seus comentários na SIC recebe 2.500 euros mensais, sem contar com o Expresso. Mais de 70 políticos e ex-políticos recebem anualmente no total mais de 1 milhão de euros. Nas últimas décadas foram assim pagos dezenas de milhões de euros a políticos comentadores, vindos de companhias de media portuguesas, apesar da maioria destas estar em dificuldades financeiras e terem recentemente recebidos apoios do estado no valor de 11 milhões de euros, segundo critérios inexplicáveis.

Muitos destes políticos ganham quase tanto ou mais como comentadores do que nos seus cargos públicos. Tantos políticos inexplicavelmente bem pagos num país pobre, por uma imprensa pouco sustentável, a comentarem-se a si próprios em jornais que só vendem milhares de exemplares (pouco num país com 10 milhões de habitantes) e necessitam de apoio do estado, é algo estranho e único em Portugal. No entanto Louçã, no dia da liberdade de imprensa em que publicou o seu referido artigo, não põem em causa a sustentabilidade de tal bizarria singular nacional. No seu artigo está implícito que só jornais que vendem milhares de exemplares físicos e que empregam os serviços de tantos políticos como ele é que tem “sustentação” e representam a liberdade de imprensa. Para ele, parece que só esses deviam existir pois são portadores exclusivos do estandarte da democracia e da qualidade enquanto os jornais “que vendem poucas centenas de exemplares” são um “inimigo da democracia.”

Nos pequenos jornais ou jornais independentes parecem incomodar profundamente a Louçã as vozes lufadas de ar fresco disruptivas vindas do sector privado, que contrastam com a claustrofobia algo doentia – para alem de inexplicável – dos tradicionais jornais repletos de políticos poderosos a autoelogiarem a si próprios e aos seus interesses para manterem tudo na mesma. Incluindo manterem Portugal cada vez mais último em todos os índices do Eurostat e forçarem mais de um milhão de portugueses jovens e qualificados a emigrarem de um país falido pela sua classe política dominante no poder e opinião no seculo XXI.

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Louçã nas poucas linhas do seu artigo atira insultos sem fim às vozes voluntarias da sociedade civil que escrevem na pequena imprensa que questionem tais problemas relacionados com a omnipresença dos nossos políticos. Aparentemente, não devia haver alternativa e imprensa contraditória a tais personalidades. Para Louçã em tais pequenos jornais não há a escreverem lá, como sabemos existirem tantos, empresários a tentarem mudar a mentalidades dos políticos que nos fizeram pobres, não há médicos cirurgiões com mais cultura e experiencia profissional que a ministra da saúde a proporem soluções para o serviço nacional de saúde bloqueado por listas de espera, não há engenheiros da aviação ou da ferrovia com mais experiencia profissional nessas áreas que o ministro das infraestruturas a tentarem ensinar-lhe alternativas mais produtivas para os nossos impostos que a TAP e bitola ibérica.

Para Louçã que generaliza sem a devida contenção nem a sua alardeada investigação, quem escreve nos jornais de menos tiragem que os dele, fá-lo “para inglês ver” pois “nem a informação tem relevância (…) nem a opinião pesa” e é “ex-personalidade”, tem “narcisismo”, e é “desvalido.” Só sobre este último adjetivo lhe damos alguma razão pois significa que quem escreve nos pequenos jornais não tem apoios económicos para o fazer e é desprotegido. Claramente, quem escreve nos grandes jornais, especialmente se for político, mas decerto não se lá for jornalista ou estagiário, é o oposto de desvalido: tem apoios económicos sendo bem amparado há décadas. Estranhamos, no entanto, ver tal personalidade de esquerda a defender os amparados e a criticar os desvalidos.

No seu pequeno artigo num grande jornal tradicional, a personalidade Louçã (atual e não “ex” realce-se) vocifera impropérios adicionais contra quem escreve nos jornais pequenos: São gente que faz “um ataque à credibilidade da imprensa” e produz “jornalismo-sombra”, “poluição,” concluindo com a já citada e previsível de acusação de “inimigo(s) da democracia.” É previsível e entediante que para os poderosos de esquerda, todos os que não concordem com eles, são malfeitores da democracia desde o bilionário Elon Musk a comprar o Twitter a um desvalido que escreva num minúsculo jornal português.

Estupefactos verificamos que para Francisco Louçã uma democracia mediaticamente saudável é como a ridiculamente única portuguesa. Uma onde um grupo de políticos já de idade avançada e com resultados dos piores da Europa é amparado em vários canais de TV e jornais a pregar sem contraditório da sociedade civil, só de jornalistas algo tímidos e intimidados, há décadas. Isto como se ainda tivessem alguma coisa de novo ou relevante para nos ensinar do alto do seu narcisismo, esse sim obvio.

Não conhecemos nenhum outro país democrático com vários dos seus principais órgãos de comunicação social tão infiltrados por políticos arrogantes a comentarem se a si próprios e a julgarem-se donos da verdade. No entanto, para Louçã esse nosso status quo muito sui generis é que é democrático. Já os grandes jornais privados que não vivem do estado ou os pequenos jornais devem ser investigados e controlados a bem da democracia, claro. O ex dirigente do bloco de esquerda dá-nos a novidade que estes existem principalmente para fazer capas gritantes que chamem a atenção. Como se todos os jornais, grandes ou pequenos, não fizessem isso mesmo desde que foram inventados.

Concluindo, o autor destas linhas refuta a tese de Louçã que os pequenos jornais – ou os jornais maiores propriedade de empresários – minem a liberdade de imprensa. Fá-lo na qualidade de profissional sediado no estrangeiro que nunca foi personalidade em Portugal, mas que escreve voluntaria a patrioticamente para tentar explicar que há mais mundo e alternativas para além das do que repetidamente cá implementamos sempre com os mesmos maus resultados. Escrevemos quer em grandes jornais como o Observador, Público ou até o Expresso no passado, quer em pequenos jornais como O Diabo, Jornal da Maia, ou o Raio de Luz de Sesimbra. Celebramos o facto da verdadeira liberdade de imprensa e diversidade de opinião que felizmente ainda notamos existir Portugal e nos orgulha, incluir quer grandes quer pequenos jornais. Alem do mais escrever para inglês ver só o fazemos no Financial Times. Até nisso, bem como sobre quase tudo o que generalizou sobre os milhares de cidadãos anónimos que voluntariamente escrevem nos pequenos jornais ou opinam num grande jornal independente do estado, faria bem a Francisco um pouco mais de conhecimento sobre a realidade e de humildade. Mal estaríamos se a nossa pluralidade e liberdade estivesse só nas mãos de políticos como ele.