Referindo-se à PSP e à GNR, a Ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, promete “retirar a fruta podre do grande cesto que são as forças de segurança”, de acordo com a nobre missão punitiva e persecutória anunciada ao Diário de Notícias, e a pretexto de uma alegada “infiltração da extrema-direita”.

Eis uma síntese do pensamento político deste governo concentrado numa frase. Portugal tem o ensino público, e a “cultura” pública ou subsidiada, controlados pela esquerda activista, que reduz universidades, escolas, e teatros a puros instrumentos ao serviço dos extremismos. O mesmo sucede nas redacções de todas as rádios e canais televisivos públicos, onde em vez de jornalistas trabalham cada vez mais activistas, e em vez de informação transmitem doutrina da extrema-esquerda. Qual é a única, solitária, cautela deste governo? Encontrar os polícias que votam no Chega. Nenhum vestígio de alfabetização democrática ajudou os senhores governantes a compreender que uma polícia política, orientada pelo Estado e transformada num instrumento oficial de repressão, faz parte de uma ditadura. Mas a existência de um polícia (ou vários) com convicções políticas não é suficiente para comprometer a responsabilidade do Estado, nem sequer da corporação; e enquanto os comportamentos obedecerem às regras e às hierarquias, a convicção de um polícia transforma a corporação num organismo completo e plural, e faz parte da democracia. Se houver indisciplina, são os comportamentos que devem ser julgados, e não as origens filosóficas, estejam elas à direita, à esquerda, no Inferno, ou na celestial “moderação”.

De que se ocupa, então, a sra. ministra Margarida Blasco? De garantir que as polícias têm meios para trabalhar? Que a lei da imigração é cumprida, lembrando-se que a imigração também está na tutela da Administração Interna? Que os bairros sociais, e todos os bairros mais pobres, cujo primeiro factor de exclusão social é a falta de segurança, vão ser devidamente policiados? Que acaba a desordem? Que a autoridade do Estado regressa a esses bairros, protegendo os moradores da autoridade brutal dos criminosos? Não, nada disso. A sra. Ministra ocupa-se de descobrir e “filtrar” (como ela disse) os polícias que votam no Chega, que são os tais polícias “da extrema-direita”, de acordo com a rigorosíssima bússola teórica dos doutores que se infiltraram em São Bento. Lendo a entrevista completa, a ministra Margarida Blasco diz coisa mais importantes, muito mais importantes, e que até certo ponto explicam o desvio para a retórica woke.

O relatório da IGAI (Inspecção-Geral da Administração Interna) informa que há falta de viaturas; as escalas de serviço não asseguram patrulhas de 24 horas; e não há polícias em número suficiente para assegurar o funcionamento das esquadras. A Ministra confirma (antes de ser Ministra era Inspectora-Geral, já conhecia a situação) e acrescenta informação relevante. O recrutamento e entrada de novos efectivos tem sido um problema, até porque alguns concursos ficam desertos. Quais os motivos? Ela própria indica: salários, subsídios, impostos, e habitação.

Quem acompanha os trabalhos da Câmara de Lisboa, e da Assembleia Municipal, e quem conversa com os Presidentes das várias Juntas de Freguesia, sabe que em Lisboa abrem concursos para polícias, professores, enfermeiros, médicos, pessoal auxiliar, e ficam vazios, porque os candidatos não conseguem pagar a renda de uma casa com o valor do salário que o concurso oferece. De maneira que os edifícios existem, foram construídos e gastaram-se neles recursos; mas os equipamentos, sejam eles escolas, esquadras, ou centros de saúde, não abrem e não prestam serviço à população por falta de pessoal.

Por isso, mesmo sabendo que estamos acima da média europeia em número de polícias por 100 mil habitantes, há falta de polícias com a idade adequada. Muitos polícias são mantidos em pré-aposentação, não vão para a reforma nem para a reserva, porque são necessários ao serviço. A maior parte dos polícias tem mais de 55 anos, numa profissão de indiscutível desgaste. E há polícias com mais de 30 anos de serviço que têm de continuar a trabalhar porque não entram pessoas para os substituir. Este é o verdadeiro problema, muito mais grave do que a estrepitosa idiotia inicial da “fruta podre”. A idiotia serviu para esconder, como fazem os poderosos fracos, um problema maior da competência deles. Não há economia para pagar a autoridade do Estado e as funções fundamentais do Estado. Já sabíamos como está o SNS, agora ficámos a saber como estão as polícias. É mais fácil exibir antifascismo do que segurar a derrocada económica.

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