Há meia dúzia de bandidos. E bastantes mais irresponsáveis. Mas aquilo que existe, sobretudo, é um problema do desleixo e abandono geral das nossas matas – pertencentes na imensa maioria a pequenos proprietários descapitalizados, absentistas e em muitos casos desconhecidos.

Portugal arde, fundamentalmente, porque a estrutura minifundiária e muito dispersa da propriedade florestal inviabiliza a respectiva rentabilidade económica e portanto a sustentabilidade financeira. Desencorajando o investimento e tornando difíceis de suportar os custos da limpeza e remoção dos combustíveis.

Assim se explica que uma modesta ignição principiada nos arredores de Faro galgasse rápida e imparavelmente os dez quilómetros que separam a capital do Algarve da prestigiada Quinta do Lago, através de uma sucessão contínua de matagais desmazelados, cheios de lixo e altamente inflamáveis.

O cerco pelo fogo de um dos refúgios actuais da pretendida elite político-económica portuguesa não deixa de ser altamente simbólico. Porque os incêndios florestais constituem hoje, acima de tudo, uma questão de regime.

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Afinal o país arde sistematicamente porque a classe política, os decisores públicos, os responsáveis institucionais, os agentes económicos, toda a oligarquia estabelecida em suma, fracassam na resolução de um problema que, além de climatérico e operacional, é social, económico e político.

Na realidade, o regime estabelecido não tem conseguido, ou não tem querido, conceber e pôr em prática um modelo de desenvolvimento estrutural capaz de tornar essa perigosa massa-falida que é a floresta nacional num activo estratégico rendoso e financeiramente sustentável.

Transformando-a num património cadastrado, organizado, metódico, racional, criador de valor, protegido e seguro – escapando desse modo ao crónico e fatídico holocausto que têm sido os verões portugueses dos últimos 50 anos.